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GOVERNO LULA ESTÁ MAIS FRÁGIL DO QUE SE IMAGINA

O MAIOR PROBLEMA DE LULA É SE ACHAR AUTOSSUFICIENTE EM TUDO E QUERER QUE O DESTINO LHE FAÇA TODAS AS VONTADES.

Observando com atenção e frieza cirúrgica o governo Lula, sem sucumbir as paixões políticas favoráveis ou contrárias, é o mais fraco dos três mandatos. Houve benefícios, mas muito poucos e até inferiores aos que Lula trouxe há cerca de quinze, vinte anos.

Sim, porque Lula abriu mão de sua essência original e o pouco que restou do político esquerdista que podou seu perfil ao longo dos anos, em verdade, só dobrou o marketing. Mas os progressos reais e profundos, exaltados por jornalistas experientes convertidos agora em focas amestradas a aplaudir o presidente até nos seus erros, vistos como se fossem "acertos estratégicos", simplesmente não se vê.

Lula tornou-se um farsante, um demagogo, decepcionando pessoas como eu, que até 2020 optava pelo coro em Lula. Vendo que ele estava indiferente à gravidade nacional, criando um clima de festa e trabalhando menos pelo país, vi que o fato de ter cancelado meu voto em Lula em 2022 pode me fazer parecer um chato, num contexto em que se tem que "tomar no cool", ou seja, querer ser legal o tempo todo para lacrar dentro da sociedade da positividade tóxica e da precarização cultural devastadora.

No entanto, leio muito sobre História, leio as notícias diárias, analiso e questiono, e não posso fingir que tudo está legal e vai ficar melhor. O Brasil apresenta sintomas ainda mais frágeis e perigosos do que há 60 anos, apesar sa aparente estrutura consolidada da democracia.

Voltou-se não somente a se acreditar na "burguesia nacional", supostamente mais comprometida com a democracia do que no biênio 1963-1964, mas achar que o presidente dos EUA Joe Biden é "amigo do proletariado". O vergonhoso programa de Biden e Lula para "fortalecer as lutas sindicais" é um vexaminoso atestado do mais puro peleguismo. Por quase nada, João Goulart era erroneamente tido como "manipulador de sindicatos".

Lula só está fazendo campanha pela promoção de sua imagem pessoal. Forja, de maneira artificial e bastante calculada, uma pretensa grandeza histórica, como se fazer história fosse igual a uma competição numa gincana escolar. É constrangedor ver Lula fazendo discurso no exterior com frases óbvias para produzir efeito e serem guardadas nas páginas das enciclopédias futuras.

Não há democracia consolidada no Brasil. As esquerdas não são protagonistas do atual cenário político. Elas apenas o tomaram emprestado da direita moderada, através das brechas so Poder Judiciário, que soltaram Lula menos por se identificar pelo seu carisma do que por temer a perda de controle de um Sérgio Moro, que poderia ir longe demais com seu abuso de poder.

Por isso Lula teve que ceder muito, e vejo o quanto o presidente passou pano no legado de Michel Temer, apenas tirando os pontos mais abertamente perversos, mas semrealizar uma ruptura real. Daí que Lula hoje está mais preocupado com a propaganda pessoal, sem realizar um programa de governo, se limitando a requentar propostas e projetos de duas décadas atrás.

Com esse governo do faz-de-conta, em que supostos resultados positivos são narrados de forma exagerada em estatísticas, em que atores fazendo papel de gente pobre aparecem nos comícios de Lula para "confirmar" as "realizações" de seu mandato atual, a popularidade do presidente, fora da ficção numérica das supostas pesquisas de opinião, cai drasticamente.

O que se anuncia por aí é que a direita moderada está organizando uma campanha através da mídia, usando como isca a retomada das atividades da refinaria Abreu e Lima, em Pernambuco, pela Petrobras. É claro que a mídia vai usar dos clichês do anti esquerdismo para massacrar Lula, mas o que está também em jogo é a própria performance fraca do presidente brasileiro, o que, para desespero dos lulistas, é fato verídico.

Lula, iludido com sua autossuficiência, está menos preparado para resistir a um golpe do que se pensa. Perdido em várias contradições, o petista quer atuar ao mesmo tempo, como uma alternância entre o João Goulart da fase parlamentarista sob o comando de Tancredo Neves e o João Goulart ousado do comício da Central do Brasil.

Lula age com total desprezo a contextos, princípios e restrições. Não mede condições para seus atos. Age por impulso, como um menino mimado querendo que o Destino lhe atenda todas suas vontades. Só porque foi preso em relação aos abusos e ilegalidades da Operação Lava Jato, Lula acha que agora pode fazer o que quer em sua vida.

E isso é muito ruim. Comparando com Jango, este foi prudente ao admitir a sua vulnerabilidade. E tínhamos um cenário sociocultural brasileiro comparativamente melhor, ainda que imperfeito. Sob Lula, porém, nosso cenário sociocultural é herdado da ditadura militar e a classe média abastada de hoje segue o perfil ganancioso e burguês do "milagre brasileiro" com seus mal disfarçados preconceitos elitistas de uma sociedade que finge gostar de pobre e até de se passar por ele.

O grande medo é que Lula pode ser vítima de sua autossuficiência e ser traído pelas circunstâncias. Nada está garantido, e se Lula achar que o campo lhe estará livre para ousadias políticas, ele pode ser tirado do poder. Mas o ponto mais perigoso é que Lula, hoje, faz o papel de mordomo da burguesia ilustrada, e o medo da direita tradicional, diante disso, é ver Lula levando a sério os simulacros do antigo esquerdismo que, da parte do presidente brasileiro, são apenas lembranças do passado.

Daí o caso da refinaria Abreu e Lima, que inquieta a burguesia ortodoxa, mesmo quando é um presidente que aumenta pouco o salário mínimo e baixa muito pouco os preços de alimentos. A direita tradicional brasileira é do tipo que se irrita com a menor vírgula que um presidente da República escrever à revelia da velha elite. 

O mais do que ultramoderado Lula, irritando as megacompanhias de petróleo, anunciantes da grande mídia, pode enfurecer a burguesia com o aumento das atividades da Petrobras na referida refinaria pernambucana.

Mas o mais grave é que Lula, capaz de pagar, com grandes somas de dinheiro, parlamentares para aprovar os produtos do governo, mas realiza baixas diferenças nas quedas de preços e juros e no aumento salarial, pode também irritar os pobres que, fora da bolha lulista, se sentem abandonados pelo presidente. Periga de uma nova campanha antilulista vir ainda mais forte e intensa. Nada está seguro. E Lula pode ser vítima de seus próprios impulsos.

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