As esquerdas aceitaram sem questionar o discurso do "combate ao preconceito" brega.
Corroboraram um discurso que a mídia de centro-direita, então empenhada em derrubar o Partido dos Trabalhadores, montou para sabotar o projeto progressista pela cultura.
As esquerdas acreditaram na falácia de que a bregalização cultural faria o Brasil mais democrático e livre.
Acreditaram, também, na falácia da "pobreza linda", do "orgulho de ser pobre".
Caíram na armadilha, pois acabaram defendendo o problema em detrimento de suas vítimas.
Assim, defenderam a pobreza, a prostituição, o subemprego, a favela, mas não as pessoas que têm que enfrentar essas situações.
Com isso, os problemas vividos pelos pobres, em vez de contestados, passaram a ser apoiados e até mesmo espetacularizados.
Como a retórica apresentava o povo pobre sorrindo, parte das esquerdas, integrante das elites acadêmicas e artísticas, achou que tudo isso era causa progressista.
E aí vemos as esquerdas corroborando com paradigmas de "cultura popular" que eram transmitidos pela mídia popularesca que, em 2018, foi apoiar, com gosto, a campanha de Jair Bolsonaro.
É um grande estado de choque.
Para piorar, não poderia haver contraponto. Quem fazia contraponto era a "direita zangada" anti-popular, com exceções como eu, através do extinto Mingau de Aço, e, talvez, algum iluminado escondido por aí.
Houve quem dissesse que quem desejasse a melhoria cultural do povo pobre era "fascista". Gente dentro da esquerda pensando assim, com um cinismo que nada tem a ver com as forças progressistas.
Era um patrulhamento tal que virou uma regra corporativista perigosamente tendenciosa: a mídia alternativa, para ter visibilidade, tinha que elogiar o "funk", o brega, o tecnobrega, o "sertanejo" etc.
Só que essa abordagem é a mesma que se vê na mídia hegemônica, radicalmente anti-progressista.
Não é um contraponto. A Globo faz defesa entusiasmada do "funk" e Carta Capital e Caros Amigos assinam embaixo?
A mídia de esquerda defendendo os mesmos paradigmas culturais que Luciano Huck e Alexandre Frota apoiam abertamente soa estranho. Mas, infelizmente, isso prevaleceu durante pouco mais de uma década no pensamento dominante de esquerda.
Isso criou um impasse e, na prática, acabou dando num efeito nefasto às esquerdas.
Além do público progressista, gente séria, ter rejeitado Fórum e Caros Amigos porque Pedro Alexandre Sanches e MC Leonardo trouxeram paradigmas culturais da Globo e da Folha, o que se viu foi o povo pobre sendo posto fora das manifestações populares.
Os intelectuais "bacanas" disseram que o povo pobre "já fazia ativismo sócio-político-cultural" rebolando o "funk" naquele galpão de espetáculos que existe em cada subúrbio.
E aí o povo não iria para as ruas defender as causas progressistas, porque achava que se isolando em "bailes funk", vaquejadas, micaretas etc estaria "fazendo mobilização social".
E esse "combate ao preconceito" causou efeitos devastadores.
Foi justamente o que a "santíssima trindade" de Pedro Alexandre Sanches, Paulo César de Araújo e Hermano Vianna fez em prol de um Brasil mais brega que tirou o povo das ruas.
E foi isso que fez com que não houvesse respaldo popular para combater o golpismo político de 2016 até hoje em dia.
Primeiro, porque a nossa intelligentzia pró-brega pregava nas esquerdas que "ativismo social" tinha que se limitar ao espetáculo, ao entretenimento.
Segundo, porque, com o povo subordinado ao entretenimento brega - que esquecemos ser um embuste difundido pela mídia oligárquica - , simplesmente as manifestações populares se esvaziaram.
De que adiantaram os gritos de "Fora Temer" e "Ei, Bolsonaro, vai tomar no..." se isso não teve efeito prático e nem de longe abalaram os governos retrógrados alvos desses protestos?
O povo pobre ficou na sua bolha de consumismo e espetacularização.
E aí foi crucial o erro das esquerdas terem apoiado o discurso da bregalização. Deveria ter feito o contraponto, mas o canto da sereia da suposta "cultura das periferias" lhes seduziu e, por acidente, pediram para o povo "ir brincar", como se fosse um bando de crianças ingênuas.
E a mídia popularesca, em seguida, mostrou a que veio, apoiando Temer e Bolsonaro.
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