Quem se recusa a ler Esses Intelectuais Pertinentes... e está ocupado em comprar livros "mais interessantes" como dramalhões adolescentes - desses protagonizados por garotas perdidas e cujas capas aparecem florestas sombrias - , que custam até mais caro (na soma dos vários volumes de cada saga), perde uma boa vontade de conhecer os questionamentos do tal discurso "contra o preconceito" relacionado às periferias.
Afinal, apesar da choradeira do "combate ao preconceito", novos preconceitos são lançados, como os de confundir "favela" com "favelado", tratando as favelas como "nações", dentro do mito da "pobreza linda" que faz desses cenários habitacionais, construídos a contragosto diante da exclusão imobiliária do povo pobre, "paisagens de consumo" e até mesmo "safáris humanos", por parte de uma classe média que finge ser progressista mas não consegue esconder seu elitismo neuroticamente burguês, oculto em seus instintos.
Levamos gato por lebre e o discurso de uma intelectualidade pró-brega, "sem preconceitos" mas muito preconceituosa, é assimilado confortavelmente pelas esquerdas que, se há vinte anos aceitavam qualquer coisa que parecesse fazer pobre sorrir, hoje mais parecem avestruzes, engolindo qualquer coisa da direita que não fala hidrofobês, ou seja, não rosna, não late nem relincha.
E aí vemos Lula, que é o presidenciável que, apesar da vantagem, é o que mais errou na campanha eleitoral deste ano, insistir na agenda lamentável de tratar as favelas como "ambientes permanentes". No discurso realizado no Complexo do Alemão, no Rio de Janeiro, Lula tratou as favelas como se os favelados tivessem que viver nelas a vida toda, como se nela fossem prisioneiros. Não se falou em moradias melhores.
Nessa caminhada realizada no Complexo do Alemão - área perto da qual passei muito de ônibus, seja na Av. Brasil, seja na Linha Amarela - , região que envolve bairros como Inhaúma, Itaoca, Olaria, Ramos, Bonsucesso, Parque União e Higienópolis (que, diferente da homônima paulistana, é um bairro humilde), Lula esteve acompanhado do prefeito do Rio de Janeiro, Eduardo Paes, e do candidato derrotado ao governo do Estado do Rio de Janeiro, Marcelo Freixo.
Antes do evento, Lula esteve na ONG Voz das Comunidades, cujo fundador, René Silva, foi escolhido pela revista Forbes Brasil (!) um "exemplo de um time que está reinventando um país". Em 2018 René também foi premiado, em Nova York, pela organização Mipad (Most Influential People Of African Descent), em evento dedicado a pessoas afrodescendentes influentes.
Lula falou que as políticas públicas não podem ficar restritas à segurança pública e afirmou que o papel do Estado tem que se voltar para Educação, Saúde e Cultura, além de atendimentos às necessidades do povo:
"O problema das comunidades mais pobres do Brasil é que o Estado só aparece quando tem um problema para resolver, achando que a polícia é a solução. Quando na verdade a solução é a presença do Estado no cotidiano. O Estado tem que estar na educação, tem que estar na saúde, tem que estar na cultura, tem que estar no lazer, na coleta de esgoto, no tratamento de esgoto, tem que estar presente 24 horas por dia".
Tudo bem que o Estado não pode reprimir moradores, provocar esses banhos de sangue que tiram a vida de muitos inocentes. Mas não seria melhor criar políticas de moradias melhores para o povo pobre, em vez de "arrumar" as favelas, que tem casas irregulares, construídas em áreas não obstante perigosas, e tem acessos longos e difíceis, que não dão para deficientes passarem?
No comício do Complexo do Alemão, Lula se comportou como líder popular, nem tanto como o sindicalista de outrora, que é coisa do passado, mas de um candidato que defendeu, de maneira paternalista, as promessas de ações sociais:
Lula defendeu que vai cuidar da Educação, "da creche à universidade", mais créditos aos microempreendedores, mais empregos com carteira assinada e aumento "real" do salário mínimo todo ano, entre outras coisas:
""Nós iremos construir um país onde, em vez de armas, a gente distribua livros. Em vez de ódio, a gente distribua amor, onde o salário mínimo vai voltar a aumentar todo ano, onde os aposentados vão ter um aumento justo, onde a gente vai cuidar das pessoas com muito carinho, sobretudo acabar com o feminicídio, porque mulher não é objeto de cama e mesa. Mulher é muito importante".
No comício, houve gente, entre os espectadores, vestindo a camiseta com a expressão "Quem sabe da favela é o favelado". Só que, infelizmente, os favelados já estão acostumados com esse "ufanismo das favelas" que o discurso da intelectualidade "sem preconceitos", mas muito preconceituosa, e nada se faz para defender moradias melhores para o povo pobre.
Muitos trabalhadores percorrem labirintos só para chegar ao ponto de ônibus para ir ao trabalho. Até para fugir de algum perigo, se sobem degraus e degraus mal construídos, se cansando muito e correndo risco de sofrer uma queda fatal. Seria necessário uma grande política habitacional para o povo pobre. Devemos cuidar dos favelados, não das favelas. Favela não é nação, não é paisagem, não é paraíso, mas um sério problema habitacional que há décadas aflige boa parte do povo brasileiro.
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