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A PEGADINHA DO LIVRO 'DIÁRIO DE UM JORNALISTA'


Quando lanço coletâneas em livro, me esforço em não oferecer o conteúdo exclusivamente lançado previamente na Internet.

Quando lanço esse conteúdo, ele é raro e há uma adaptação dos textos na Internet que faz com que eles sejam diferentes e contem com informações extras.

Não é, portanto, um trabalho preguiçoso daqueles que fizeram uma nulidade tipo Merval Pereira entrar de graça na Academia Brasileira de Letras.

Minhas coletâneas incluem textos de várias fontes, e vários deles incluem textos nunca publicados na Internet e, quando publicados, estão fora do ar.

A má vontade com que certas pessoas veem o livro Pelas Entranhas da Cultura Rock revela essa confusão: acham que é cópia do que existe na Internet. Grande engano.

E, além disso, mesmo quando costumo brincar com certas práticas, lançando a "versão americana" de Pelas Entranhas da Cultura Rock, intitulada O Mundo Não Quer Ler - título inspirado na coletânea The World Won't Listen, dos Smiths - , capricho no conteúdo diferenciado.

"Versão americana"? Como assim? E tem esse negócio de "versão britânica"?

É porque eu coloquei nos livros a prática que as gravadoras dos EUA faziam com álbuns de bandas britânicas, a partir da British Invasion de 1964-1965.

Os álbuns originais dos grupos britânicos tinham suas versões "americanas" com parte do repertório preservada, enquanto a outra parte era trocada por faixas lado-B de compactos.

Ocorreu assim com Beatles e Rolling Stones. Nos anos 1980, o próprio Louder Than Bombs surgiu como uma resposta estadunidense ao britânico The World Won't Listen.

Na coletânea britânica dos Smiths, o gancho era o The Queen is Dead, enquanto a coletânea estadunidense (depois lançada, também, na Grã-Bretanha), teve como gancho o disco Hatful of Hollow.

Pelas Entranhas da Cultura Rock e O Mundo Não Quer Ler têm em comum os 40 textos que publiquei na coluna Pelos Porões do Rock da extinta webradio Rocknet, mais dois textos prometidos para a coluna mas que ficaram inéditos e outros dois textos fora desse âmbito.

De resto, porém, há muitas diferenças entre os dois livros, de forma que dá para comprar os dois sem prejuízo de levar um mesmo produto.

Fiz coisa semelhante nas coletâneas Impressões Impressas e Digitais e Diário de um Jornalista.

Há textos em comum, vários sem publicação na Internet, e que "desenham" meu talento jornalístico.

Fora isso, há uma série de textos diferentes entre as duas publicações.

E aí Diário de um Jornalista chama a atenção com uma pegadinha.

A capa lembra livros medievais, de contos de fantasias, e o título, reconheço, é tendencioso e seu subtítulo, pretensioso: "O Livro do Saber".

A pegadinha é uma isca para aquelas pessoas presas na zona de conforto da literatura anestesiante, que preferem os "mistérios" de ficções medievais do que discutir os problemas da realidade.

Além disso, não creio ser tão pretensioso assim falar em "saber" no subtítulo.

Até porque, no mercado literário, o que prevalece é o "não quero saber" que faz com que o "grosso" dos livros mais vendidos sejam de literatura analgésica, entretenimento sem proveito para a aprimoração do Conhecimento.

Exceções há, mas quando grandes autores e intelectuais de verdade aparecem, sempre há um gancho. Uma efeméride aqui, as provas do ENEM ali, concurso público, adaptação para cinema etc.

No ano passado, foram os cem anos de nascimento de Clarice Lispector, uma grande escritora que passou um tempo "desaparecida" das livrarias.

Agora, com pandemia, pandemônio, distopia e o Big Brother Brasil convertido em pretenso fenômeno cult, George Orwell entra na lista dos mais vendidos.

Desta vez, o contexto é outro e o protagonista de 1984, Winston Smith, tem a missão de enfrentar cavaleiros medievais, vampiros estudantis, youtubers de terceira categoria e bonecos de Minecraft com um cenário ainda mais distópico: as florestas para colorir.

E isso com a "novilíngua" sendo assimilada confortavel e alegremente até por jovens de esquerdas médias, que já jogaram fora um monte de palavras como "jantar entre amigos", "concerto de DJ" e "festa noturna" para uma única e (para mim) intragável palavra: "balada" (©Jovem Pan).

O Brasil tem uma sociedade hipermidiatizada e hipermercantilizada. Mas é tanta mídia e tanto mercado na veia que as pessoas não percebem isso.

Vivem o tempo todo dominadas pela mídia e acham que estão no paraíso de Adão e Eva, vivendo como se só vivessem de respirar ar puro e usufruir dos bens da Natureza.

Daí que é preciso um pouco de provocação, daí o título e subtítulo "pretensiosos" de Diário de um Jornalista - O Livro do Saber. Independente dessa pegadinha, quem procura Saber e Conhecimento irá se interessar por esse grande livro que reúne 24 anos de textos jornalísticos.
 

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