A "sociedade do amor" do "eterno" verão pós-pandemia e pós-Bolsonaro é uma farsa. Quase uns "bolsomínions do bem", essa classe, expressão da elite do bom atraso, se diz "democrática" e "de esquerda", mas, quando quer e pode, torna-se tão hidrófoba, odiosa e reacionária quanto os bolsonaristas aos quais repudiam com peito erguido. O bolsonarismo e o lulismo não se confundem, mas essa dualidade parece mais tão semelhante quanto a dos antigos luzias e saquaremas dos tempos do Império.
Um episódio recente causou a ira do chamado "feminismo identitarista", aquele "feminismo de resultados" que glorifica mulheres-objetos, exalta o "golpe do baú" e transforma as mulheres em "machões de saias". Um "feminismo" odioso, mas terrivelmente hedonista, bem próprio das esquerdas médias e dos grupos identitaristas que aposentaram, no imaginário lulista, as pautas trabalhistas, que se tornaram um lixo a ser gradualmente recolhido pela direita moderada.
O famoso e cobiçado ator Cauã Reymond, um dos maiores galãs das gerações mais recentes, deu entrevista ao jornalista Léo Dias para o Dia dos Namorados. O objetivo é colher de Cauã critérios de como seria uma namorada ideal. O texto de Léo descreveu a seguinte revelação:
"A mulher tem que ser caseira igual a ele, malhar, treinar e cuidar da alimentação. Ele não gosta de mulher aparecida, que ri alto, espalhafatosa. Dorme e acorda cedo, ele é assim. Quem namora com ele, também tem que ser. Esquece fumar e beber. Ele é totalmente naturalista e as mulheres também tem que ser".
A revelação irritou muitas mulheres e também os membros das redes sociais. Cauã, de forma equivocada, precipitada e confusa, foi tratado como se fosse um machista ressentido, um "red pill", um "mascus", quando ele simplesmente manifestou seu direito de escolha. Paciência, homens também podem escolher.
Neste caso, Luana Piovani, num de seus surtos equivocados, disse que Cauã é "bonito por fora e podre por dentro". E as feministas identitaristas não gostaram das exigências, elas que adoram rir alto, fumar, beber álcool. E o homem não pode pedir mulher que tenha afinidade com ele que isso é considerado "frescura".
É tamanha estupidez dessa classe identitarista. Coisa constrangedora, mesmo. A escolha de Cauã pode ser pessoal e não necessariamente compartilhada por todos. Pode ser uma opinião individual dele, mas não há coisa errada nisso. Ele tem uma rotina e um estilo de vida que merecem ser respeitados e pedir afinidade para uma pretendente não é frescura, mas uma coisa necessária para que a relação conjugal possa ter um mínimo de equilíbrio e entendimento possível.
Falta de afinidade entre casais só é lindo para o retardado mental que, usando as redes sociais, dá seu pitaco sobre o que não sabe e faz juízo de valor arriscando a dar conselhos para quem ele não conhece. Mas é justamente a falta de afinidade entre casais que provoca ondas de feminicídios muito grandes, sacrificando vidas de mulheres sem necessidade, por causa da ilusão de que sérias divergências pessoais podem ser facilmente resolvidas com uma certidão de casamento.
As mulheres também não podem escolher homens, nesse padrão de sociedade tóxica em que vivemos. A "escolha" aparente é apenas um artifício ditado pelo "sistema", que é marcado pelo racismo estrutural, pelo machismo estrutural, pela sociopatia estrutural, que permite impor papéis restritivos a quem não está no topo da pirâmide social, seja o rapaz caseiro forçado a namorar uma mulher grosseira e espalhafatosa, seja o negro que não pode ouvir jazz mas sim "pagodão" e "funk", seja a mulher independente que precisa "moderar" sua independência casando-se com um empresário "das antigas".
Isso significa que a ordem social brasileira prevalecente, que se diz "democrática" e "amante da liberdade", é na verdade autoritária, reacionária, brutamontes, retrógrada e ultraconservadora, mesmo se escondendo sob a máscara do lulopetismo ou coisa parecida, mesmo se apoiando em bandeiras identitárias. Uma "liberdade" nada livre que obriga a formação imediata de casais, pouco importando a afinidade, uma "coisa linda" cuja conta acaba sendo paga por um grande obituário de jovens mulheres.
Daí que isso mostra o quanto temos uma ordem social ainda originária dos tempos da ditadura militar, com a vergonhosa hipocrisia daqueles cujos avós pediram a queda de João Goulart mas hoje se consideram "esquerdistas desde o berço", se achando pós-PhD em marxismo só porque ouviram um sucesso de axé-music. É tanta estupidez, tanta falsidade, tanta falta de discernimento e de respeito.
Deixem Cauã Reymond em paz. Chega de intolerância contra as opções dele. As escolhas dele refletem o cotidiano pessoal dele, o que ele quer para uma vida de bem estar e dignidade. Homem tem direito de escolher uma mulher e até de, se necessário, ficar sozinho. Considerar essas necessidades pode ser um remédio que, quem sabe, pode prevenir grande parte da violência machista que assusta nosso país.
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