Dá pena ver as pessoas descoladas no Brasil, ou os alternativos e pessoas conceituadas no exterior, manifestando apoio ao Lula. Nos EUA, Mark Ruffalo, Jason Momoa e até integrantes da banda Sonic Youth manifestaram esse apoio. Na Grã-Bretanha, o membro-fundador do Pink Floyd, Roger Waters, é o exemplo mais destacado.
Eu poderia muito bem apoiar Lula, mas não gostei de sua campanha. Me decepcionei com as teimosias de Lula em criar clima de festa, se aliar com opositores, fazer questão de ter Geraldo Alckmin como vice em sua chapa, e usar a "democracia" como desculpa para a formação de uma frente ampla demais. Com todos esses aspectos, o lendário Lulão dos sindicatos foi definitivamente sepultado. Não volta mais. Nem se os sindicatos passarem 2023 inteiro realizando passeatas e greves.
Lula estabeleceu compromissos com neoliberais que fizeram sacrificar o programa de governo. Como Lula quer obter votos, ele não vai abrir o jogo, e seus partidários são capazes até de dizer que o petista irá, em seu governo, descobrir a origem da Terra. Mil expectativas foram criadas em torno do ex-sindicalista, a ponto de seus seguidores mais ingênuos acharem que o petista fará uma revolução.
Pois, na reta final da campanha eleitoral, Lula afirmou que seu governo será "amplo", não sendo "um governo do PT, mas do povo brasileiro", com grande apoio da direita moderada. O protagonismo artificial de Lula foi forjado atropelando a concorrência presidencial e se impondo como "candidato único", numa campanha presidencial que só não é pior do que a de 2018, mas foi bastante vergonhosa.
Lula fez até o inesperado: faltar a debates, algo que não se imaginava em 1989. E, enquanto o seu mito de antigo sindicalista, ou, mais recentemente, do "presidente que mais trouxe benefícios para os brasileiros", continua vibrando no imaginário de seus seguidores, a usar antigas fotos do outrora líder sindical como marcas de campanha, o Lula que hoje vemos é mais um neoliberal flexível, algo como um cosplei de Dom Pedro II com habilidades de Fernando Henrique Cardoso.
O Lula sindicalista aparece como se fosse uma projeção de holograma. Uma imagem que parece viva, pulsante, mas é apenas uma projeção de uma imagem passada, que não existe mais. É uma simulação que tenta dar a impressão de que alguém continua vivendo, mas ele não vive mais.
Como um holograma, o "Lula sindicalista" entretém os jovens em geral e causa entusiasmo, esperança e alegria. Mas é tudo uma grande ilusão. O Lula sindicalista não existe mais e o que sobrou do antigo esquerdismo desapareceu definitivamente em algum momento de 2020.
O que vemos hoje no Lula é um neoliberal conciliador, a fazer um governo híbrido de outras experiências políticas. Se o governo Jair Bolsonaro virou uma mistura ensandecida de Jânio Quadros com Ernesto Geisel, Lula trabalha sua campanha como se fosse João Goulart discursando na Central do Brasil em 1964, mas anunciando um governo dos níveis do mesmo Jango sob a primeira gestão parlamentarista de Tancredo Neves, entre 1961 e o meio de 1962.
Geraldo Alckmin é apadrinhado de Mário Covas que é apadrinhado de Tancredo Neves. Fala-se muito que Lula é comparado a Tancredo Neves de 1985, no que se refere à tarefa aparente de recuperar a democracia. Mas é Alckmin que fará o Tancredo Neves de 1961, tendo mais poderes governamentais na medida em que Lula admitiu reduzir a influência do PT no governo, para desespero da "esquerda do PT", de nomes como Breno Altman, Valter Pomar e outros.
A "esquerda do PT", que puxa o esquerdismo de raiz dos movimentos sindicais e de outros partidos esquerdistas (o Partido da Causa Operária, PCO, é um exemplo), ainda acredita que, com passeatas de trabalhadores, o velho Lulão dos sindicatos do ABC paulista possa renascer com todo o vigor original, porque, em tese, Lula é sensível e não resistiria à pressão de seus antigos amigos.
Só que isso é ilusão. O Lula de hoje é um neoliberal, até parece que um bico de tucano nasceu no seu rosto. Seu governo não será esquerdista. Ele adotará medidas neoliberais e os benefícios sociais serão paliativos e dentro dos limites econômicos conservadores.
Portanto, não é um governo para fazer o brasileiro voltar a sorrir. Se o povo brasileiro estiver com a barriga cheia devido a pelo menos três refeições diárias, será alguma coisa. Mas ainda é muito cedo para sorrir. O Brasil continua frágil e nem Lula fará uma mudança revolucionária em nosso país, mas apenas devolver aos brasileiros uma pequena parcela dos progressos conquistados até 2010.
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