Mais empoderado do que no mandato anterior, o presidente dos EUA , Donald Trump, tende a tornar a realidade do mundo mais complexa, depois do breve fenômeno das esquerdas políticas domesticadas por neoliberais "democratas" - como foi com Alberto Fernandez na Argentina e ainda são com Luís Arce na Bolívia e Lula no Brasil - que parecia, em tese, sepultar a onda neoconservadora de 2016.
Trump já mudou o lema da campanha que o fez vencedor. Se no primeiro mandato o lema era "Make America Great Again" ("Fazer a América Grande de Novo"), hoje o lema é ainda mais austero, "America First". Lembrando que os estadunidenses chamam seu país como "a América". Quem nasceu nos EUA deveria ser chamado stattish, mas elas se autodefinem como american. Abaixo dos EUA, a "outra" América, incluindo o Brasil, só tem sua razão de existir se se submeter ao jugo de Titio Samuca.
Com as esquerdas prometendo mais sonho do que realidade, sem significar uma ruptura real com o neoliberalismo - a ruptura se resumiu em discursos e artifícios, não resultando em ações concretas - , a dura lição já fez as forças progressistas engolirem a vitória eleitoral de Javier Milei na Argentina.
Ultimamente o governo Lula, sem oferecer uma alternativa real ao ultradireitismo ascendente, se vale de simulacros de grandeza, com poucos resultados benéficos. Em 2024, Lula cumpriu apenas 28% do que prometeu para o ano. No festivo ano de 2023, Lula, concentrado sem necessidade na política externa, foi pior, com 20% do que prometeu para o primeiro ano do atual mandato.
Os preços continuam altos, como os juros da dívida interna. Se o desemprego caiu, seguem os padrões precarizados do mercado de trabalho e aberrações como o trabalho 100% comissionado, em que a remuneração por comissão é uma possibilidade, mas não uma certeza.
O forte desapontamento dos trabalhadores com o governo Lula faz com que o presidente fique desnorteado, iludido com a ideia de que basta "melhorar" o sistema de comunicação do governo para recuperar a popularidade. Mas o próprio Lula age como um pelego político, oferecendo baixos reajustes salariais para os trabalhadores e propondo cobranças inócuas de taxas dos super-ricos.
Daí que o discurso da extrema-direita soa tentador. Enquanto a retórica das esquerdas se torna piegas e conciliadora, muitas vezes compactuando, sob o pretexto da "democracia", com os interesses das classes dominantes, os extremo-direitistas, sem estarem identificados com as causas populares, no entanto conseguem captar a revolta dos excluídos que se desiludiram com o desprezo de Lula às caisas trabalhistas.
Devemos lembrar que Lula só empolga mesmo a pequena burguesia que domina as narrativas nas redes sociais. Lula finge estar com eventuais tretas com a classe média abastada, com a Faria Lima e com o neoliberalismo, mas age em concordância com os princípios destas elites. Até os "pobres" que Lula diz beneficiar estão mais próximos dos estereótipos de comédias de novelas e filmes.
A extrema-direita não defende os interesses das causas populares, mas aproveita as omissões das esquerdas que compactuam com a direita moderada para assediar os oprimidos que, em grande quantidade, acabam elegendo fascistas. Mas, como Jessé Souza já havia escrito, a luta dos "pobres contra pobres" que não raro alimenta o noticiário policialesco acaba favorecendo o cenário do ultraconservadorismo sociopolítico.
E o mundo da fantasia da pequena burguesia brasileira que, com a vitória de Lula, se achou "dona do mundo", exagerando nas comemorações que, no contexto da reconstrução do Brasil, já eram vergonhosamente precipitadas, começa a ruir quando Trump decide, neste novo mandato que se inicia, deportar em massa os estrangeiros que viverem nos EUA. E isso fará muitos brasileiros, que estão bem de vida, terem que voltar pra casa.
Trump também pretende ampliar o território estadunidense, anexando a Groenlândia. Mas ele pode também diminuir as ações bélicas em outros países - ele promete encerrar "em um dia" a guerra entre Rússia e Ucrânia - para economizar dinheiro e enfatizar a política interna.
Com o risco de, a exemplo de Milei, as manobras de Trump derem certo nos EUA, isso será mais um golpe contra os sonhos dourados de uma burguesia ilustrada que atraiu as esquerdas para si e as domesticou. A realidade vai ficar mais complexa quando o sonho dá lugar ao pesadelo.
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