Vamos combinar uma coisa. As redes sociais são dominadas por uma elite bem de vida e de bem com a vida, uma classe brasileira que se acha "a mais legal do planeta", e "a mais equilibrada", sem os fundamentalismos afro-asiáticos nem os pessimismos distópicos do Existencialismo europeu.
Essa classe quer parecer tudo de bom e soar, para outras pessoas, diferente dos padrões convencionais da humanidade. Daí a luta de muitos em serem aquilo que não são, parecerem o oposto de si mesmos para lacrar na Internet e obter popularidade e prestígio.
Daí ser compreensível que a falsidade é um fenômeno tipicamente brasileiro. O "tomar no cool" que combina pretensiosismos e falsos preciosismos, grandiloquência e espiral do silêncio, a obsessão em parecer diferente sem abandonar as convenções sociais, a luta em parecer novo sem deixar de ser velho, de estar na vanguarda mesmo sendo antiquado, na esperança de que o futuro repita o passado enquanto se vê um museu de grandes novidades, como nos lembrava o saudoso Agenor.
E deixamos museus de grandes novidades, junto aos grandes gênios precocemente falecidos, se queimarem em incêndios causados pelo descaso do poder público, ou se apagarem no esquecimento da opinião pública. Não interessam mais os debates culturais dos tempos de Juscelino Kubitschek e João Goulart, não interessa mais o jornalismo investigativo, e nem a Comissão da Verdade desperta algum tipo de interesse.
E a morte suspeita do sobrinho do "médium da peruca", aquele mesmo das frases publicadas nas redes sociais para "alegrar o dia"? Sim, fala-se de Marielle morta e prestes a ter o nome de seu mandante revelado, mas Amauri Pena, morto em 1961 depois de caluniado pelos próprios "espíritas" (que juram serem avessos a caluniar até os piores inimigos) devido ao fato de que o jovem denunciou as fraudes do tio que quase foi para a cadeia por ter usado o nome de Humberto de Campos em obras fake dotadas do mais mesquinho apelo igrejista.
Sim, o sobrinho do "médium da peruca" (que, prestando atenção, lembra muito aqueles caseiros depois revelados vilões nos desenhos do Scooby-Doo) teria sido morto por queima de arquivo, num episódio acobertado para blindar um ídolo religioso que mais defendeu a ditadura militar, mas do qual as esquerdas passam pano com muito gosto.
E, para completar o quadro surreal, até ser considerado o feminicídio um crime hediondo, houve casos de feminicidas ricos convidados para jantar em família de boa posição social que ofereciam suas lindas filhas para se casarem com os facínoras. Mesmo agindo em nome do machismo, houve feminicidas que, saindo da cadeia, se casavam com mulheres quase feministas e de personalidade bastante arrojada. Enquanto isso, os rapazes pacatos do conto "O Rouxinol e a Rosa" de Oscar Wilde são atuais e mais brasileiros do que se imagina.
Neste país em que os abusos da velha ordem social criam situações surreais de fazer Franz Kafka ficar paralisado de tão chocado, o presidente Lula, que prometeu um governo "mais à esquerda" do que nos dois mandatos anteriores, resolveu passar pano na ditadura militar, cancelando eventos em memória das vítimas desse pesadelo político de 21 anos iniciado em abril de 1964.
Lula dá indícios de não se sentir incomodado com a ditadura militar. Há quem diga que o então operário teria apoiado, na boa-fé, a queda de Jango. Não se sabe se isso é verdade, mas Jango, no fim da vida, talvez observasse no então líder sindical uma esperança para o Brasil.
Mas Lula tornou-se um pelego que finge brigar com a Faria Lima, dentro da combinada rivalidade de mentirinha, tipo Marlene e Emilinha Borba. Nota-se em Lula um pouco caso com os princípios esquerdistas mais essenciais e é inútil que seus seguidores saiam por aí fazendo justificativas e usando e abusando de termos como "pragmatismo" e "estratégia", desculpas sempre usadas para quem foge do caminho correto.
José Dirceu teve que admitir que Lula e seus seguidores estão perdendo a batalha das narrativas. Os argumentos são rasos e não trazem um pingo de convencimento. Os lulistas aprenderam mal com a intelectualidade pró-brega (sobretudo o "frila" da Folha, o aluno-modelo de Otávio Frias Filho, Pedro Alexandre Sanches, que passeou pelas redações de esquerda para injetar o ponto de vista do ex-patrão e eterno patrão-colega Tavinho), que não convencem com sua choradeira "sem preconceitos", sobretudo para defender o "funk" que espetaculariza a pobreza humana.
O Brasil segue nessa deterioração sociocultural e Lula não quer romper com a ordem social que tomou as rédeas naqueles anos de chumbo. Até porque hoje nossas elites hoje apoiam Lula, devido às concessões que ele fez nos últimos anos.
E se agora o pensamento crítico é mais discriminado socialmente do que nos tempos do AI-5, então a coisa é grave. E tem gente que acredita que é ficando calado que vamos alcançar o Primeiro Mundo. A gente depois diz que esse pessoal é atrasado e o pessoal não gosta.
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