CHITÃOZINHO & XORORÓ - CATÓLICOS E TUCANOS, EM CAMPANHA A FAVOR DE AÉCIO NEVES PARA PRESIDENTE DO BRASIL EM 2014.
As esquerdas ainda não conseguem se resolver quando o assunto é cultura popular.
Elas trazem ideias muito interessantes no âmbito político, social, econômico e jurídico, trazendo informações que a mídia hegemônica se recusa terminantemente a transmitir.
Nesse campo, quase sempre acertam e dão valiosas contribuições aos debates sobre os abusos da plutocracia político-empresarial e seus vinculados.
Mas quando o assunto é cultura popular, música brasileira, comportamento, esporte ou religião, patinam em chão molhado e escorregam.
Um exemplo disso é o texto "Por mais Chitãozinho e Xororó e menos Pai Nosso nas escolas públicas", de Leonardo Sakamoto.
Eu havia criticado Sakamoto em outra ocasião, quando ainda fazia O Kylocyclo.
Mas, nos últimos tempos, estava gostando bastante de textos em que ele criticava os abusos e retrocessos trazidos pelo Brasil de Michel Temer.
Até que, hoje, ele veio com este texto. Que talvez tivesse outro título, trocando Chitãozinho & Xororó por Zezé di Camargo & Luciano, caso tivesse sido escrito uns cinco anos atrás.
Isso porque Zezé di Camargo havia decepcionado as esquerdas médias quando disse que no Brasil "não havia ditadura militar, mas militarismo vigiado".
O texto de Sakamoto começa bem criticando a imposição da Secreteria de Educação de Barra Mansa de que toda escola pública deveria instituir o Pai Nosso, além dos hinos cívicos, na cerimônia de recepção diária dos alunos, antes de iniciarem as aulas.
Mas ele derrapa quando o autor sugere que haja "mais Chitãozinho & Xororó" e "menos Pai Nosso" nas escolas públicas.
Há uma boa-fé, em parte das esquerdas, de que não há diferença entre a "cultura popular de mercado" e o folclore musical brasileiro.
Além disso, as gerações mais jovens, nascidas de 1960 para cá, não percebem a diferença entre a música caipira de raiz e a música "sertaneja" mercadológica de hoje.
Paciência, é uma geração que não estudou José Ramos Tinhorão, e nem leu o livro sobre música caipira de José Hamilton Ribeiro.
Antes de ser conhecido como repórter do Globo Rural, Hamilton Ribeiro fez parte da boa geração que atuou na revista Realidade, da qual vieram vários jornalistas que fundaram Caros Amigos.
Através do livro Música caipira: as 270 maiores modas de todos os tempos, pode-se entender a verdadeira natureza da canção de raiz.
É certo que eu, com 46 anos, também sou da geração que "conheceu" a cultura popular através dos programas de auditório durante o período ditatorial.
Mas eu pelo menos pude olhar além dos cenários televisivos e discernir os fantoches culturais dos grandes artistas.
A bregalização começou para valer nos cenários televisivos dos anos 1970, como uma "cultura popular de mercado" bem ao gosto da sociedade conservadora da época.
Era a época em que pastiches de cultura popular, que defino como brega-popularesco, passaram a ser difundidos em alta escala.
Chitãozinho & Xororó foram apenas os pioneiros dessa derrocada comercial da bregalização. Eles eram mais Bee Gees e cada vez menos Tonico e Tinoco, em se tratando de referências musicais.
Mas, diante de uma época em que tudo se nivela por baixo, eles, a exemplo de Steven Spielberg, passaram a ser considerados "o máximo de genialidade".
Spielberg e Chitãozinho & Xororó apenas valem pela eficácia do entretenimento, mas artisticamente não correspondem sequer a um quinto da suposta genialidade atribuída a eles.
Mas como falar em neo-realismo italiano ou na antiga música caipira de raiz soa distante para as gerações atuais, até os pastiches comerciais de vinte anos atrás soam o suprassumo da genialidade artística, bastando levar qualquer incauto às lágrimas.
Vamos às incoerências do texto de Sakamoto.
Em primeiro lugar, ele cita a música "Evidências", pegando carona na falsa ideia de que é uma música de autoria da dupla.
Não é. "Evidências" é composição que o cantor José Augusto havia feito e até gravado, mas foi consagrada pela dupla paranaense.
Em segundo lugar, a música é um sucesso consagrado pela mídia hegemônica, sobretudo com o revival da canção da dupla "sertaneja" através da lembrança de alguns famosos.
Se "Evidências", que a dupla gravou nos anos 80, voltou à tona, ela teve uma ajudinha da mesma Rede Globo que respalda as pautas contestadas por Sakamoto.
Em terceiro lugar, Chitãozinho & Xororó apoiaram Aécio Neves na campanha presidencial de 2014, são tucanos assumidíssimos e também latifundiários.
Não há como sonhar numa "reforma agrária musical" pensando na dupla.
Neste âmbito, propor Chitãozinho & Xororó para se contrapôr a uma imposição religiosa nas escolas é mais ou menos como sugerir o nome de Sérgio Moro para combater o novo cangaço nas cidades nordestinas.
Em quarto lugar, Chitãozinho & Xororó são católicos devotíssimos e já gravaram uma versão de "Ave Maria" originalmente composta por Charles Gounod sobre partituras originais de Johann Sebastian Bach.
Uma letra de forte acento católico, e a versão da dupla é tocada em várias rádios durante o horário das 18 horas, que a tradição católica atribui à mãe de Jesus.
Sob este prisma, defender "menos Pai Nosso e mais Chitãozinho & Xororó" soaria algo como "menos abóbora e mais gerimum".
Talvez até a própria dupla Chitãozinho & Xororó apoiasse a determinação da prefeitura de Barra Mansa, com as mesmas razões apresentadas por sua Secretaria de Educação.
O que se pode concluir isso é que as esquerdas deveriam seguir a seguinte proposição de educação cultural.
É a proposta de haver menos Paulo César Araújo e mais José Ramos Tinhorão.
Para que, através da cultura musical brasileira, pudéssemos priorizar as manifestações que fogem do comercialismo que trata o povo pobre como caricatura, comercialismo que ocorre mesmo à merce da pieguice "sertaneja" e da provocatividade de ritmos como o "funk".
Se não for por essa proposta, as esquerdas vão deixar que a sociedade plutocrata troque Paulo Freire por Alexandre Frota. E verão que "evidências" resultaram com a apologia à breguice cultural.
As esquerdas ainda não conseguem se resolver quando o assunto é cultura popular.
Elas trazem ideias muito interessantes no âmbito político, social, econômico e jurídico, trazendo informações que a mídia hegemônica se recusa terminantemente a transmitir.
Nesse campo, quase sempre acertam e dão valiosas contribuições aos debates sobre os abusos da plutocracia político-empresarial e seus vinculados.
Mas quando o assunto é cultura popular, música brasileira, comportamento, esporte ou religião, patinam em chão molhado e escorregam.
Um exemplo disso é o texto "Por mais Chitãozinho e Xororó e menos Pai Nosso nas escolas públicas", de Leonardo Sakamoto.
Eu havia criticado Sakamoto em outra ocasião, quando ainda fazia O Kylocyclo.
Mas, nos últimos tempos, estava gostando bastante de textos em que ele criticava os abusos e retrocessos trazidos pelo Brasil de Michel Temer.
Até que, hoje, ele veio com este texto. Que talvez tivesse outro título, trocando Chitãozinho & Xororó por Zezé di Camargo & Luciano, caso tivesse sido escrito uns cinco anos atrás.
Isso porque Zezé di Camargo havia decepcionado as esquerdas médias quando disse que no Brasil "não havia ditadura militar, mas militarismo vigiado".
O texto de Sakamoto começa bem criticando a imposição da Secreteria de Educação de Barra Mansa de que toda escola pública deveria instituir o Pai Nosso, além dos hinos cívicos, na cerimônia de recepção diária dos alunos, antes de iniciarem as aulas.
Mas ele derrapa quando o autor sugere que haja "mais Chitãozinho & Xororó" e "menos Pai Nosso" nas escolas públicas.
Há uma boa-fé, em parte das esquerdas, de que não há diferença entre a "cultura popular de mercado" e o folclore musical brasileiro.
Além disso, as gerações mais jovens, nascidas de 1960 para cá, não percebem a diferença entre a música caipira de raiz e a música "sertaneja" mercadológica de hoje.
Paciência, é uma geração que não estudou José Ramos Tinhorão, e nem leu o livro sobre música caipira de José Hamilton Ribeiro.
Antes de ser conhecido como repórter do Globo Rural, Hamilton Ribeiro fez parte da boa geração que atuou na revista Realidade, da qual vieram vários jornalistas que fundaram Caros Amigos.
Através do livro Música caipira: as 270 maiores modas de todos os tempos, pode-se entender a verdadeira natureza da canção de raiz.
É certo que eu, com 46 anos, também sou da geração que "conheceu" a cultura popular através dos programas de auditório durante o período ditatorial.
Mas eu pelo menos pude olhar além dos cenários televisivos e discernir os fantoches culturais dos grandes artistas.
A bregalização começou para valer nos cenários televisivos dos anos 1970, como uma "cultura popular de mercado" bem ao gosto da sociedade conservadora da época.
Era a época em que pastiches de cultura popular, que defino como brega-popularesco, passaram a ser difundidos em alta escala.
Chitãozinho & Xororó foram apenas os pioneiros dessa derrocada comercial da bregalização. Eles eram mais Bee Gees e cada vez menos Tonico e Tinoco, em se tratando de referências musicais.
Mas, diante de uma época em que tudo se nivela por baixo, eles, a exemplo de Steven Spielberg, passaram a ser considerados "o máximo de genialidade".
Spielberg e Chitãozinho & Xororó apenas valem pela eficácia do entretenimento, mas artisticamente não correspondem sequer a um quinto da suposta genialidade atribuída a eles.
Mas como falar em neo-realismo italiano ou na antiga música caipira de raiz soa distante para as gerações atuais, até os pastiches comerciais de vinte anos atrás soam o suprassumo da genialidade artística, bastando levar qualquer incauto às lágrimas.
Vamos às incoerências do texto de Sakamoto.
Em primeiro lugar, ele cita a música "Evidências", pegando carona na falsa ideia de que é uma música de autoria da dupla.
Não é. "Evidências" é composição que o cantor José Augusto havia feito e até gravado, mas foi consagrada pela dupla paranaense.
Em segundo lugar, a música é um sucesso consagrado pela mídia hegemônica, sobretudo com o revival da canção da dupla "sertaneja" através da lembrança de alguns famosos.
Se "Evidências", que a dupla gravou nos anos 80, voltou à tona, ela teve uma ajudinha da mesma Rede Globo que respalda as pautas contestadas por Sakamoto.
Em terceiro lugar, Chitãozinho & Xororó apoiaram Aécio Neves na campanha presidencial de 2014, são tucanos assumidíssimos e também latifundiários.
Não há como sonhar numa "reforma agrária musical" pensando na dupla.
Neste âmbito, propor Chitãozinho & Xororó para se contrapôr a uma imposição religiosa nas escolas é mais ou menos como sugerir o nome de Sérgio Moro para combater o novo cangaço nas cidades nordestinas.
Em quarto lugar, Chitãozinho & Xororó são católicos devotíssimos e já gravaram uma versão de "Ave Maria" originalmente composta por Charles Gounod sobre partituras originais de Johann Sebastian Bach.
Uma letra de forte acento católico, e a versão da dupla é tocada em várias rádios durante o horário das 18 horas, que a tradição católica atribui à mãe de Jesus.
Sob este prisma, defender "menos Pai Nosso e mais Chitãozinho & Xororó" soaria algo como "menos abóbora e mais gerimum".
Talvez até a própria dupla Chitãozinho & Xororó apoiasse a determinação da prefeitura de Barra Mansa, com as mesmas razões apresentadas por sua Secretaria de Educação.
O que se pode concluir isso é que as esquerdas deveriam seguir a seguinte proposição de educação cultural.
É a proposta de haver menos Paulo César Araújo e mais José Ramos Tinhorão.
Para que, através da cultura musical brasileira, pudéssemos priorizar as manifestações que fogem do comercialismo que trata o povo pobre como caricatura, comercialismo que ocorre mesmo à merce da pieguice "sertaneja" e da provocatividade de ritmos como o "funk".
Se não for por essa proposta, as esquerdas vão deixar que a sociedade plutocrata troque Paulo Freire por Alexandre Frota. E verão que "evidências" resultaram com a apologia à breguice cultural.
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