Quem diria. O punk rock que quase sempre irradia domesticado pelas ondas das rádios canastronas Rádio Cidade (RJ) e 89 FM (SP), respira livre na Pará do tecnobrega.
Ironias do destino. Vemos, aliás, que se trata do punk rock original, incluindo o verdadeiro hardcore.
Nada a ver, portanto, com o hardcocoricore dos proto-emos que só falam de "coisas legais", nem de um Não Religião (do comediante Tatola) que mais parece o Ultraje a Rigor imitando a Plebe Rude.
Pois o evento em questão, o festival Facada Fest, realizado há um tempinho em várias cidades paraenses, virou notícia nacional nas mãos do ministro da Justiça, Sérgio Moro.
Moro acatou denúncia de um dos organizadores do protesto pró-Bolsonaro previsto para o próximo dia 15, Edson Salomão, presidente do Instituto Conservador e chefe de gabinete do deputado federal da ala ainda bolsonarista do PSL, Douglas Garcia, próximo a Eduardo Bolsonaro.
Salomão, que está sendo investigado pelo Supremo Tribunal Federal acusado de espalhar fake news, alegou que os dois cartazes e o título do evento faziam apologia ao assassinato de Bolsonaro.
Só que o problema é que a tal "facada" de Juiz de Fora tem suspeitas de ter sido uma grande armação, e os punks, na verdade, queriam tirar sarro com o duvidoso incidente, apelidado de "fakeada".
Sérgio Moro então acionou a Policia Federal que está investigando o Facada Fest.
Os cartazes são dois.
Um mostra uma réplica do palhaço Bozo (com base no apelido pejorativo do presidente) com um lápis saindo pela boca e usando uma faixa presidencial, com pistolas nos bolsos e diante de uma cidade sob trovões.
Outro mostra um cenário de fundo azul com arco-íris e uma série de referências.
Jair Bolsonaro é desenhado usando revólver e tendo bigode de Adolf Hitler (com adesivo de suástica e faixa presidencial), usando cueca estampada com a bandeira dos EUA e vomitando fezes, enquanto a Amazônia e as favelas ardem em chamas.
Enquanto isso, das fezes vomitadas cria-se um rio de lodo sobre o qual um porco com cartola de milionário e fumando charuto deita feliz sobre uma colcha inflável. No céu, aviões presidenciais com a palavra "Aerococa" despejam pacotes de cocaína pelo ar.
Sérgio Moro quer ser enérgico com os punks, mas é muito melindroso ao hesitar punir os policiais que fizeram greve no Ceará.
Quanto aos punks, uma ironia do destino "une" eles e o general Ernesto Geisel, sob cujo governo coincidiu com a época do surgimento do punk rock brasileiro, por volta de 1978.
Sim, os punks protestavam contra o governo Geisel. E Geisel abominava os punks, por razões mais do que óbvias.
Mas em um ponto ambos concordam: o repúdio a Jair Bolsonaro.
Conforme lembra matéria de Kiko Nogueira, no Diário do Centro do Mundo, o general não via com bons olhos o então jovem militar do Exército.
Jair Bolsonaro era visto como um rebelde, um desordeiro, e Geisel o definiu como "mau militar".
Dentro do Exército, Jair Bolsonaro era classificado como "bunda suja", uma gíria que significa tanto uma pessoa covarde quanto um sujeito ignorante e sem a menor importância.
Que Donald Trump presidindo os EUA foi uma piada dos Simpsons que virou realidade, isso é o cúmulo do surrealismo.
Mas nada se compara ao desordeiro Jair Bolsonaro ser eleito chefe de Estado, mesmo com tantos candidatos conservadores para os brasileiros escolherem para governar o Brasil.
Se Bolsonaro tornou-se presidente do Brasil, é porque algo está errado em nosso país.
Daí a necessidade de autocrítica. Afinal, não estamos em 1979, nem em 1988, nem em 2002. Estamos em 2020, que será uma nova "caixa de Pandora".
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