Não vou falar de exceções à regra, esse micro-ônibus que teima em ter a ocupação de um trem superlotado. O que se diz aqui é a tendência da maioria, pir sinal esmagadora, que trata a instituição casamento, já discutível em muitos aspectos, em brincadeira de criança.
O que se observa é que, mesmo nos chamados casamentos estáveis, pouca coisa se salva. De cada dez casamentos estáveis, somente três têm realmente a serventia necessária para uma relação conjugal genuína e saudável. A maioria dos casamentos dura mais por zona de conforto, pelo alto custo social e econômico do divórcio ou por pura preguiça, mesmo.
Se a humanidade em geral já tem mais solteiros do que se pensa, escondidos em relações conjugais que nunca passaram de formalidades, no Brasil a coisa se torna ainda mais frequente. A maioria das pessoas casa por casar, visando apenas os interesses de integração social, sem pensar duas vezes e se iludindo por afinidades pequenas e banais que não fazem diferença alguma numa relação e nem servem de critério para uma relação amorosa menos superficial.
A maioria esmagadora dos casamentos, na pior das hipóteses, vem de relações de conveniência socioeconômica, o chamado "golpe do baú", que lamentavelmente encanta e fascina a elite do bom atraso que domina o dito "bom senso" nas redes sociais.
Na melhor das hipóteses, porém, os casamentos raramente vão além da zona de conforto de uma dupla de amiguinhos que tiveram uma temporária atração sexual que foi levada pelo vento do tempo. E cria uma sensação de preguiça, e o divórcio não ocorre por pura acomodação, pelo medo inconsciente de cada cônjuge dormir sozinho ou voltar para casa e ter que fazer, também sozinho, a limpeza diária, além de preparar as refeições de todo dia. Maridos e mulheres reduzidos a meros irmãozinhos provedores de casas, arrumadores e cozinheiros.
Trata-se de uma grande inversão a uma situação descrita pelos movimentos estudantis franceses de 1968. Casais eram formados por rapazes e moças alojados em quartos estudantis. Eram colegas de quarto que viravam casais de namorados. Hoje é o contrário, casais que se tornam coleguinhas de quarto, amiguinhos e amiguinhas que mal dirigem umas palavras rotineiras e vão jantar e dormir, vivendo um casamento margarina de uma solidão a dois.
Um homem leva vida de solteirão, vive sozinho, tem compromissos profissionais muito constantes, parece ser um "lobo solitário" tocando sua vida. Até que, numa conversa, ele vem com essa tirada: "Aí eu estava com minha mulher e...". É de cair na cadeira.
Entre os famosos, a mulher com casamento estável é a que menos aparece com o marido. E, quando aparece, o cheiro de margarina é mais forte do que no aquecimento de uma fritura. Tudo para mascarar uma solidão a dois, um divórcio latente, uma separação que ocorre até quando os cônjuges dormem juntos. A famosa até exclui o marido na lista de homens atraentes.
E é irônico que, em várias situações de divórcio, os outrora cônjuges aparecem mais juntos do que a famosa "bem casada" que aparece quase sempre sozinha, enquanto o marido mais parece um patrocinador do empoderamento feminino da mulher.
Isso parece irônico, pois a presença conjugal é maior em casais já separados, o que pode ser um ato falho diante da banalização do casamento, uma instituição que mais parece um disfarce para solteirões e solteironas envergonhados.
A coisa é tão banal que é constrangedor que a certidão de casamento, que para muitos casais tem um valor real inferior ao de um rabisco de papel feito só para testar tinta de caneta, substituir a certidão de nascimento. Aí mais uma vez entra a zona de conforto, em utilizar um papel relativamente mais novo que a certidão de nascimento, muitas vezes remendada em suas partes rasgadas e amareladas.
Entendemos o divórcio após os 50 anos como uma segunda "saída da casa dos pais", e hoje o que mais se precisa fazer é conhecer a si mesmo, pois até então o que se fez foi puramente agradar os outros e ganhar dinheiro.
Infelizmente as pessoas lutam para serem aquilo que não são e, prisioneiras de seus personagens, cometem erros que, nos casos extremos, as fazem cometer crimes, jogando fora uma longa trajetória de ascensão social.
Neste caso, a solteirice é, muitas vezes, um remédio preventivo para relações tóxicas ou para relações meramente amistosas, casamentos formais que se dissolvem na essência, se limitando a ser meras amizades, quase fraternais, do marido-amiguinho e da esposa-amiguinha.
Com, isso, concluo que são raros os casamentos que realmente fazem sentido e têm relevância. Para estes, nossos votos de muito amor e união. Para quem não faz parte desse "clube", mesmo quem finja fazer, espera-se que a separação conjugal seja uma oportunidade das pessoas se conhecerem e desenvolver um amor próprio.
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