No Brasil da positividade tóxica, a elite do bom atraso se arroga em obter o protagonismo. A "boa" sociedade, a "burguesia de chinelos", aparece invisível ao olho nu, espalhando-se entre os brasileiros comuns como num mimetismo social, para assim vender seus valores privativos como se fossem "universais".
Confundindo hedonismo frenético com qualidade de vida, a elite do bom atraso quer mais consumismo do que cidadania. Os princípios da cidadania são defendidos nos limites para permitir a liberdade hedonista, que não suporta restrições para o império dos sentidos e dos impulsos.
Por isso, o Brasil de Lula 3.0 favorece mais as pessoas que passam a madrugada festejando, gritando, tocando som alto, do que o trabalhador que precisa de sossego para dormir e se renovar para mais uma jornada de trabalho. Favorece o cidadão que ganha demais na sorte grande, sem muita necessidade, para gastar a grana com festinhas nos fins de semana, do que o cidadão endividado que precisa salvar sua vida financeira.
É um Brasil bem mais complexo do que o maniqueísmo fácil do bolsonarismo versus lulismo, uma polarização que agora os lulistas não querem admitir, pois agora é um lado dos dois pólos que fala num "Brasil único", um Brasil em que Lula se coloca como o "centro de tudo".
O Brasil que hoje vive seus roaring twenties específicos, iludido com a aparente prosperidade que faz uma parcela da população - os 30% que têm pleno acesso a bens de consumo e bens culturais - achar que vive o melhor de seus momentos, vive o apogeu do consumismo frenético.
É o país em que, se pudesse, a elite do bom atraso - a elite viralatista enrustida que se acha "dona de tudo" - colocaria a cerveja na cesta básica e o leite no imposto do pecado. E nunca se consumiu tanta cerveja, comprada em quantidades industriais pela "boa" sociedade.
É um consumo tão louco de cerveja que seus bebedores já não aguentam mais transformar seus corpos em barris humanos da bebida. Já começo a ver gente jogando cerveja fora, como se joga comida fora, também. É o alto preço de todo um consumismo gastronômico de uma sociedade bem de vida e com a barriga cheia (incluindo o "rei da barriga" do pãodurismo), sem a fome e o apetite necessários para aguentar tudo o que suas vaidades querem.
Mesmo assim, o consumo de cerveja é obsessivo e intenso, além da conta. Cerveja como "artigo de primeira necessidade" para pessoas que ganham demais na vida, sem necessidade real para isso. Gente que não sabe gastar dinheiro, a não ser com supérfluos (para não dizer artigos nocivos, como o cigarro). Gente tomada do mais cego hedonismo. E a cerveja como mamadeira para adultos que, por sinal, estão mais infantilizados como nunca.
Dormindo tranquila depois que o governo Lula estabeleceu uma cobrança branda de impostos para os super-ricos - sazonal, por ser duas vezes por ano, barata, pela alíquota de 8%, e seletiva, porque, por fora, ira poupar o empresariado que apoiar o governo - , a "boa" sociedade, aliás, já deixou de hostilizar o magnata Jorge Paulo Lemann, considerado "vilão" no caso da crise das Lojas Americanas (da qual ele é sócio), para ser "heroi" através de um projeto "educacional" em parceria com o governo Lula.
Com esse projeto que envolve educação pela Internet, Lemann virou mais um "esquerdista" adorado pela elite do bom atraso, não bastasse ele vender a cerveja que muitos "socialistas de boteco" consomem e financiar a cultura musical brega-popularesca, pagando por fora a propaganda travestida de reportagens, documentários e monografias que a "admirável" intelligentzia tanto propaga a pretexto do "combate ao preconceito".
E, a partir dessa idolatria, se faz do Brasil a "República da Ambev", com pessoas mais preocupadas em consumir, consumir e consumir, tomando cerveja adoidado e pouco se lixando com as pessoas que estão impedidas de ver a luz do Sol lulista, vendo o dinheiro se esgotar em suas contas sem que houvesse alguma salvação para suas finanças agonizantes.
A "boa" sociedade também pouco se lixa com as pessoas que vivem o pesadelo da situação de rua, ou as pessoas que vivem nos abrigos precários das favelas. Este Brasil realista, cruel, impiedoso, não cabe na retórica feliz do Lula sorridente, pois o presidente virou o "menino mimado da História", vendo o Destino atender todos os seus favores, produzindo um país de faz-de-conta que, mesmo sob uma democracia aparente, proíbe as pessoas de questionar e criticar, sob a ameaça do cancelamento e do boicote do público que consome a Internet.
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