BELCHIOR E ALMIR GUINETO - Duas grandes perdas recentes da MPB.
O desmonte da Música Popular Brasileira foi consolidado por um discurso intelectual que prevaleceu por quase quinze anos sem um questionamento à altura.
Fora meus textos contra o brega-popularesco, não havia um questionamento à altura da pregação intelectual que, mesmo atendendo a interesses do mercado e dos chefões midiáticos, invadia até as páginas da mídia esquerdista, como num tendencioso proselitismo.
Mesmo assim, eu não tinha a visibilidade que pudesse fazer frente a jornalistas culturais, historiadores, antropólogos e cineastas que tinham a seu favor uma enorme visibilidade.
Não era uma visibilidade nas dimensões de um Luciano Huck, mas era suficiente para abafar os debates esquerdistas sobre os problemas da cultura popular.
Nessa época, se prometia que o jabaculê dos hits "populares demais" da breguice musical hegemônica no gosto do "povão" desde a ditadura militar seria o "folclore musical do futuro".
E como se deu o desmonte da MPB?
E por que se empurrou às esquerdas a defesa da bregalização cultural, sobretudo musical, que sempre foi historicamente apoiada pela midia plutocrática e por setores nada progressistas da sociedade?
Isso empastelou de tal forma os debates culturais progressistas que isso só foi permitido acontecer quando foi tarde demais, com Michel Temer no poder.
Até pouco tempo atrás, as "esquerdas médias" acreditavam na falácia de que, por exemplo, reprovar o "funk" era "agenda" dos "midiotas de direita".
Não enxergaram as mídias sociais, onde os "sociopatas", descontando alguns extremistas, são os que mais gostam do "popular demais", sobretudo o "funk".
Se os chamados "coxinhas" adoram tanto o "funk", por que criticá-lo faz parte da "agenda da direita"?
Esse discurso da bregalização prevaleceu porque uma parcela de intelectuais foi designada pelos barões da mídia a fazer um trabalho freelancer.
Sem vínculo empregatício ou institucional e, às vezes, jogando no campo adversário (a mídia de esquerda), eles vieram com o proselitismo do "ideal da pobreza linda".
Era um conjunto de valores nos quais toda a simbologia da vida pobre tinha que ser mantida, ou seja, todo o padrão de vida das classes pobres, com sua precariedade e seus valores retrógrados.
Mais parecia um ufanismo da ditadura militar adaptado para o âmbito da "periferia". Mas o discurso era empurrado até na revista Carta Capital.
Esculhambou-se uma boa parcela da MPB, tentou cooptar outra parcela para apoiar ou consentir com a breguice vigente.
Quem não se lembra do arremedo de "dirigismo comunista" no qual se obrigava as esquerdas a aceitar Zezé di Camargo & Luciano, símbolos de um falso guevarismo musical em 2005, mesmo sendo eleitores fiéis de Ronaldo Caiado e com filme biográfico produzido pela Globo?
Agora as esquerdas choram o "leite derramado" de um Chico Buarque escorraçado como se fosse o José Dirceu da MPB.
A intelectualidade "bacana" que queria um Brasil brega recuou, embora haja uns que continuem com seu "bom esquerdismo", de olho de futuras verbas públicas se caso Lula voltar ao poder.
Diante de tanta pregação desse tipo, a MPB desaparece aos poucos, com o falecimento gradual de seus integrantes, nunca compensado com talentos à altura.
Belchior e Almir Guineto foram os óbitos mais sentidos, nas últimas semanas, ambos com 71 anos incompletos.
Eram nomes de um tempo em que a música brasileira, seja de classe média universitária, seja de origem pobre, era marcada por artistas genuínos, com talento e expressão viscerais.
Gente que compunha música com sangue, neurônios, cérebro, longe dessa "MPB de churrascaria" dos mesmos covers surrados, mesclados com alguma breguice musical.
Belchior traduziu o temperamento contracultural de europeus e estadunidenses para a música cearense, de uma forma muito excêntrica, mas peculiar.
Era um artista "difícil" como poucos, não submisso ao mercado.
Almir Guineto, por sua vez, foi um grande sambista, um dos fundadores do histórico Fundo de Quintal e um compositor ímpar.
Era um compositor mais voltado às raízes do samba, na Zona Norte carioca.
Nunca época em que o samba de raiz está, sociologicamente, "bossificado", mais próximo das elites do Leblon que o apropriaram do que do povo da Zona Norte que o criou, a morte de Almir Guineto causa um forte abalo.
Isso porque o que majoritariamente se entende como "as novas gerações do samba" são grupos ou cantores do chamado "pagode romântico" ou sambrega.
Esses grupos ou cantores que, na verdade, gravam "discos de arranjador".
Esses pretensos "sambistas" dão a falsa impressão de que fazem "samba autêntico" ou pretenso samba soul ou alguma aventura mais emepebista, quando na verdade é o arranjador de plantão que "embeleza" o repertório e a performance naturalmente bregas.
O que vemos hoje é cosmética, em várias tendências musicais.
Não temos mais grandes artistas surgidos nas classes populares com a frequência e a projeção que tínhamos no passado.
Inscrever a geração neo-brega de 1990-1992 para um programa trainée de pretensa MPB não resolve.
Não haverá sucessores de Belchior e Almir Guineto com a repaginação, esforçada mas tendenciosa, de "sertanejos" e "pagodeiros" que fizeram sucesso banindo a MPB nas rádios durante a Era Collor.
Temos que repensar a MPB não na cosmética de "repaginar" ídolos radiofônicos do brega-popularesco, que só farão algo sob a orientação de outrem.
Eles nunca terão a visceralidade, a organicidade dos emepebistas autênticos.
Esse é o problema que os quixotescos do "combate ao preconceito" do pró-brega nunca falaram.
É fácil dar um banho de loja, de luz, chamar um bom arranjador por trás e repaginar os ídolos brega-popularescos de pouco tempo atrás.
Tudo poderá parecer bem feito, organizado, bonito. Mas o essencial sempre faltará, que é a espontaneidade.
Uma espontaneidade que existiu nos artistas que estamos perdendo e ainda existe nos artistas que já estão muito idosos para representar o futuro da MPB, tendo a felicidade de continuarem representando o presente.
O desmonte da Música Popular Brasileira foi consolidado por um discurso intelectual que prevaleceu por quase quinze anos sem um questionamento à altura.
Fora meus textos contra o brega-popularesco, não havia um questionamento à altura da pregação intelectual que, mesmo atendendo a interesses do mercado e dos chefões midiáticos, invadia até as páginas da mídia esquerdista, como num tendencioso proselitismo.
Mesmo assim, eu não tinha a visibilidade que pudesse fazer frente a jornalistas culturais, historiadores, antropólogos e cineastas que tinham a seu favor uma enorme visibilidade.
Não era uma visibilidade nas dimensões de um Luciano Huck, mas era suficiente para abafar os debates esquerdistas sobre os problemas da cultura popular.
Nessa época, se prometia que o jabaculê dos hits "populares demais" da breguice musical hegemônica no gosto do "povão" desde a ditadura militar seria o "folclore musical do futuro".
E como se deu o desmonte da MPB?
E por que se empurrou às esquerdas a defesa da bregalização cultural, sobretudo musical, que sempre foi historicamente apoiada pela midia plutocrática e por setores nada progressistas da sociedade?
Isso empastelou de tal forma os debates culturais progressistas que isso só foi permitido acontecer quando foi tarde demais, com Michel Temer no poder.
Até pouco tempo atrás, as "esquerdas médias" acreditavam na falácia de que, por exemplo, reprovar o "funk" era "agenda" dos "midiotas de direita".
Não enxergaram as mídias sociais, onde os "sociopatas", descontando alguns extremistas, são os que mais gostam do "popular demais", sobretudo o "funk".
Se os chamados "coxinhas" adoram tanto o "funk", por que criticá-lo faz parte da "agenda da direita"?
Esse discurso da bregalização prevaleceu porque uma parcela de intelectuais foi designada pelos barões da mídia a fazer um trabalho freelancer.
Sem vínculo empregatício ou institucional e, às vezes, jogando no campo adversário (a mídia de esquerda), eles vieram com o proselitismo do "ideal da pobreza linda".
Era um conjunto de valores nos quais toda a simbologia da vida pobre tinha que ser mantida, ou seja, todo o padrão de vida das classes pobres, com sua precariedade e seus valores retrógrados.
Mais parecia um ufanismo da ditadura militar adaptado para o âmbito da "periferia". Mas o discurso era empurrado até na revista Carta Capital.
Esculhambou-se uma boa parcela da MPB, tentou cooptar outra parcela para apoiar ou consentir com a breguice vigente.
Quem não se lembra do arremedo de "dirigismo comunista" no qual se obrigava as esquerdas a aceitar Zezé di Camargo & Luciano, símbolos de um falso guevarismo musical em 2005, mesmo sendo eleitores fiéis de Ronaldo Caiado e com filme biográfico produzido pela Globo?
Agora as esquerdas choram o "leite derramado" de um Chico Buarque escorraçado como se fosse o José Dirceu da MPB.
A intelectualidade "bacana" que queria um Brasil brega recuou, embora haja uns que continuem com seu "bom esquerdismo", de olho de futuras verbas públicas se caso Lula voltar ao poder.
Diante de tanta pregação desse tipo, a MPB desaparece aos poucos, com o falecimento gradual de seus integrantes, nunca compensado com talentos à altura.
Belchior e Almir Guineto foram os óbitos mais sentidos, nas últimas semanas, ambos com 71 anos incompletos.
Eram nomes de um tempo em que a música brasileira, seja de classe média universitária, seja de origem pobre, era marcada por artistas genuínos, com talento e expressão viscerais.
Gente que compunha música com sangue, neurônios, cérebro, longe dessa "MPB de churrascaria" dos mesmos covers surrados, mesclados com alguma breguice musical.
Belchior traduziu o temperamento contracultural de europeus e estadunidenses para a música cearense, de uma forma muito excêntrica, mas peculiar.
Era um artista "difícil" como poucos, não submisso ao mercado.
Almir Guineto, por sua vez, foi um grande sambista, um dos fundadores do histórico Fundo de Quintal e um compositor ímpar.
Era um compositor mais voltado às raízes do samba, na Zona Norte carioca.
Nunca época em que o samba de raiz está, sociologicamente, "bossificado", mais próximo das elites do Leblon que o apropriaram do que do povo da Zona Norte que o criou, a morte de Almir Guineto causa um forte abalo.
Isso porque o que majoritariamente se entende como "as novas gerações do samba" são grupos ou cantores do chamado "pagode romântico" ou sambrega.
Esses grupos ou cantores que, na verdade, gravam "discos de arranjador".
Esses pretensos "sambistas" dão a falsa impressão de que fazem "samba autêntico" ou pretenso samba soul ou alguma aventura mais emepebista, quando na verdade é o arranjador de plantão que "embeleza" o repertório e a performance naturalmente bregas.
O que vemos hoje é cosmética, em várias tendências musicais.
Não temos mais grandes artistas surgidos nas classes populares com a frequência e a projeção que tínhamos no passado.
Inscrever a geração neo-brega de 1990-1992 para um programa trainée de pretensa MPB não resolve.
Não haverá sucessores de Belchior e Almir Guineto com a repaginação, esforçada mas tendenciosa, de "sertanejos" e "pagodeiros" que fizeram sucesso banindo a MPB nas rádios durante a Era Collor.
Temos que repensar a MPB não na cosmética de "repaginar" ídolos radiofônicos do brega-popularesco, que só farão algo sob a orientação de outrem.
Eles nunca terão a visceralidade, a organicidade dos emepebistas autênticos.
Esse é o problema que os quixotescos do "combate ao preconceito" do pró-brega nunca falaram.
É fácil dar um banho de loja, de luz, chamar um bom arranjador por trás e repaginar os ídolos brega-popularescos de pouco tempo atrás.
Tudo poderá parecer bem feito, organizado, bonito. Mas o essencial sempre faltará, que é a espontaneidade.
Uma espontaneidade que existiu nos artistas que estamos perdendo e ainda existe nos artistas que já estão muito idosos para representar o futuro da MPB, tendo a felicidade de continuarem representando o presente.
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