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THE OUTFIELD E O ESTRANHO APREÇO AOS MÚSICOS DE BAIXA REPRESENTATIVIDADE


Com a notícia da morte do vocalista e baixista do grupo The Outfield, Tony Lewis, há quatro dias, cerca de seis anos depois do guitarrista John Spinks, restando vivo, da formação original, apenas o baterista Alan Jackman, o caso da popularidade da banda no Brasil nos faz pensar.

Afinal, o Outfield foi uma banda legalzinha, com seu simpático sucesso "Your Love" (coverizado, curiosamente, por funqueiros, MC Batata com a letra original e MC Júnior & MC Leonardo - este da APAFUNK - com letra em português, o "Rap das Armas"), que toca muito nas rádios até hoje.

No entanto, o Outfield nem de longe soa genial ou empolgante, sendo mais um dos nomes musicais medianos supervalorizados no Brasil.

O grupo era britânico, mas soava como um grupo de segundo escalão do rock australiano, de tão baixa a sua representatividade no exterior.

E isso é tristemente curioso, pois bandas infinitamente mais representativas e seminais do Reino Unido, como Ride e Wedding Present, são totalmente ignoradas no Brasil, assim como XTC e Kinks.

Aqui no Brasil, os Kinks só são lembrados pela versão de "You Really Got Me" da superbanda Van Halen, que tristemente perdeu seu membro-fundador Eddie Van Halen, há alguns dias.

Fora isso, apenas citações de Damon Albarn, do Blur, que declarou forte influência da banda dos irmãos Ray e Dave Davies. E nem como ex-marido de Chrissie Hynde, dos Pretenders, o cantor Ray Davies é lembrado.

Também é vergonhoso o desprezo absoluto que os Buzzcocks, seminal banda punk tão fundamental quanto Sex Pistols e Clash na história do gênero, têm no Brasil. Nem "O Adventista", versão do Camisa de Vênus para "I Believe", conseguiu apresentar a banda de Manchester aos brasileiros.

Aliás, é um grande erro o Wikipedia em português falar que o Outfield veio de Manchester. O grupo veio de Londres, o que, salvo exceções, influi para o deslocamento de certos nomes da música das raízes britânicas.

Nomes como Outfield e Jesus Jones - este um nome menor do indie dance - são supervalorizados no Brasil que endeusa Johnny Rivers por uma cover que muitos pensam ser obra autoral, "Do You Wanna Dance", de Bob Freeman, que teve versão muitíssimo melhor com os Beach Boys.

E lembremos que Johnny Rivers sempre teve baixa representatividade nos EUA, e seria covardia compará-lo com um músico da época, o saudoso Bobby Fuller, com seu vigoroso rock texano, naqueles idos de 1963-1966.

E isso quando há a contrapartida de um lançamento de má vontade do álbum Bizarro, do Wedding Present, em 1989, e o silêncio absoluto em torno da brilhante banda Ride (que nem o fato de Andy Bell ter feito parte do Oasis resolveu o criminoso desprezo).

De contemporâneos do Outfield, bandas como Weather Prophets e Rose Of Avalanche (este discípulo dos Bauhaus) foram bem mais representativas, da mesma forma que nomes mais veteranos, como Monochrome Set e Teardrop Explodes.

O Teardrop Explodes foi fundado por Julian Cope, que, juntamente com Pete Wylie, foi colega de Ian McCulloch, do Echo & The Bunnymen, da lendária banda The Crucial Three, de Liverpool.

E por que o Brasil prefere ser o paraíso dos artistas hasbeen ou de nomes de baixa representatividade artística nos países de origem?

Por que esse endeusamento, esse oba-oba, que atinge não só o rock, através de Outfield e Jesus Jones, ou do pop romântico, como Johnny Rivers, mas tantos nomes que ninguém ouviu falar mas que tocam, até de maneira repetitiva, em rádios de pop adulto e de pop dançante?

Bom, o que temos, nesse cenário musical indigente que é o Brasil, é uma supremacia de produtores, arranjadores e editores musicais, que praticamente formatam a música que deve virar sucesso e se tornar "gosto musical" da maioria dos brasileiros, mesmo os ditos "descolados".

Temos produtores arrogantes que ficam se achando quando criam grupos imitadores do que se faz lá fora, do Genghis Khan (cópia do Boney M) ao Rouge (cópia das Spice Girls). Esses produtores lançam esses nomes como se estivessem descoberto a origem do universo.

No caso dos editores musicais, é o que faz com que nomes como Outfield, Johnny Rivers, Double You, Jesus Jones e outros sejam supervalorizados somente pelos brasileiros.

É porque os editores musicais brasileiros compraram a representação de suas gravações, afinal custa mais barato, e isso permite a alta rotação existente só em países como o Brasil, compensando o fato deles estarem em baixa nos países de origem.

Daí a degradação musical no Brasil e um mercado voraz, castrador e movido pela mesmice - vide o repetitivo cardápio musical das FMs de "adulto contemporâneo" - , restrito aos "grandes sucessos" e desprovido de uma gota sequer de contemporaneidade.

É desse mercado que se desenvolvem canastrices radiofônicas como a Rádio Cidade (RJ) que só é considerada "genial" por causa da burrice generalizada que prejudica tanto a cultura brasileira quanto a cultura estrangeira que é aqui apreciada.

Daí que temos uma mentalidade provinciana que acolhe, de maneira vesga, o que vem de fora, por intermédio de uma mídia incompetente, condição lamentável que não só inclui Rede Globo, SBT, Record, FMs popularescas ou a Jovem Pan, mas "vacas sagradas" como a Rádio Cidade.

É preocupante o bairrismo mental daqueles que ouvem o Outfield como se fosse a "salvação do planeta". 

Mas esse provincianismo é capaz de supervalorizar nomes até de grande sucesso como Guns N'Roses e Michael Jackson.

Michael Jackson já era hasbeen desde os anos 1990, ele só é "deus" dentro dessa roça grande chamada Brasil.

E só mesmo no Brasil para o Guns N'Roses ser considerado "melhor do que o Led Zeppelin", porque, apesar do grande sucesso nos EUA, ninguém lá classifica a banda de Axl Rose como "rock clássico", título exercido com muito mais honra por milhares de bandas veteranas.

Lamentável ver que mesmo as pessoas ditas "modernas" no Brasil são terrivelmente provincianas e caipiras.

E isso vale não só para bolsomínions, mas também para "isentões" em geral, centro-direitistas fãs de Luciano Huck e as "esquerdas médias" complacentes com o brega-popularesco.

É gente que acha que usar WhatsApp mais de seis horas por dia lhe fará entrar em contato com o mundo e que usar camisetas com palavras em inglês irá lhe fazer moderno.

Só que não. O pessoal é bem mais provinciano, atrasado e sem um pingo de contemporaneidade do que pode imaginar. E não adianta se zangar e desmentir esse provincianismo, porque ele é mais do que óbvio. 

Daí estarmos sob o governo de Jair Bolsonaro, discípulo do hasbeen Donald Trump, não é mesmo?

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