GERALDO ALCKMIN E LULA NO ENCONTRO COM CENTRAIS SINDICAIS, EM SÃO PAULO, NO ÚLTIMO DIA 14 DE ABRIL.
Existem pessoas que podem mudar. Podem até se projetarem cometendo erros terríveis, mas depois se arrependem e se tornam pessoas mais dignas.
Mas isso exige uma série de condições. Ninguém faz uma coisa e depois faz outra sem explicação profunda e sem qualquer demonstração real de mudança.
Mudar exige contexto, autocrítica, vontade real de mudar e firmeza de caráter para adotar a nova postura.
Não é o que se vê em certos casos, em que direitistas caem de paraquedas no campo da esquerda e se tornam "admiráveis" por nenhum motivo.
Já tivemos o exemplo do político baiano e dublê de radiojornalista, Mário Kertèsz, o "astro-rei" da Rádio Metrópole.
Filhote da ditadura e prefeito biônico de Salvador nos tempos de Ernesto Geisel, Kertèsz é um conservador que vestiu a máscara de progressista, embarcando nas campanhas de Lula em 2002 e 2006.
Tivemos também o exemplo de Pedro Alexandre Sanches, jornalista-símbolo do Projeto Folha, do finado Otávio Frias Filho.
O Projeto Folha, segundo José Arbex Jr., ex-jornalista do periódico paulista, era um projeto que Frias criou em 1984 para expurgar o esquerdismo das redações do jornal da Alameda Barão de Limeira, aqui em São Paulo, no bairro de Santa Cecília.
Mas aí veio o aluno-modelo de Frias, Pedro Alexandre Sanches (quase xará do primeiro-ministro espanhol Pedro Sanchez), passear pelas redações de periódicos de esquerda (Carta Capital, Caros Amigos e Fórum) vendendo a bregalização cultural como se fosse um "remédio milagroso".
Nem Kertèsz nem Sanches tiveram posições de verdadeira autocrítica, de verdadeira mudança em relação aos seus meios de origem. Pior: embarcaram no esquerdismo visando vantagens pessoais e contaminando as esquerdas com seus preconceitos da direita liberal.
É a partir disso e, da mesma forma, dos "brinquedos culturais" que as esquerdas importaram do culturalismo de direita (que tratam o Brasil como a "novela das nove" da TV Globo), que mostra o quanto grande parte das forças progressistas está equivocada.
Essas forças progressistas parecem ter saudades de tempos conservadores que variam do "milagre brasileiro" da ditadura militar ao precário progresso social dos tempos do Segundo Império.
Com base nisso, as esquerdas sonham com um "milagre brasileiro" promovido não pelo general Emílio Médici, mas por Dom Pedro II. Nesse remix histórico, desejam que quem faça o papel do velho imperador é Lula.
E Lula, pelo jeito, se contaminou com esse culturalismo de direita que afetou a maioria das esquerdas.
Depois dos "brinquedos culturais" que glorificavam o "funk", tentavam procurar no "médium de direita" o Nelson Xavier progressista do Cinema Novo e sonhavam com craques de futebol com a cara do Cauã Reymond, agora é a vez da política se submeter a esse "esquerdismo de novela da Globo".
Geraldo Alckmin se torna uma espécie de versão live action do "bom empresário" da novela das nove, normalmente interpretado por um Antônio Fagundes com um tom paternal e gentil.
Como o mais novo estranho do ninho querido pelas esquerdas - que sonham com o mundo de direita submetido a elas e seus sonhos - , Alckmin agora tenta fazer o dever de aula como um dublê de político progressista.
Compareceu a eventos sindicais e identitários com uma pose de aluno-ouvinte, e supostamente teria saído "encantado" com o "mundo novo da esquerda" que conheceu.
Depois, Alckmin passou a elogiar Lula, evocando o distante passado sindical e as lutas pela democracia.
Em seguida, o ex-tucano, agora no PSB, decidiu tirar da manga do seu paletó algumas propostas para o programa de governo do "companheiro Lula": a desburocratização e a reforma tributária.
E aí foi para o recente evento das centrais sindicais (das quais oito compareceram, pois uma, ligada ao PDT de Ciro Gomes, se recusou a ir), e o ex-governador de São Paulo foi mais uma vez exaltar a pessoa de Lula e saudar, com exagerada euforia, as classes trabalhadoras.
E Geraldo ganhou de Lula a tarefa de intermediar negociações entre trabalhadores e empresários.
Trata-se de uma "livre negociação" monitorada. E Alckmin, vamos combinar, é representante do empresariado. Sabemos como será o resultado: na melhor das hipóteses, Patrões 2 x Empregados 1.
Afinal, Alckmin até agora não demonstrou ser confiável.
Ele não adotou uma postura autocrítica e até para dar a impressão que "mudou", se limita a dar evasivas.
Ou suas "mudanças" são narradas por terceiros, ou ele apenas diz vagamente que "mudou", "que não se deve ver a política pelo retrovisor".
Alckmin não dá uma demonstração confiável de mudança real.
Ele parece apenas fazer um jogo de encenação, parecer convincente aos olhos dos desavisados.
E, infelizmente, há muita gente, nas esquerdas, que é desavisada, mesmo.
Alckmin nunca deu, até agora, entrevistas para a mídia progressista, logo a que prima pelo jornalismo autêntico, mas que anda escondendo o jogo em muitos momentos.
A mídia progressista deixou de ser um contraponto real à mídia hegemônica, até porque esta também assumiu uma certa rejeição a Jair Bolsonaro, que ontem fechou a Rodovia dos Bandeirantes com sua motociata de poucos porém muito barulhentos seguidores.
Se ao menos a mídia alternativa, que em várias vezes entrevistou Lula, entrevistasse agora o "companheiro Alckmin", seria razoável.
Mas nem isso. E as "mudanças" de Alckmin só são divulgadas, praticamente, por terceiros, enquanto o próprio Alckmin, quando fala, parece muito forçado no seu suposto "esquerdismo de primeira viagem".
E dessa forma não dá para acreditar que o projeto progressista de Lula saia intato. Na verdade não vai. Afinal, Lula praticamente entregou aos empresários e à direita moderada em geral boa parte da elaboração do seu programa de governo.
Já está mais do que provado que Lula já sacrificou o seu projeto político. E, com isso, as classes populares deixaram de ser prioridade no governo do petista.
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