Pular para o conteúdo principal

PRISÃO DE MANAUS, PRIVATARIA E PODER MIDIÁTICO


Um dos mais graves acontecimentos no país, depois da chacina de Campinas, foi a chacina em um presídio de Manaus.

No Complexo Penitenciário Anísio Jobim (Compaj), um dos principais da capital amazonense, duas facções rivais entraram em confronto e deixaram um saldo de quase 60 mortos.

Foi a pior tragédia prisional depois da chacina do Carandiru, em São Paulo, com 111 vítimas fatais.

Muitas questões envolvem a situação. Problemas que exigem rever os padrões do sistema prisional, não da forma como a plutocracia deseja que fosse.

Afinal, o que chama a atenção é que o presídio é privatizado.

Sua administradora, ironicamente, tem o nome de "Umanizzare", espécie de corruptela "italianizada" do verbo "humanizar".

É uma empresa que promete garantir a segurança e a qualidade dos serviços prisionais e a ressocialização de detentos.

Mas ela não impediu que o presídio se tornasse um "território sem lei" na qual grupos criminais possuem poder ilimitado e armas são dadas clandestinamente para os detentos.

O modelo de prisão privada mostra que a privatização não é a salvação da humanidade, e consegue causar sérios desastres.

Pelos incidentes semelhantes aos de Manaus, o modelo de presídio privado, adotado nos EUA da Era Reagan, está em declínio naquele país.

Mas, como toda coisa decadente no Brasil, é imposto aqui como uma "novidade" ascendente.

Há outros problemas: superlotação das celas e despreparo de funcionários do presídio são dois dos principais.

São 1.147 presos, em espaços que, no seu conjunto, são destinados a apenas 450. Mais de 2,5 vezes a capacidade total.

Em compensação, os funcionários que atendem o presídio são em número inferior: 153 quando deveriam ser 250. E operando em sistema de rodízio, sem muito preparo ou treinamento.

Até a "ressocialização" dos detentos é feita nos "maravilhosos" padrões trabalhistas propostos pelo governo Temer: trabalho precarizado e baixíssima remuneração.

Mão-de-obra barata e despreparada para cumprir funções profissionais, já praticando a terceirização do trabalho que o empresariado não esconde mais que adora.

Há também o fato de que mais da metade do total dos detentos em todos os presídios de Manaus está em prisão provisória, mas como eles são pobres eles não têm dinheiro para serem liberados.

Muito diferente quando o condenado criminal é rico e cumpre "sentença prisional" em regime aberto, podendo até, em certos casos, deixar o Brasil.

O criminoso rico é condenado e foge da prisão. O criminoso pobre, em prisão provisória, cumpre regime fechado por tempo indeterminado.

A morosidade da Justiça (sim, MOROsidade, rápida somente conforme as conveniências) faz com que as prisões sejam lotadas com detentos nesta situação.

Eles cometeram crimes leves e têm que permanecer, nunca se sabe até quando, com bandidos de alta periculosidade em celas superlotadas.

É um clima extremamente tenso, um pesadelo vivido todo dia.

Há também gente que cometeu crimes graves sem muita necessidade.

Gente capaz de degolar um vizinho porque ele não devolveu uma lata de tinta gasta pela metade.

Aí entra outro agente: o poder midiático.

A mídia policialesca é, em boa parte, culpada pelo massacre do presídio de Manaus.

Os programas policialescos são uma verdadeira "fábrica de criminosos".

Espetacularizam a violência e, com isso, criam condições para uma parcela do povo pobre usar o crime para resolver os problemas, movida pela catarse.

Junta-se a promessa de "jornalismo investigativo" dos programas policialescos de TV, indevidamente exibidos no período diurno, expostos até ao público infantil, com o sensacionalismo dos tabloides impressos.

Cidade Alerta, da Record, com Marcelo Rezende, e Brasil Urgente, da Band, com José Luiz Datena, são verdadeiras máquinas de produzir criminosos.

A forma com que eles falam em "justiça" cria contradições que impulsionam os pobres menos vigilantes a cometer crimes.

Vira um círculo vicioso: esses programas aparentemente denunciam a violência, seus apresentadores expressam moralismo e a catarse do "povão" que vê tais programas.

Diante disso, a violência é realimentada pelo ódio que faz os pobres cometerem crimes quando o entendimento seria solução fácil e satisfatória para vários conflitos.

E há gente que incomoda quando se propõe que tais programas de TV sejam transferidos para madrugada, o melhor horário para essas barbaridades "jornalísticas".

Mas, fazer o quê? Temer está tratando a grande mídia a pão-de-ló, dando gigantescas somas financeiras de verbas públicas, inflando os espaços publicitários e dando sinal verde para as corporações midiáticas cometerem abusos.

Ontem mesmo o Jornal Nacional publicou uma reportagem mentirosa sobre as "vantagens" da reforma previdenciária, aquela que forçará o trabalhador ralar até morrer.

Da forma como se defende a precarização do mercado de trabalho, não há quem possa chegar aos 65 anos para poder pegar a grana, já curta, da aposentadoria.

Com 49 anos de contribuição, então, o "beneficiário" terá se reduzido a ossadas quando vier o tempo de receber os vencimentos da aposentadoria.

A grande mídia, movida por interesses financeiros, está destruindo o país, semeando o ódio, pregando a baixaria, defendendo a degradação do mercado de trabalho.

Com muita certeza, a grande mídia tem boa parte da culpa pelo massacre de Manaus, como também do linchamento de um ambulante na estação do metrô de São Paulo ou na chacina de 12 pessoas em Campinas.

Sobretudo quem espetaculariza a violência.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

BRASIL TÓXICO

O Brasil vive um momento tóxico, em que uma elite relativamente flexível, a elite do bom atraso - na verdade, a mesma elite do atraso ressignificada para o contexto "democrático" atual - , se acha dona de tudo, seja do mundo, da verdade, do povo pobre, do bom senso, do futuro, da espécie humana e até do dinheiro público para financiar seus trabalhos e liberar suas granas pessoais para a diversão. Controlando as narrativas que têm que ser aceitas como a "verdade indiscutível", pouco importando os fatos e a realidade, essa elite brasileira que se acha "a espécie humana por excelência", a "classe social mais legal do planeta", se diz "defensora da liberdade e do humanismo" mas age como se fosse radicalmente contra isso. Embora essa elite, hoje, se acha "tão democrática" que pretende reeleger Lula, de preferência, por dez vezes seguidas, pouco importando as restrições previstas pela Constituição Federal, sob o pretexto de que some

A GAFE MUNDIAL DE GUILHERME FIÚZA

Há praticamente dez anos morreu Bussunda, um dos mais talentosos humoristas do país. Mas seu biógrafo, Guilherme Fiúza, passou a atrair as gargalhadas que antes eram dadas ao falecido membro do Casseta & Planeta. Fiúza é membro-fundador do Instituto Millenium, junto com Pedro Bial, Rodrigo Constantino, Gustavo Franco e companhia. Gustavo Franco, com sua pinta de falso nerd (a turma do "cervejão-ão-ão" iria adorar), é uma espécie de "padrinho" de Guilherme Fiúza. O valente Fiúza foi namorado da socialite Narcisa Tamborindeguy, que foi mulher de um empresário do grupo Gerdau, Caco Gerdau Johannpeter. Não por acaso, o grupo Gerdau patrocina o Instituto Millenium. Guilherme Fiúza escreveu um texto na sua coluna da revista Época em que lançou uma tese debiloide. A de que o New York Times é um jornal patrocinado pelo PT. Nossa, que imaginação possuem os reaças da nossa mídia, que põem seus cérebros a serviço de seus umbigos! Imagine, um jornal bas

POR QUE A GERAÇÃO NASCIDA NOS ANOS 1950 NO BRASIL É CONSIDERADA "PERDIDA"?

CRIANÇA NASCIDA NOS ANOS 1950 SE INTROMETENDO NA CONVERSA DOS PAIS. Lendo as notícias acerca do casal Bianca Rinaldi e Eduardo Menga, este com 70 anos, ou seja, nascido em 1954, e observando também os setentões com quem telefono no meu trabalho de telemarketing , meu atual emprego, fico refletindo sobre quem nasceu nos anos 1950 no Brasil. Da parte dos bem de vida, o empresário Eduardo Menga havia sido, há 20 anos, um daqueles "coroas" que apareciam na revista Caras junto a esposas lindas e mais jovens, a exemplo de outros como Almir Ghiaroni, Malcolm Montgomery, Walter Mundell e Roberto Justus. Eles eram os antigos "mauricinhos" dos anos 1970 que simbolizavam a "nata" dos que nasceram nos anos 1950 e que, nos tempos do "milagre brasileiro", eram instruídos a apenas correr atrás do "bom dinheiro", como a própria ditadura militar recomendava aos jovens da época: usar os estudos superiores apenas como meio de buscar um status profissional

ADORAÇÃO AO FUTEBOL É UM FENÔMENO CUJO MENOS BENEFICIADO É O TORCEDOR

Sabe-se que soa divertido, em muitos ambientes de trabalho, conversar sobre futebol, interagir até com o patrão, combinando um encontro em algum restaurante de rua ou algum bar bastante badalado para assistir a um dito "clássico" do futebol brasileiro durante a tarde de domingo. Sabe-se que isso agrega socialmente, distrai a população e o futebol se torna um assunto para se falar para quem vive de falta de assunto. Mas vamos combinar que o futebol, apesar desse clima de alegria, é um dos símbolos de paixões tóxicas que contaminam o Brasil, e cujo fanatismo supera até mesmo o fanatismo que já existe e se torna violento em países como Argentina, Inglaterra, França e Itália. Mesmo o Uruguai, que não costuma ter essa fama, contou com a "contribuição" violenta dos torcedores do Peñarol, que no Rio de Janeiro causaram confusão, vandalismo e saques, assustando os moradores. A toxicidade do futebol é tamanha que o esporte é uma verdadeira usina de super-ricos, com dirigente

A LUTA CONTRA A ESCALA 6X1

Devemos admitir que uma parcela das esquerdas identitárias, pelo menos da parte da deputada federal Erika Hilton (PSOL-SP), se preocupa com as pautas trabalhistas, num contexto em que grande parte das chamadas "esquerdas médias" (nome que eu defino como esquerdismo mainstream ) passam pano no legado da "Ponte para o Futuro" de Michel Temer, restringindo a oposição ao golpe de 2016 a um derivado, o circo do "fascismo-pastelão" de Jair Bolsonaro. Os protestos contra a escala 6x1, que determina uma jornada de trabalho de seis dias por semana e um de descanso, ocorreram em várias capitais brasileiras, como Rio de Janeiro, São Paulo, Belo Horizonte, Salvador e Porto Alegre, e tiveram uma repercussão dividida, mesmo dentro das esquerdas e da direita moderada. Os protestos foram realizados pelo Movimento Vida Além do Trabalho (VAT). A escala 6x1, junto ao salário 100% comissionado de profissões como corretor de imóveis - que transformam a remuneração em algo tão

"BALADA": UMA GÍRIA CAFONA QUE NÃO ACEITA SUA TRANSITORIEDADE

A gíria "balada" é, de longe, a pior de todas que foram criadas na língua portuguesa e que tem a aberrante condição de ter seu próprio esquema de marketing . É a gíria da Faria Lima, da Jovem Pan, de Luciano Huck, mas se impõe como a gíria do Terceiro Reich. É uma gíria arrogante, que não aceita o caráter transitório e grupal das gírias. Uma gíria voltada à dance music , a jovens riquinhos da Zona Sul paulistana e confinada nos anos 1990. Uma gíria cafona, portanto, que já deveria ter caído em desuso há mais de 20 anos e que é falada quase que cuspindo na cara de outrem. Para piorar, é uma gíria ligada ao consumo de drogas, pois "balada" se refere a um rodízio de ecstasy, a droga alucinógena da virada dos anos 1980 para os 1990. Ecstasy é uma pílula, ou seja, é a tal "bala" na linguagem coloquial da "gente bonita" de Pinheiros e Jardins que frequentava as festas noturnas da Zona Sul de São Paulo.  A gíria "balada", originalmente, era o

DERROTA DAS ESQUERDAS É O GRITO DOS EXCLUÍDOS ABANDONADOS POR LULA

POPULAÇÃO DE RUA MOSTRA O LADO OBSCURO DO BRASIL QUE NÃO APARECE NA FESTA IDENTITÁRIA DO LULISMO. A derrota das esquerdas nas recentes eleições para prefeitos em todo o Brasil está sendo abastada pelas esquerdas médias, que agora tentam investir nos mesmos apelos de sempre, os "relatórios" que mostram supostos "recordes históricos" do governo Lula e, também, supostas pesquisas de opinião alegando 60% de aprovação do atual presidente da República. Por sorte, a burguesia de chinelos que apoia Lula tenta convencer, através de sua canastrice ideológica expressa nas redes sociais, de que, só porque tem dinheiro e conseguem lacrar na Internet, está sempre com a razão, e tudo que não corresponder à sua atrofiada visão de mundo não tem sentido. A realidade não importa, os fatos não têm valor, e a visão realista do cotidiano nas ruas vale muito menos do que as narrativas distorcidas compartilhadas nas redes sociais. Por isso, não faz sentido Lula ter 60% de aprovação conform

SAI O FALSO PROFETA, ENTRA O FALSO DRAMATURGO

Enquanto muitos se preocupam com pastores com camisas de colarinho e gravatas pedindo, aos berros, para que os fiéis ofereçam até seus eletrodomésticos para as igrejas neopentecostais, o perigo maior simplesmente não é sentido por conta do gosto de mel e do aparato de falsa humildade e suposta simplicidade. Nosso Brasil está atrasado, apesar de uma elite de abastados, tomada de profundo complexo de superioridade em níveis psicologicamente preocupantes, jurar de pés juntos que o país irá se tornar uma nação desenvolvida no final de 2026. Nem em sonhos e muito menos em nenhum esforço de transformar os mais dourados sonhos lulistas em realidade. Uma prova do atraso brasileiro é que há uma dificuldade em níveis preocupantes de compreender que o pior do obscurantismo religioso não se limita a extorsões da fé manipuladora nos meios de comunicação. E vamos combinar que, embora sejam verídicas das denúncias, o obscurantismo neopentecostal anda sendo superestimado como se nele encerrassem as ma

SOCIEDADE COMEÇA A SE PREOCUPAR COM A "SERVIDÃO DIGITAL" DOS ALUNOS

No último fim de semana, a professora e filósofa Marilena Chauí comparou o telefone celular a um objeto de servidão, fazendo um contundente comentário a respeito do vício das pessoas verem as redes sociais. Ela comparou a hiperconectividade a um mecanismo de controle, dentro de um processo perigoso de formação da subjetividade na era digital, marcada pela necessidade de "ser visto" pelos outros internautas, o que constantemente leva a frustrações que geram narcisismos, depressão e suicídios. A dependência do reconhecimento externo faz com que as redes sociais encontrem no Brasil um ambiente propício dessa servidão digital, que já ocorria desde os tempos do Orkut, em 2005, onde havia até mesmo os "tribunais de Internet", processos de humilhação de quem discorda do que "está na moda". Noto essa obsessão das pessoas em brincarem de serem famosas. Há uma paranoia de publicar coisas no Instagram. Eu tenho um perfil "clandestino" no Instagram, no qual

JOO TODDYNHO NOS LEMBRA QUE O "FUNK CARIOCA" É "IRMÃO" DE JAIR BOLSONARO

A postura direitista que a funqueira Jojo Toddynho assumiu, apoiando Jair Bolsonaro, esbanjando reacionarismo e tudo, pode causar grande surpresa e até decepção por parte daqueles que acreditam na ingênua, equivocada porém dominante ideia de que o "funk" é um movimento culturalmente progressista. Vendo que Jojo Toddynho, a one-hit wonder  brasileira do sucesso "Que Tiro é Esse?" - que, nos últimos momentos da "campanha contra o preconceito" da intelligentzia  do nosso país, chegou a ser comparada, tendenciosamente, com "Gaúcho (Corta-Jaca)", de Chiquinha Gonzaga - , tornou-se garota-propaganda da pavorosa rede de lojas Havan, as pessoas dormem tranquilas achando que a funqueira é uma "estranha no ninho", ao lado de nomes como Nego do Borel, Pepê e Nenem e o "divertido" Buchecha. E aí o pessoal vai acreditando na narrativa, carregada de muito coitadismo, de que o "funk" é ideologicamente "de esquerda", que o