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TEXTO INFELIZ SOBRE "FUNK" E OBJETIFICAÇÃO DA MULHER


O texto já tem um tempo, publicado em 20 de dezembro de 2017, mas veio à tona quando pesquisei fotos para ilustrar a capa de um vídeo do TV Linhaça sobre "liberdade do corpo e escravidão do espírito".

Intitulado "O Que Pode Um Funk?", ele foi publicado pela acadêmica Ivana Bentes, na sua coluna da revista Cult.

Ivana Bentes é uma espécie de madrinha da intelectualidade "bacana" que defendeu a bregalização do Brasil, sob a desculpa do "combate ao preconceito", mas tudo o que fez foi derrubar Dilma Rousseff e extinguir a Lei Rouanet e, em etapas, o Ministério da Cultura.

Dizem que foi Ivana que atuou num lobby para botar o "aluno-modelo" de Otávio Frias Filho, o "Sérgio Moro pós-tropicalista" Pedro Alexandre Sanches, para "excursionar" nas redações da mídia esquerdista.

Pois o texto de Ivana Bentes é mais um daqueles manifestos a favor do "funk", dentro de uma retórica modernosa e dentro de alegações "preciosistas" que enfiam, tendenciosamente, frevo e Leila Diniz nesse "caldeirão huckiano" funqueiro.

No texto, cheio daquela "erudição" que já vi, em 1996, no texto "Esses Pagodes Impertinentes...", do antropólogo Milton Moura, precursor da "bacanada intelectualoide", destaco dois comentários bastante infelizes.

Em nome da "liberdade do corpo" - ela cita "emancipação do corpo" - , Ivana Bentes parece consentir com a objetificação da mulher.

Um trecho:

"A bunda (e o corpo das mulheres) pode se deslocar da objetificação para a subjetivação! A bunda viva de Anitta com sua celulite sem photoshop é sujeito e não objeto".

Postura infeliz: atribuir à bunda uma voz e um protagonismo, justificado por delírios "antropo-sociologizados".

Outro trecho, mais em frente:

"Se Anitta decide oferecer seu bumbum para ser cutucado por dedos masculinos ou feito percussão de forma lúdica, quem vai achar ruim? Os homens brincaram com seus paus por séculos e erigiram uma cultura falocêntrica, que se auto homenageia, um paucentrismo, que produziu 'tudo que está aí'".

Este é um consentimento de Ivana com o machismo da objetificação da mulher e, pelo que posso entender, a comunicóloga quer reduzir as relações de machismo e feminismo a um jogo de cão e gato. Ou de gato e rato, conforme o desejo comparativo do freguês.

O Brasil tem essa triste sina de uma sociedade conservadora, na qual se insere essa provocatividade popularesca, que apenas é liberal na agenda "identitária".

A mulher quer se emancipar, mas ela tem que optar entre o machismo e o machista, nesse estranho acordo que o feminismo tem que fazer com o establishment.

Se a mulher se recusa ao papel hipersexualizado o tempo todo, sem contexto, sem situação, "sensualizando demais" até quando vai a um enterro de alguém, ela precisa ser domada por um macho.

É o caso das it girls que falam de coisas interessantes, de viagens atraentes, de fenômenos alternativos, e só se sensualizam quando a situação e o contexto permitem.

Estas mulheres precisam ter o "poder moderador" de um marido empresário, ou um homem com alguma função de comando, um ar "mais sério" e coisa e tal.

Já as mulheres que, no entanto, se comprazem em serem brinquedos sexuais da falta de imaginário masculino - é tanta hipersensualização que o erotismo já vem pronto, não dá para fantasiar - , podem até se casar ou ter namorado, mas isso é deixado em segundo plano.

Em muitos casos, porém, essas mulheres são "liberadas" para o celibato, e viram símbolos de uma solteirice caricata, excessivamente hedonista, como se mulher solteira fosse sinônimo de "vagabunda".

O problema é que a intelectualidade "bacana", com seu discurso pseudo-libertário, quer positivar aspectos negativos das classes populares ou da chamada classe trabalhadora (a antiga classe média, com nova denominação dada pelo sociólogo Jessé Souza).

A pobreza é "linda", a prostituição é "bacana", o subemprego é o "máximo", vender produtos contrabandeados e pirateados é a "melhor coisa do mundo", a ignorância é "sábia", a idiotização é "felicidade".

São ideias infelizes, lançadas pela "intelectualidade mais legal do país". Ideias defendidas por gente "sem preconceitos", mas muitíssimo preconceituosa.

Vivemos a realidade em que as forças progressistas estão paralisadas, desmobilizadas e, ao mesmo tempo, sonhadoras e impotentes demais.

Temos a tal "liberdade do corpo" que escraviza mentalmente parte das mulheres brasileiras, assim como as periferias se tornam "prisões" do povo pobre, até que os abusos de poder policial dizimem sua cota diária de pobres inocentes.

Tudo é "legal" na "pobreza linda" até chegarem caveirões, drones e atiradores sniper, atingindo "sem querer" as vítimas inocentes. E depois disso a intelectualidade "bacana" chora lágrimas de crocodilo, enquanto segue, cinicamente, com seu espetáculo da "pobreza linda".

Ivana Bentes, aliás, se contradisse, quando criticou o mito da "periferia legal" em Central da Periferia e elogiou o documentário Sou Feia Mas Tô Na Moda, de Denise Garcia.

É como se tivesse dito "odeio abóbora, mas adoro jerimum". O documentário também aposta no mito da "periferia legal" e isso é bastante óbvio, mesmo com uma narrativa mais dramática do que a do programa televisivo.

Hoje estamos entre a cruz e a espada do culturalismo conservador fantasiado de "causas progressistas".

Estamos na cruz de uma "escravidão do espírito" (sofrer em silêncio, continuar trabalhando demais etc) que o discurso da "fé religiosa", no caso a "fé espírita", alega ser "libertário".

E estamos na espada de uma "liberdade do corpo" que escraviza as mentes, por parte dos fenômenos popularescos da "ditabranda do mau gosto".

As esquerdas, iludidas, ficam nesse caminho duplo, mesmo quando funqueiros defendem o aborto e "espíritas", não.

A ilusão dupla, no entanto, se sustenta porque os dois fenômenos, apadrinhados pela mídia venal, fazem sua propaganda exibindo pessoas pobres sorridentes e adotando discurso não-raivoso.

O problema maior é que esses dois fenômenos, o Espiritismo brasileiro e o "funk", são apoiados abertamente por uma mesma pessoa: o apresentador, empresário e potencial presidenciável Luciano Huck.

Dessa maneira, as esquerdas emotivas e piegas, que acreditam que a fada-madrinha vai tirar Lula da prisão, vão acabar, na verdade, entregando a faixa presidencial para Luciano Huck ou um protegido deste.

Loucura, loucura, loucura.

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