Três meses depois de dizer que "não pretende revogar, mas rever" a reforma trabalhista, ele novamente inverteu a postura e voltou a defender a "revogação" da lei que cancelou os direitos dos trabalhadores aprovada pelo governo Temer.
A atitude foi feita durante um encontro com o Diretório Nacional do Partido dos Trabalhadores (PT), aqui em São Paulo, anteontem.
O encontro teve como objetivo elaborar um documento para a Federação Partidária, projeto que formará com partidos como PC do B e PV visando unificar as campanhas regionais para governos estaduais e para deputados estaduais e federais, evitando coligações díspares e contraditórias.
A postura é bastante arriscada para Lula, que enfatiza uma aliança com forças divergentes ao seu projeto político, sob o pretexto do "diálogo" e da "união democrática".
Disse o secretário de Comunicação do PT, Jilmar Tatto, a respeito de tal posição:
"O PT defende uma nova proposta de reforma trabalhista que seja mais moderna, inclusiva e que resgate os direitos históricos dos trabalhadores. E por isso a revogação. Hoje, temos outros agentes no mundo do trabalho que surgiram com as novas tecnologias".
O encontro também aprovou, por 68 a 16, a indicação da chapa de Lula e Geraldo Alckmin, que ainda depende do encontro nacional do PT, em 04 e 05 de junho próximos, para oficializar ou negar a escolha do ex-tucano como vice-presidente.
Ontem, no encontro com as centrais sindicais, na Casa de Portugal, em São Paulo, Lula tentou amenizar a polêmica, no evento que significou a primeira aparição pública dele com Geraldo Alckmin, depois que a indicação da chapa foi aprovada pelo PT.
Disse Lula, no evento:
"Não adiantar dizer que vamos mudar tudo. Nós queremos melhorar as coisas. Nós queremos uma nova legislação trabalhista para a realidade atual. Queremos um acordo em função da realidade dos trabalhadores em 2023. Não queremos voltar para trás. É na política que vamos discutir. Meu compromisso é que, chegando ao governo, pode preparar passagem de avião, vocês vão à Brasília para discutir".
Ele falou outras coisas no seu discurso:
"Queremos uma parceria com as centrais para reconstruir o Brasil, mas queremos também chamar os presidentes da Fiesp, da Febraban. Todo mundo vai sentar na mesa. E quero ouvir o compromissos de cada um sobre como pode ajudar a melhorar a vida do nosso povo. Vamos recuperar em quatro anos o que eles destruíram".
"É plenamente possível ter um país mais justo, termos um país mais solidário, acabar com a miséria nesse país, gerar os empregos que a classe trabalhadora tanto precisa para viver com dignidade, colocar o povo humilde dentro das universidades, fazer as pessoas tomarem café, almoçarem e jantarem todos os dias. É plenamente possível fazer com que o povo possa usufruir daquilo que ele produz. E é plenamente possível o Lula e o Alckmin fazerem um chapa para reconquistar o direito do povo trabalhador desse país".
Sobre a parceria com Alckmin, Lula enfatizou o seu interesse em ter o ex-tucano e agora filiado ao PSB governando com o petista. Alckmin já é um dos autores de propostas que comporão o programa de governo de Lula para o novo mandato.
"A mesa de negociação vai ser coordenada pelo vice-presidente, não pelo presidente. Vai ter os dirigentes sindicais e empresários. A gente não vai fazer nada na marra. A gente vai fazer negociando para a gente poder o direito de negociar a contratação coletiva e o respeito pelo que acordamos".
Geraldo Alckmin também fez seu discurso, no mesmo evento com os sindicalistas:
"Estamos em um dia histórico. Reúnem-se as maiores centrais sindicais de todo o país. Nos remete a nossa história. Em todas as vezes que o Brasil estava em risco, o povo brasileiro se uniu, não se apequenou. Quando a ditadura matou Vladimir Herzog, os líderes religiosos se uniram para condenar a ditadura. Quando tentaram tirar os direitos dos trabalhadores, o mundo sindical se reorganizou e ampliou sua presença nas indústrias. Quando precisava tirar a ditadura, o Brasil se uniu: Lula, Brizola, Ulysses. Quando o Brasil precisava de uma Constituição cidadã, lá estavam Lula, Ulysses, Florestan Fernandes, Mário Covas, Fernando Henrique Cardoso.
"O Brasil está aqui, unido nesse momento grave, onde nós temos um governo que odeia a democracia, que tem admiração pela tortura, que faz o povo sofrer. É nesse momento de desemprego, de estômago vazio, de inflação, de fome, de morte, 660 mil mortos, que o Brasil se agiganta nessa reunião histórica com as mais importantes centrais sindicais. Venho somar o meu esforço, pequeno, humilde, mas de coração e entusiasmo em benefício do Brasil. A luta sindical deu ao Brasil o maior líder popular deste país, Lula! Viva Lula! Viva os trabalhadores do Brasil!".
Lula tenta agradar os dois lados, e tudo parece fácil, na teoria, quando se fala em "diálogo" com quem defendeu o golpe político de 2016 e o "acordo" entre empresários e trabalhadores.
A grande questão é se o empresariado abrirá mão de lucros exorbitantes para atender aos anseios e necessidades dos trabalhadores.
Um ponto que se deve lembrar é que a atuação de Geraldo Alckmin no acordo entre empregados e patrões não será parcial.
Geraldo Alckmin é representante político do empresariado.
Imagine numa partida de futebol entre a seleção do Brasil e a da Polônia e o juiz do jogo é brasileiro.
Pois é. Os trabalhadores tendem a ter um aumento de salário ínfimo, sem reposição das antigas perdas salariais. Terão apenas um ganho relativo, para "sobreviver" de forma razoável, mas sem afetar os lucros abusivos dos mais ricos.
Lembremos também que a intenção de Lula em ter Geraldo Alckmin governando com ele contrariou a suposição da jornalista Tereza Cruvinel, que havia dito meses atrás que Lula é que governaria e Alckmin seria o vice, subordinado ao presidente.
Na prática, porém, Geraldo Alckmin ganha mais poder, atuação e influência, como não bastasse o PSB deixar o ex-tucano "totalmente à vontade" e cotado para ser o vice-presidente (co-presidente?) do partido "socialista".
Mesmo propostas de Alckmin, como a desburocratização e a reforma tributária, não irão afetar seriamente os bolsos dos ricaços, que continuarão com suas granas opulentas guardadas nas contas em paraísos fiscais.
Lula tenta costurar suas contradições dando a crer que está agindo com "equilíbrio".
A um só tempo, o petista quer ser "o grande líder" mas enfatiza a influência do vice Geraldo Alckmin no seu governo, na prática como um "co-presidente".
Lula se alia a forças divergentes de seu projeto político e assustou os novos aliados quando o PT decidiu pela "revogação" da reforma trabalhista do governo Temer.
E aí Lula depois foi explicar a "mudança" dizendo que quer "propor nova lei" a partir de um acordo entre empresários e trabalhadores.
E mesmo que os trabalhadores possam fazer refeições três vezes ao dia e os preços das mercadorias estiverem sob controle, evidentemente o proletariado terá menos do que realmente deseja para sua vida.
O lumpesinato, então, nem se fala. A "Praça Princesa Isabel" ganhará pouco com a aliança Lula-Alckmin, enquanto a "Faria Lima" continuará com as fortunas nas nuvens.
Lula se contradiz querendo ser ao mesmo tempo progressista e neoliberal, pois não é possível agradar igualmente empresários e trabalhadores. Alguém tem que ceder, e geralmente é quem está no lado mais baixo da pirâmide social.
Já tivemos casos semelhantes com João Goulart e Dilma Rousseff. E querer ao mesmo tempo ser moderado e audacioso faz de Lula uma pessoa politicamente vulnerável. Ele segue um caminho bastante arriscado e perigoso.
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