Mais um episódio do Brasil temeroso.
A juíza Ida Inês Del Cid, da 2ª Vara da Fazenda Pública de São Bernardo do Campo, acatou o pedido do Ministério Público de São Paulo para impedir a apresentação de Caetano Veloso numa ocupação de manifestantes do MTST em São Bernardo do Campo, no ABC paulista.
O Movimento dos Trabalhadores Sem Teto, liderado pelo ativista Guilherme Boulos, está ocupado no bairro Planalto e a apresentação seria ontem às 19 horas.
A juíza disse que, "por seu brilhantismo", o cantor baiano atrairia muita gente e criaria risco à segurança do local, que ela disse "não ter estruturas para apresentações musicais desse porte".
Ela alegou que o cantor iria superlotar o local, o que, segundo ela, poderia causar confusão e outros incidentes graves.
A juíza determinou ainda que a desobediência da sentença daria em multa de R$ 500 mil e até uso de força policial, se for o caso, para cumprimento da decisão.
Mas a tese da "segurança" teria outro motivo.
Afinal, o ex-presidente Lula, semanas atrás, também esteve na ocupação e chamou muita gente.
A ideia subliminar é que Caetano Veloso iria dar visibilidade ao MTST.
Mas Lula também tem muita visibilidade e foi para a ocupação do MTST da mesma forma.
Só que Lula, segundo a plutocracia jurídica, está contextualizado com a ocupação dos sem-teto e, com o episódio, tanto o MTST quanto Lula poderiam ser "isolados" pelo discurso opositor da grande mídia.
Caetano Veloso, cuja projeção está acima de ideologias, é que é o problema. Seu vínculo de imagem ao MTST pode dar maior cartaz a Guilherme Boulos e, daí para ele iniciar carreira política, é um pequeno passo.
Os dirigentes do Partido dos Trabalhadores (PT) já veem em Boulos um potencial sucessor de Lula.
Com diferenças de contexto, a trajetória de Lula iniciou-se de maneira parecida com a de Boulos.
Daí o problema, justamente quando as elites começam a preparar candidatos "moderados" para a sucessão de Michel Temer e para a renovação do Legislativo.
Caetano pode ter seus senões, suas posturas equivocadas e seus altos e baixos.
Mas ali era o grandioso cantor e compositor mostrando seu talentoso repertório de cinco décadas.
E com uma apresentação gratuita, acessível a um grande público.
Ele tem o direito de cantar para os sem-teto e manifestar solidariedade a eles.
Caetano ficou chateado com a decisão e disse que a impressão, com a decisão da juíza, que o Brasil "não é um ambiente propriamente democrático".
"É a primeira vez que sou impedido de cantar no período democrático", acrescentou o baiano.
Apesar da ordem de cancelamento, Caetano Veloso foi a São Bernardo do Campo ver os sem-teto.
As atrizes Sônia Braga, Letícia Sabatella, Alinne Moraes e Marina Person, esta ex-VJ da MTV e também cineasta, também foram ao local e manifestaram solidariedade.
Segundo Guilherme Boulos, que destacou o impedimento de entrada de um gerador para o evento por ordem da Guarda Civil Metropolitana, a prefeitura de São Bernardo do Campo tentou impedir a realização do concerto de forma arbitrária.
Boulos afirmou que a apresentação ocorrerá, mesmo que seja com violão
Manifesto aqui meu repúdio à proibição da apresentação, porque há meios possíveis de garantir a segurança e o relativo conforto no local.
Embora em outras ocasiões faça críticas a Caetano Veloso, defendo, aqui, o direito dele se apresentar como músico aos sem-teto e interagir com o público à sua volta.
Espero que deem um jeito para realizar o evento. Nem que seja de forma improvisada como num luau de praia, numa apresentação com voz e violão.
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