ULTIMAMENTE, LULA, QUE DIZ DEFENDER A "DEMOCRACIA", NÃO ESTÁ SENDO DEMOCRÁTICO.
Com uma campanha cheia de vergonhosas contradições, Lula tenta afastar de si a capacidade de competir com a Terceira Via, sobrando apenas Jair Bolsonaro para o "duelo final".
Lula, que tanto fala em "recuperar a democracia", não está sendo democrático.
No Partido dos Trabalhadores, setores à esquerda acusam Lula de ser autoritário nas decisões e de se recusar a ouvir seus próprios colegas de trajetória, tão veteranos quanto ele.
Antes da própria campanha presidencial, Lula e seus seguidores há vários meses ridicularizando a Terceira Via, na tentativa de sufocá-la no nascedouro, para deixar o caminho exclusivo para Lula vencer as eleições.
A ideia é evitar que os terceiro-viáveis pulverizem os votos para Lula, desviando-os para estes concorrentes.
Só que isso pode resultar em tiro pela culatra, uma vez que há o risco dos votos dos terceiro-viáveis migrarem não para Lula, mas para Bolsonaro.
Ninguém escapa do valentonismo (bullying) eleitoreiro: Lula e os seguidores ridicularizam de Sérgio Moro a Ciro Gomes, passando pelos emergentes Simone Tebet e Eduardo Leite.
Nada está definido, ainda, quanto à Terceira Via. Mas, mesmo assim, a máquina lulista dispara contra qualquer um que bote a sua cabeça para fora.
E isso foi uma das coisas que me fez deixar de apoiar Lula, o qual teria meu voto até 2020. É a arrogância com que o lulismo age para se manter em vantagem na marra.
Pouco importa se Lula é ou não é melhor candidato. Em todo começo de competição, a ideia é sempre respeitar os rivais, que são legítimos no seu direito de apresentar seu projeto político.
Lula não está sendo democrático. O lulismo se deixa valer pela truculenta humilhação dos terceiro-viáveis, sempre vistos como "natimortos".
Mesmo que Lula tivesse o melhor projeto para o país - ou melhor, tinha, pois agora se vendeu aos neoliberais - , ele tinha que respeitar os outros concorrentes, legítimos dentro das normas constitucionais que permitem a livre candidatura à Presidência da República.
Um truque recente do lulismo é agora empurrar Ciro Gomes para a extrema-direita, como se o ex-governador cearense - curiosamente conterrâneo de Geraldo Alckmin, ambos nascidos na cidade paulista de Pindamonhangaba - fosse um mero cabo eleitoral de Jair Bolsonaro.
Esse é o tom dos lulistas com o episódio em que Ciro Gomes criticou a famosa declaração de Lula sobre o aborto, defendendo o direito de mulheres pobres abortarem, que causou muita polêmica.
Lula até tentou contornar a controvérsia, dizendo que "pessoalmente" é "contra o aborto", enquanto a mídia progressista se dividiu entre definir sua declaração como certa ou errada.
Eis o que Ciro Gomes disse, num depoimento ao Brazil Conference:
"Nosso povo é 'criptorreacionário', crescentemente neopentecostal e profunda e enraizadamente cristão em matéria de costumes. Então, pensa se um político tem o direito de se meter na minha família para me dizer como eu devo tratar um filho gay meu? Por que o Lula tinha que dar uma declaração estapafúrdia como a que ele deu agora, que todo mundo tem direito a fazer aborto? Que coisa mais simplória para um assunto tão grave (...) Qual o poder que Lula tem, sendo presidente por 14 anos, ou mandando na Presidência do Brasil, que não resolveu essa questão? Porque ela é insolúvel".
Concordem ou não da declaração de Ciro Gomes, pode-se até definir como "estapafúrdia" a declaração do pedetista, mas não tratá-lo como se fosse um cabo eleitoral de Jair Bolsonaro.
Sim, Ciro muitas vezes é temperamental nas suas críticas a Lula, mas tratá-lo como se fosse um genérico de Bolsonaro é um grande exagero.
Isso é um jogo sujo, porque Lula não pode usar sua vantagem eleitoral para sair por aí atirando nos concorrentes.
Falta humildade, autocrítica, bom senso, falta muita coisa em Lula.
Ele já cometeu o erro grosseiro de se aliar aos neoliberais, o que prejudicará, e muito, seu projeto de governo, por mais que seus seguidores gastem argumentos aqui e ali para dizer que o "Lulão dos sindicatos" permanecerá ileso nesta empreitada.
Hoje vemos, em diversos noticiários, que até Michel Temer, que fez o famigerado "pacote de maldades", já está dando pitacos no futuro projeto de governo de Lula.
Além disso, empresários e banqueiros estão entusiasmados com o petista, o qual definem como "bastante moderado".
Acompanho os noticiários do UOL, G1, Estadão, assim como Brasil 247 e DCM. Juntando as peças do quebra-cabeça, o entusiasmo do mercado com Lula é algo para se estranhar.
Não vamos ficar ingênuos com a aliança entre Lula e Geraldo Alckmin. Gastar justificativas vagas e de caráter emocional, movidas pelo pensamento desejoso, de que a aliança é "necessária para a democracia", não possuem consistência nem validade lógica.
Se empresários e banqueiros estão extasiados com a candidatura de Lula, é porque o petista irá renunciar a boa parte do seu projeto político.
O próprio PSB sinalizou: governo Lula-Alckmin "não deve ser de esquerda".
Dá pena ver muitos lulistas sonhando com imagens já muito antigas do "Lulão dos sindicatos", falando para os operários em São Bernardo do Campo.
Dá pena ver as esquerdas presas em imagens do passado, se esquecendo de que Lula hoje é outro, mais próximo do empresariado do que dos trabalhadores, e que apagou seus últimos vestígios sindicais ao aceitar alianças com o nada confiável Geraldo Alckmin.
Esqueceram que Alckmin foi um dos artífices do golpe político de 2016 e participou ativamente da criação de condições para que Jair Bolsonaro chegasse ao poder, com a interdição política do próprio Lula.
Alckmin chegou a se referir à prisão de Lula com desculpas tipicamente lavajatistas: "A lei vale para todos".
A coleção de erros de Lula cria uma situação preocupante que eu comparo com a fase parlamentarista de João Goulart, quando Tancredo Neves, ancestral político de Geraldo Alckmin (e sem relação com o antigo político José Maria Alkmin, que era mineiro), virou primeiro-ministro.
Afinal, Lula já acumulou vários erros movidos por seu impulso. Como quando falou que iria regular a mídia e a própria declaração recente sobre o aborto, que considero arriscada.
Lula se perde em querer ser neoliberal para agradar empresários, banqueiros e políticos de direita moderada, e em contrapartida prometer as agendas populares tão conhecidas de sua trajetória, mas que hoje andam seriamente ameaçadas.
Por muito menos, João Goulart foi deposto, deixando caminho para uma ditadura de duas décadas.
O que virá, se Lula, com suas contradições, tentando agradar ricos e pobres, conservadores e progressistas, não conseguir consertar o Brasil?
Lula está brincando com fogo e se acha o rei da cocada preta. Em vez de cobrar dos outros para descerem do salto alto, ele deveria começar a fazer sua parte. E que todos respeitem a Terceira Via, por pior que ela seja, porque esta é a natureza da disputa democrática eleitoral.
Comentários
Postar um comentário