De férias com o marido Luciano Huck em Trancoso, na Bahia, a apresentadora Angélica falou uma frase aparentemente banal, mas que pode se encaixar no contexto dos tempos atuais: "Liberdade é felicidade".
Não fiquemos no sentido do pé-da-letra, porque "liberdade", no Brasil, é coisa para poucos.
Num país em que "liberdade" foi pretexto das famílias religiosas para pedirem a ditadura militar e de um grupo de jovens reaças para fundar o Movimento Brasil Livre (aka Movimento Me Livre do Brasil), seu conceito tem pouco de realmente livre.
O que é ser "livre"?
É a obesa que sensualiza demais sem dar uma contribuição para o verdadeiro combate à gordofobia nos ambientes sociais?
É a mulher virar objeto sexual e ficar se achando a maior feminista?
São as pessoas se tatuando demais, se esquecendo do papel de gado humano marcado a ferro?
São as solteiras trash com seus ouvidos masoquistas ouvindo o que há de pior na música brega-popularesca, no hit-parade e até no "paradão" roqueiro?
Vemos as esquerdas acreditando em conceitos assim, achando que a democracia seria restaurada pelo "centrão" que finge uma certa zanga com o governo Jair Bolsonaro.
Daí a aliança com o grupo de Rodrigo Maia, pelo apoio ao seu candidato à sucessão na presidência da Câmara dos Deputados, Baleia Rossi, que já nasceu causa furada.
Afinal, Baleia Rossi avisou recentemente que não tem compromisso algum em abrir processo de impeachment de Jair Bolsonaro.
As esquerdas deram tiro no pé. Parlamentares progressistas que combateram o golpismo do governo Michel Temer foram passar pano num de seus mais representativos seguidores.
Além disso, Baleia Rossi pode articular a ida de Temer para o Itamaraty, em plena sintonia com Bolsonaro.
Que anti-bolsonarismo é esse? Já não bastou os cariocas elegerem Eduardo Paes, mais amigo de Bolsonaro que Marcello Crivella?
E aí vemos o esquerdismo que até poderia se aliar com setores da direita, desde que fosse com cuidado.
Furar a bolha e evitar polarização não é necessariamente ruim, mas não se vai fazendo isso às cegas, porque pode criar efeitos bastante nefastos.
Furar a bolha pelo lado errado é queimadura e infecção com certeza.
E vemos o quanto as esquerdas não possuem uma identidade cultural própria.
Elas se servem de culturalismo conservador acolhendo os "brinquedos culturais" que a Rede Globo e a Folha de São Paulo lhes deram e acreditaram ser o suprassumo do culturalismo progressista brasileiro.
Baleia, ou melhor, balela! Esses "brinquedos culturais" eram apenas subprodutos de um imaginário de novela das nove que as esquerdas teimam em manter em relação às classes populares.
Veem a "liberdade" sob os olhos da Folha de São Paulo, da Rede Globo, da Jovem Pan, da Rede TV!, da Caras.
Falam o idioma de Tutinha, de Luciano Huck, do finado Otávio Frias Filho, do William Bonner, do Fausto Silva. Inútil odiá-los, pois o aluno fiel não é aquele que gosta do professor, mas aquele que, mesmo o odiando, segue inteiramente suas lições.
Essa "liberdade" que faz pessoas chamarem festa de "balada" (©Jovem Pan) e conjuntos vocais de "bandas" (ofendendo a classe dos instrumentistas que dão duro pela música), é a verdadeira "liberdade condicional" dos brasileiros que seguiram os ventos de 2013-2018.
Uma "liberdade" em que o "gado" descolado mas grudado no seu curral culturalista exalta tatuagens, hedonismo barato, bregalização cultural, dentro de uma "Contracultura de resultados".
E cria uma Disneylândia para si que vai de Villa Mix e Jurerê Internacional até as sintonias das dublês de rádios de rock Rádio Cidade (RJ) e 89 FM (SP).
E tudo isso apoiando outra Disneylândia desenvolvida na imaginação fértil dos intelectuais "bacanas", os mesmos analisados no meu super-livro Esses Intelectuais Pertinentes....
É a tal Disneylândia das "periferias", da "pobreza feliz", da "miséria criativa", do "analfabetismo sustentável" de miseráveis que a nossa intelligentzia enxerga como se fossem pessoas ingênuas.
Só que essa "liberdade", exercida em parte pelas esquerdas festivas, mais próximas de Luciano Huck do que de Lula, em que pese todo teatro encenado à frente do Centro de Estudos Barão de Itararé, tende a produzir um Brasil sem o protagonismo das esquerdas.
As esquerdas ficarão como coadjuvantes, como força de oposição ou como figurante de um cenário em que a máscara pró-popularesca já produziu "pobres de direita" e o verniz "assistencialista" do "espiritualismo big-tech" irá produzir neoliberais cada vez mais vorazes.
Perderemos a Petrobras, que em seus postos deve colocar mais bonecos do Tigre da Exxon, uma das novas donas do outrora nosso petróleo.
Mas aí as esquerdas devem ser tragadas por novas e velhas baleias "espiritualistas" que prometerão a paz mundial e a confraternização da raposa com a galinha.
As esquerdas devem se iludir com o alto astral do entretenimento que alterna entre o sagrado "espiritualista" e o profano "libertino", com um identitarismo que já é acolhido pelos comerciais das grandes corporações.
E tudo vai resultar numa "liberdade" que as elites sonham do Brasil, sem a interferência das forças progressistas de esquerda. Querem fazer do Brasil um Caldeirão.
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