O Brasil, que tardiamente vive os "anos loucos" vividos pelos estadunidenses - a História registra como a euforia consumista e hedonista dos roaring twenties - , não consegue perceber os males dessa versão repaginada do "milagre brasileiro" comandada por um Lula mais preocupado em falar e fazer o jogo das aparências do que fazer, de fato.
Ninguém percebe as lições amargas que a classe média abastada sofreu, quando seus privilégios abusivos e a falta de oportunidades de distribuição justa de renda impulsionaram muitos pobres para a criminalidade, com a explosão de assaltos e o crescimento do crime organizado.
É um cenário cruel em que poucos se acham no direito de ter demais e gastar com o supérfluo, enquanto quem não tem acumula contas e dívidas e cada vez tem menos o que comer. O mais irônico é que esse cenário, próprio dos períodos dos governos dos generais Médici e Geisel, quando o AI-5 estava vigente no Brasil, se repete num momento em que a democracia se proclama na sua maior plenitude, sob o comando de Lula.
É irônico isso, mas existe um motivo: a classe dominante que monitora a "democracia plena" de hoje é a mesma que tomava as rédeas do Brasil nos tempos do "milagre brasileiro". Se vê que não há cenário livre para fazer palestras, monografias, documentários, tudo é castrado por um sistema de censura privada, onde as questões financeiras, a tal "paz econômica", substituíram a antiga justificativa da "segurança nacional". Hoje ninguém é preso ou torturado porpensar diferente do status quo. Mas é cancelado e boicotado na Internet.
Até na cultura rock, antes um espaço de expressão simples e acessível do pensamento crítico, ficou castrada quando o seu maior espaço de divulgação, a 89 FM, é controlada por um dos chefões da aristocracia empresarial brasileiro e membro de uma oligarquia paulista ligada a Paulo Maluf.
E isso é até pior, pois na época da ditadura a cultura brasileira tinha seis espaços de expressão mais relevantes, pouco além das pequenas bolhas que nos restam hoje. O caso da Eldo Pop, rádio carioca das Organizações Globo, nem se compara, porque Roberto Marinho mantinha distância do comando da rádio e dava liberdade para o saudosíssimo Newton Duarte, o Big Boy, tocar rock de primeira na programação. O que é zilhões de vezes diferente de uma "Jovem Pan com guitarras" da 89 FM A Rádio Rockefeller e sua programação"só sucesso" e seus locutores do mesmo estilo do Emílio Surita da Pan.
E a MPB hoje tem menos espaços de expressão e repercussão do que há 50 anos. A bregalização roubou vários de seus espaços, incluindo as universidades, enquanto a boa música brasileira perdeu até seu último espaço de furo da bolha sociocultural, as trilhas de novela da Globo. Esse cenário catastrófico faz muito pseudoartista se tornar mil vezes mais rico do que muitos bossanovistas acusados de "aristocráticos" mas ficam na fila do INSS para pegar uma pequena verba para pagar as contas e ter uma alimentação mais digna.
Se, naquela época, quando o senso crítico, mesmo proibido por lei, era socialmente aceito, hoje o pensamento crítico tem mais limites, se não de expressão, ao menos de repercussão. E a sociedade brasileira viu explodir uma revolta do povo pobre que, sem ter a quem recorrer, passou a assaltar pessoas, criando uma triste rotina subestimada pela própria classe média bem de vida, com muito dinheiro, a "sociedade do amor" sem medo e sem amor.
Mas aí as pessoas me lembram do Lula "combatendo" a pobreza, livrando o país da ameaça da revolta dos ladrões armados. É, mas recentemente, no Rio de Janeiro de Eduardo Paes, hoje "amiguinho de infância" do Lula, um homem sequestrou um ônibus na Rodoviária Novo Rio.
E devemos lembrar que a "inclusão social" de Lula, hoje, só inclui mesmo a elite do bom atraso, essa frente ampla que vai dos pobres remediados aos famosos milionários, gente preocupada só em ganhar demais para fins recreativos. Ganhar demais para gastar tudo com supérfluos.
E aí vemos os novos excluídos sociais, gente que está fora da festa identitária do "espetáculo do crescimento" do Lula Paz e Amor, mascote da Faria Lima. Nos dois extremos em que incluem os muito intelectualizados e os muito emotivos, de um lado, e os miseráveis irrecuperáveis de outro, e é aí que a coisa está no perigo.
Lula perde popularidade e, fora da bolha lulista, as pessoas hostilizam o presidente brasileiro. Eu percebo isso quando estou na rua, em qualquer lugar onde ando. Só o "pobre de novela", que faz "festinhas de aniversário" todo fim de semana, é que está feliz com o atual presidente.
O problema é quando o egoísmo de uma sociedade que quer demais para si, a "sociedade do amor" sem medo e sem amor que ganha fácil e sem necessidade em promoções, Sorteios, loterias e até concursos públicos, chegar a um limite insustentável, as ruas se tornarão cada vez mais vulneráveis a novos surtos de assaltos de diversos tipos, nas praças, nos ônibus, nos bancos etc. A situação não será fácil e será inútil os insentões de plantão relativizarem tudo.
Nunca na História do nosso país tivemos uma elite tão egoísta, ganhando demais sem necessidade e gastando muito em ninharias. Enquanto há pessoas endividadas precisando de grana para pagar as contas, os que ganham demais não abrem mão do supérfluo. E a religiosidade dominante pedindo para perdoarmos algozes e abusadores e sermos piedosos com o egoísmo alheio. Até que muitos brasileiros sem chão não aguentarem demais e partir para cima da gente bem de vida.
O Brasil continua frágil.
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