A suposta pesquisa eleitoral divulgada pelo XP/Ipespe, colocando Lula acima de Jair Bolsonaro por apenas quatro pontos, assustou as esquerdas que defendem a aliança do petista com Geraldo Alckmin.
Isso criou uma situação de desespero e mesmo de irritação por parte de seus membros.
O ex-prefeito de São Paulo, Fernando Haddad, por exemplo, reclamou nas redes sociais da rejeição que a aliança sofre.
"Às vezes eu acho que os críticos da chapa Lula-Alckmin não estão se dando conta do tamanho da encrenca. É uma encrenca muito grande. Precisamos somar forças. Não é só Lula ganhar a eleição, é preciso criar condições de governabilidade", escreveu o presidenciável derrotado em 2018.
Já o jornalista e cartunista Gilberto Maringoni, que não esconde sua revolta em relação às críticas à chapa de Lula com o ex-governador de São Paulo, escreveu um texto indignado.
Nele, Maringoni acusa os críticos da aliança Lula-Alckmin de "ultrapassarem os limites do razoável".
Citando como exemplo o caso da França, cuja dispersão dos progressistas na campanha presidencial colocou Emmanuel Macron em pequena vantagem com a fascista Marina Le Pen, colocando a disputa para o segundo turno, ele faz analogia diante do quadro de bolsonarismo em recuperação.
Ele acha que os críticos são "insensíveis" a Jair Bolsonaro, seus apoiadores e a "gosma social" que sustenta o presidente em busca de reeleição.
Criticando não só os governos de Michel Temer e Bolsonaro, mas também o de Dilma Rousseff, Maringoni admite que o Brasil sofreu grandes estragos nos últimos sete anos.
No entanto, Maringoni, que acha que todo aquele que critica a aliança Lula-Alckmin "parece que vive na Suíça", se limita a dizer que ministros de governo e os juristas nomeados por Lula e Dilma "são mais conservadores" que Geraldo Alckmin.
Maringoni não se preocupou em dizer em que Geraldo Alckmin está sendo progressista.
Geraldo até tenta encenar, já que ele não fez um verdadeiro acerto de contas para dizer que mudou de verdade.
No jantar, ontem, com o grupo de advogados progressistas Prerrogativas, do qual também contou com a presença de Haddad, Alckmin até conversou longamente com a diretora do Instituto Lula, Tamires Sampaio, e com a advogada e articuladora da Coalizão Negra por Direitos, Sheila de Carvalho.
O tema foi segurança pública, debatido no encontro por ser um assunto apropriado pelos bolsonaristas e que pode ser explorado eleitoralmente.
Os membros do encontro, a partir da declaração do coordenador do Prerrô (como o Prerrogativas é conhecido), Marco Aurélio de Carvalho, Alckmin "passou no teste" do debate, embora não fossem divulgados detalhes de como ele se portou no evento.
Também foi divulgado que Geraldo Alckmin enviará sugestões para o projeto de governo da frente ampla encabeçada por Lula, e que será entregue à equipe coordenada pelo economista do PT e ex-ministro de Lula, Aloísio Mercadante.
Foram apenas divulgadas duas sugestões de Alckmin: a desburocratização e a revisão da carga tributária, que no dizer do ex-tucano "faz com que os pobres paguem, proporcionalmente, mais imposto do que os ricos".
Coisas corretíssimas: segurança pública, desburocratização, reequilíbrio na carga tributária. Não são, todavia, propostas ousadas, e estão de acordo com aspectos positivos em governos neoliberais.
Ontem, Lula se reuniu com indígenas no acampamento Terra Livre, em Brasília, onde os índios estavam reunidos para protestar contra o Projeto de Lei 191 de 06 de fevereiro de 2020.
O projeto legislativo, que atende aos interesses do governo Bolsonaro, permite exploração de garimpo e mineração em territórios indígenas.
Lula prometeu "um dia de revogaço", atuando para revogar todas as determinações legais que prejudicam os povos indígenas. Corretíssimo e necessário.
O petista também propôs que se criasse um ministério dos povos indígenas e cujo ministro deva ser um membro desses povos. Também outra proposta correta e necessária.
Só que o grande problema é que Lula, ao se aliar com os neoliberais, encontrará limites na atuação desse ministério proposto, já que a Bancada do Boi, setor do Congresso Nacional que inclui representantes do latifúndio e do agronegócio, defende a grilagem e invasão de terras indígenas.
Há muitos impasses nesse sentido e tudo o que Alckmin demonstrou são apenas projetos sociais que não rompem com os padrões do tucanato e do neoliberalismo.
A agenda progressista de Lula, aparentemente, é integralmente defendida e garantida, mesmo com uma aliança com a direita moderada.
Mas a lógica dos fatos e do jogo de interesses mostra o quanto há limites sérios e Lula enfrentará conflitos depois do "amplo diálogo" com a frente ampla demais com a qual se aliou.
Esse é o problema maior que os críticos da aliança Lula-Alckmin, incluindo o blogueiro que aqui escreve estas linhas, observam muito bem.
Os apoiadores da aliança é que parece que vivem na Suíça, pouco preocupados com a agenda progressista e mais inclinados a um movimento político heterogêneo cujas propostas também serão em parte feitas pela direita moderada.
A "reconstrução do Brasil" prometida pela aliança Lula-Alckmin será apenas dentro de limites neoliberais, que já sinalizaram que não irão romper com a Ponte para o Futuro de Temer.
E isso é certo, afinal já se fala em "rever", e não revogar, a reforma trabalhista, e "mudar", e não romper, o teto de gastos públicos.
Aliado àqueles que defendem o Estado mínimo e tiveram um histórico de privatizações e medidas contrárias às classes populares, Lula sentirá esse fardo de ter que abrir mão de boa parte do seu projeto político, apenas agindo nos limites que não incomodam a direita moderada.
E isso considerando que esses limites nem sempre priorizam o atendimento pleno dos anseios populares por qualidade de vida e desenvolvimento social.
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