Se existe algo lunático relacionado ao episódio da histórica viagem à Lua feita por astronautas dos EUA, em 20 de julho de 1969, sem dúvida alguma, não são eles.
É uma risível profecia, que só repercute no Brasil e é tão falsa quanto o Dia Mundial do Rock (que de "mundial" só tem o nome, pois tem mais a ver com o bairrismo de uma rádio do bairro Paraíso, de São Paulo, uma Jovem Panzinha metida a roqueira, a 89 FM).
Essa risível profecia, trazida pelo "médium de peruca", seria uma espécie de Operação Lava Jato da "fé cristã".
Ela surgiu de um suposto sonho, de enredo ridículo como uma ficção científica ruim, que só foi revelado em 1986, apesar de ser atribuído à madrugada do dia 21 de julho daquele ano.
Autoridades de vários planetas - uns dizem do Universo inteiro, outros do Sistema Solar - estavam preocupadas com a viagem espacial, que aumentaria o risco da Terceira Guerra Mundial.
Junto às autoridades cósmicas, estavam Sérgio Moro e Dallagnol... Quer dizer, o "médium de peruca" e o fantasma de um padre jesuíta, o primeiro, um matuto de Minas Gerais, o segundo, um português medieval.
E aí a insólita reunião decidiu pelo seguinte: a Terra teria um prazo de 50 anos para resolver seus conflitos, senão o planeta iria explodir.
O mais ridículo é que a eclosão de catástrofes e ataques terroristas viria de maneira linear. É só passar uma régua para que a parte que estiver acima da linha do Equador, o Hemisfério Norte, será destruído.
A "profecia" é tão estúpida que até a migração dos povos seguiu o jogo simplório dos dedos. O país tal será destruído, coloca-se o povo remanescente em tal parte do país.
A estupidez se reflete em fatos como, se ocorre um terremoto violento e erupções vulcânicas a atingir Itália, Havaí, Indonésia e Japão, o Chile, por estar no Hemisfério Sul, seria poupado.
Isso é cientificamente impossível, porque o Chile desapareceria do mesmo jeito, por estar na zona chamada Círculo de Fogo do Pacífico. Gravíssima falha geológica da "data-limite".
Enquanto isso, a "maravilhosa profecia" também suporia que estadunidenses e canadenses pudessem migrar para viver em cabanas na floresta amazônica. Gravíssimo erro sociológico da "data-limite".
Até o mundo mineral sabe que, se os estadunidenses e canadenses, ao verem seus países destruídos por catástrofes naturais ou humanas, eles migrariam para o Sudeste brasileiro.
Outro dado gravíssimo é que, tendo sido a "profecia" vinda de um suposto espírita, ela seria reprovada por ninguém menos que o precursor Allan Kardec.
Ele deixou muito claro, em sua obra, que não se deve prever o futuro estabelecendo datas determinadas para acontecimentos futuros.
Kardec acrescentou que, se alguém se arrisca a predizer o futuro dessa forma, criando "datas-limite" para fases da humanidade, este alguém está cometendo uma grave e deplorável leviandade.
"Profetizar" dessa forma é ato de pessoas com baixíssimo nivel moral e espiritual, mais preocupada em promover sensacionalismo barato e brincar com os sentimentos das pessoas.
Pelo menos Orson Welles, quando narrou A Guerra dos Mundos no rádio, em 1938, causando pânico na população dos EUA, ele estava assumidamente encenando uma peça radiofônica, com o talento peculiar que marcou toda sua carreira.
O "médium de peruca", que descreveu sua "profecia" num programa da TV Tupi em 1971, adiantando a narrativa que um discípulo trouxe quinze anos depois, é que quis promover sensacionalismo barato e ele, matuto e retrógrado, quis se passar por "futurista" com essa jogada.
Esse "médium" era uma espécie de Jair Bolsonaro do Cristianismo. O "médium" manifestou apoio à ditadura militar e era apoiado por ela, tanto que a ditadura o fez um pretenso ídolo religioso, com falsas atribuições de caridade, pacifismo e sabedoria.
O "médium de peruca" foi pioneiro da literatura fake cujo primeiro livro, uma constrangedora coletânea poética de 1932 - mas estranhamente corrigida cinco vezes - , errava até no título, apostando no antiquado Parnasianismo, apesar de boa parte dos poemas emular o Romantismo.
E isso quando o Modernismo já se institucionalizava no Brasil.
O "médium" tornou-se mais blindado do que tucano de alta plumagem, e é lamentável que tudo o que esse farsante "espírita" fez a sociedade assine em baixo e leve a sério.
Escrevo esta postagem porque a imprensa hegemônica engoliu essa lorota de "data-limite", como se viu nas coberturas de ontem. Ninguém deu o menor questionamento, a menor contestação, todos disseram "amém" e só.
É horrível ver a imprensa brasileira escrevendo sobre Espiritismo. Até parece que, nesse assunto, nossos jornalistas se comportam como se fossem assessores de imprensa da FEB.
E a "data-limite" era, de início, anunciada como se fosse a Operação Lava Jato da "fé cristã", com a famosa seletividade e uma abordagem conservadora do "combate à corrupção".
A "profecia" foi inicialmente narrada com seu caráter catastrofista. Morreriam sociedades desenvolvidas e prósperas, atingidas pelo terrorismo e pelas catástrofes naturais, com a sanha "justiceira" de quem bota um desenvolvimentista como Lula na cadeia.
O que ficariam eram sociedades medíocres, que ditariam o futuro da humanidade, à maneira da plutocracia que promoveu o golpe de 2016 e a vitória de Bolsonaro, apoiados pelo chamado "movimento espírita" brasileiro.
O próprio lema de Jair Bolsonaro, "Brasil, Acima de Tudo, Deus Acima de Todos", lembra muito o que o "médium de peruca", num livro que ele escreveu se passando pelo "espírito Humberto de Campos", pregou através do título desse embuste literário de 1938.
Só uns parênteses: esse embuste literário, como livro histórico, é muito patético (eu li alguns trechos), ao nível dos piores livros didáticos, e aposta numa patriotada que nem Galvão Bueno teria coragem de fazer.
A "data-limite", outro embuste, acabou fracassando. O Brasil não entrou 2019 com alguma melhoria, muito pelo contrário: estamos sob o risco de uma terrível catástrofe política.
Como o "médium de peruca" é muito aceito com sua literatura fake, que comparece a todas as bienais do livro do país, isso significa que esse "iluminado homem" ensinou as pessoas a gostar de mentiras literárias.
Daí o apreço às fake news e aos fakes da Internet e o risco da "reporcagem" da Veja sobre um grupo "ecoterrorista", a hipotética Sociedade Secreta Silvestre, um factoide montado com fontes duvidosas na deep web.
Os "espíritas" são tão cínicos que, na prática, parecem pregar que as mentiras, quando são "cristãs", se transformam em verdade ou que o que é ilógico na Terra tem sentido lógico no mundo espiritual, como se este fosse o paraíso do surrealismo e da fantasia.
Só um país marcado pela burrice como o Brasil a aceitar tudo isso. E foi fácil os chamados "espíritas" contornarem o fracasso da "data-limite".
Agora os partidários desse profetismo fajuto tentam dar uma nova explicação.
A de que a "profecia da data-limite" não é "sinal do fim dos tempos", mas um "começo de preparação para uma nova era de fraternidade e de luz".
Leia-se "fraternidade" aquela da raposa com a galinha, aquela "conciliação" entre o oprimido que deve suportar sua desgraça "em paz" e o opressor que pode exercer seus abusos também "em paz".
E "luz"? Aquela "luz extrema" que mais cega do que abre os olhos, bem do tipo das seitas obscurantistas, já que o "nosso" Espiritismo está sendo denunciado como uma repaginação do Catolicismo medieval que há muito jogou fora as lições de Allan Kardec.
É uma "fraternidade" igrejista, piegas e enjoada, uma "confraternização" feita à força, sem que se resolvam os verdadeiros problemas humanos.
E é isso que torna o que conhecemos aqui como Espiritismo um engodo religioso pior do que a Igreja Universal e a Assembleia de Deus.
Estas seitas evangélico-pentecostais são realmente retrógradas, obscurantistas, perigosas nas suas pautas moralistas que despejam até no Poder Legislativo.
Mas pelo menos essas seitas são sinceras nos seus procedimentos, não ficam vendendo gato por lebre.
Os "espíritas" é que vendem gato por lebre. Desfiguram o Espiritismo francês, exterminando toda sua essência, colocando no lugar ideias recuperadas do Catolicismo medieval.
A "profecia da data-limite" foi, portanto, um pequeno passo para a volta do Terraplanismo, quando rogou o fim do Hemisfério Norte, na esperança de reduzir a Terra numa "meia-lua".
Mas ela foi um grande passo para o retorno do medievalismo católico, onde o perigoso ideal da "pátria do Evangelho" retoma o fantasma sombrio da fusão entre religião e Estado, com todas as suas ameaças de exterminar quem divergir desse projeto religiosamente totalitário.
Falta um The Intercept da religião para investigar os "podres" do "médium de peruca".
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