BELL MARQUES JÁ É UM DOS CANTORES MAIS RICOS DE AXÉ-MUSIC E NÃO SÃO AS VERBAS DO MINISTÉRIO DA CULTURA QUE O FARÃO UM ARTISTA MELHOR.
O hype do Carnaval de Salvador - um reality show musical, em contraste com o também comercial, porém viável, Carnaval do Rio de Janeiro e de São Paulo - é um dos efeitos dos investimentos autorizados do Ministério da Cultura para eventos considerados "culturais".
E isso criou uma situação surreal. O presidente Lula não lançou, em janeiro, o tão esperado programa de combate à fome e à miséria, que era a obsessão política do então candidato que, falando demais em democracia, não respeitou o compromisso democrático da diversidade eleitoral da campanha de 2022, se impondo como "candidato único" e agredindo ou cooptando concorrentes.
Lula falou tanto em querer reconstruir o Brasil, mas em janeiro passado ele preferiu fazer viagens para estabelecer contatos internacionais ou costurar alianças políticas brasileiras. A única ação correta foi viajar para Roraima para observar de perto a tragédia da tribo Yanomami, e, depois, para ver a tragédia no Litoral Norte paulista. Fora isso, Lula só se empenhou para blindar e promover sua imagem pessoal e a combater o legado do bolsonarismo.
O pior é que Lula não começou a governar em janeiro passado e, no entanto, seus apoiadores elogiaram o "movimentado mês". Houve quem delirasse e achasse que Lula "começou bem" o governo. O que Lula fez foi apenas criar artifícios para se tornar notícia o tempo todo. Mas a tal "reconstrução do Brasil" não se viu sequer esboço.
Mas não há coisa ruim que não possa se tornar pior. Além da ilusão de que Lula, mesmo começando o governo sem mostrar serviço, "fez muito no primeiro mês", a "reconstrução" que nem começou foi festejada como se já tivesse concluído sua missão. Sim, Lula não começou a reconstruir o Brasil e seus adeptos já comemoraram como se essa reconstrução estivesse concluída.
Daí que vemos um clima de "felicidade" no Carnaval de Salvador. Nem falo muito dos Carnavais carioca e paulista, porque eles parecem cenários de folia normais, sem o oba-oba do evento baiano, porque o clima parecia relativamente mais discreto em termos de publicidade. Ou melhor, os Carnavais carioca e paulista atuaram dentro dos parâmetros normais de eventos festivos feitos para cumprir o roteiro de festas e feriados, sem a pretensão de serem a "salvação da humanidade".
Já o Carnaval de Salvador, até pelo fato da Ministra da Cultura ser a cantora baiana Margareth Menezes, caprichou no pretensiosismo com as verbas liberadas pelo ministério. Cada intérprete era anunciado pela mídia como se fosse a "salvação do planeta": Léo Santana, É O Tchan, Ivete Sangalo, Bell Marques, Durval Lélis, Psirico, Xanddy do Harmonia. Até Cláudia Leitte, que manifestou apoio a Jair Bolsonaro, se destacou nesse hype carnavalesco de 2023.
O Carnaval de Salvador, ou Carnaval da Bahia, simboliza aquele astral da "boa" sociedade que acha que o Brasil está no paraíso. É a festa oficial do Brasil-Instagram, das dancinhas do Tik Tok, do culto às subcelebridades, dos dialetos "portinglês" (como "body", para "maiô", e "boy", para "rapaz"), do pretensiosismo gurmê de uma juventude que confunde mainstream com "alternativo", se acha diferente cultuando a mesmice e pensa que lacração é sinônimo de "vanguarda".
É um público que, através de seu terraplanismo cultural, inverte os conceitos de música comercial e música não-comercial. Acham que "não-comercial" é o que toca atualmente no rádio e fala, em tese, dos temas da vida do ouvinte, enquanto que "comercial" é a banda antiga de rock clássico, Bossa Nova ou similares, cujos músicos se envolvem em alguma disputa judicial por algum espólio artístico.
Daí esse nível de pretensiosismo, hipocrisia e alienação pelos quais cai bem a falsa atribuição da axé-music como um ritmo "vintage", dentro da constrangedora "nostalgia de resultados", esse brega-vintage que só serve para a recordação solipsista de um público alienado, que acha qualquer música um "clássico" só porque ela lembra algum fato pessoal da vida da pessoa. Ridículo achar um sucesso musical um "clássico" só porque ele tocou quando seu ouvinte viu seu filho nascer.
Não, meus caros leitores. Aumentar os investimentos para o setor cultural, sem critérios cautelosos e levando em conta o sucesso comercial - mesmo quando seus ídolos já possuem um robusto suporte financeiro por conta da iniciativa privada - , não contribui para melhorar a "cultura" popularesca. Dinheiro não compra talento, e o que vemos é apenas a mudança financeira dos ídolos popularescos, que ficam mais ricos.
O "funk" sempre prometeu que "melhoraria" se mais grana fosse investida no gênero. Tudo conversa para o gado todo dormir. O "funk" recebeu, desde 2002, zilhões de investimentos financeiros aqui e ali, das filiais de empresas estadunidenses até times de futebol cariocas, e houve também as verbas clandestinas do crime organizado, no caso dos "proibidões" ligados a facções criminosas que controlam favelas em várias partes do Brasil.
Nada ocorreu de evolução. O que se viu foi a mudança de uma mesma batida padrão de temporada em temporada. Hoje impera o som de batida de lata de conservas imitando percussão hindu, e os MC's continuam tão medíocres, agora todos eles com voz de adolescentes com seu panfletarismo que, como sempre, gourmetiza a miséria, embora o aumento de verbas para a "cultura" tenha feito os funqueiros mais ricos, e, em vez de melhorar o talento, compram mansões e bens luxuosos.
Culturalmente, o Brasil continua devastado. E é lamentável que os lulistas se mantenham na ilusão de que basta um intérprete ser solidário a Lula que ele "tem valor". De Odair José a Pabblo Vittar, passando por Valesca Popozuda, Péricles etc, esses ídolos da música brega-popularesca continuam e continuarão medíocres, com mais ou menos dinheiro, porque mais grana não os fará mais talentosos e geniais. Eles apenas poderão comprar bens de consumo melhores, mas musicalmente ficarão na mesma mediocridade de sempre.
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