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A VERGONHOSA VOLTA DO COMERCIALISMO DA AXÉ-MUSIC


Vergonha. A alegria como mera mercadoria de consumo barato, a doses pesadas de cerveja, está de volta com a axé-music tirando casquinha desse pretenso saudosismo do brega-vintage, em que os ídolos popularescos dos anos 1970, 1980 e 1990 são relançados agora de maneira gourmetizada, como se seu comercialismo aberrante valesse alguma coisa.

Não estamos falando apenas dos medíocres magnatas, com mais dinheiro do que talento, Bell Marques e Durval Lélis, agora tocando juntos a mofada música de seus repertórios para a gente rica dos cruzeiros marítimos. Ou da famigerada positividade tóxica do É O Tchan. Falamos também de coisas "legais" como o ensaio do agora cantor solo Xanddy Harmonia nas segundas-feiras e o evento do Wet'n'Wild com Léo Santana, o Baile da Santinha.

A dance music de baiano, a ultracomercial axé-music, está voltando mediante investimentos pesados do empresariado e das grandes oligarquias baianas, dentro de um cenário culturalmente devastado de Salvador, que há décadas não consegue recuperar a modernidade perdida em 1964, sofrendo a supremacia de empresários de axé-music, dirigentes de futebol, "coronéis" radiofônicos e até "médiuns espíritas" sintonizados com o Século XII da era medieval.

Há muito a Bahia não recupera sua modernidade. Até se esforça em melhorar sua estrutura urbana, dando um banho na acomodada Niterói - que não se encoraja a aproveitar um terreno ocioso de Rio do Ouro e Várzea das Moças que daria numa boa rodovia, forçando a RJ-106, rodovia estadual, a atuar como "avenida de bairro", atrapalhando o trânsito de veículos - , com desenvolvimento de rodovias e ampliação do metrô.

No entanto, o culturalismo da Bahia é um horror, com a miséria ainda predominando, com uma elite do atraso concentrada no Corredor da Vitória, que se diverte geralmente em Vilas do Atlântico, no município vizinho de Lauro de Freitas e cujo provincianismo é tão cheio de onda que seus indivíduos leem artigos do New York Times reproduzidos na imprensa paulista e dizem que leram tais matérias nas fontes originais estadunidenses.

A música brasileira precisa melhorar, a MPB autêntica carece de espaços e está perdendo seus próprios espaços para a turma popularesca mais veterana, e vivemos uma grande catástrofe cultural na qual a mediocridade do passado é gourmetizada, enganando o público que já se ilude demais com as mentiras trazidas pelas redes sociais.

A axé-music só atende a interesses de uma classe média que agora é a "banda boa" da elite do atraso, que implora não ser classificada com este nome. Afinal, essa "boa elite" de hoje está com Lula, quer viver um "tempo de amor" e, por isso, não quer saber de senso crítico nem de ser alvo de críticas. A axé-music não tem a ver com Senzala nem Quilombo, é apenas um pop dançante que encaixa com muito agrado no gosto da Casa Grande.

Me lembro quando tentei entrar no Mestrado da Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas na Universidade Federal da Bahia (FFCH-UFBA) com um anteprojeto sobre a crise da baianidade. Minha oferta não foi aceita, claro, porque descobri que senso crítico não é o forte dos colegiados de pós-graduação nas universidades brasileiras, você tem que escrever uma monografia evitando exercer o pensamento crítico, sendo recomendável desenvolver a tese com flanela na mão.

Sim, porque aqui ser intelectual é passar pano na problemática dos fenômenos humanos. É ser complacente com o tema estudado. Os trabalhos de pós-graduação são meramente descritivos, é proibido exercer o senso crítico, porque isso desestabiliza. Em nome da paz social e acadêmica, a ideia é apenas descrever um tema "friamente", sob a desculpa da imparcialidade, objetividade e a tal "abordagem científica", eufemismo para toda a passagem de pano numa problemática desproblematizada, transformada em patrimônio fenomenológico.

Tudo isso ocorre porque aqui tem todo um esquema de clientelismo financeiro. Instituições estadunidenses pagam por fora as universidades em geral, públicas e privadas, financiando colegiados de pós-graduação. Por isso não se pode fazer temas incômodos, a "livre temática" tem que ser movida a muita passagem de pano, porque tem dinheiro em jogo, além do fato de que o orientador de pós-graduação quase sempre vive de estrelismo, não pode ser passado para trás por um mestrando ou doutorando com um apetite crítico de um Umberto Eco.

E aí temos que fingir que a cultura baiana está numa boa, vivendo os melhores momentos. Se o dinheiro circula e todo mundo está sorrindo, está tudo bem. Pouco importa se uma aberração tipo "Dança do Bumbum", do É O Tchan, é considerada "clássico", dentro desse horroroso brega-vintage que não se compara com o saudosismo lá fora, em que um nome como Jeff Beck é lembrado até por atores de seriados teen

Aqui o que se vê é o resgate de todo um lixo musical que soa até "divertido" para quem está acostumado a ouvir música tomando uns engradados de cerveja, mas que certamente não são músicas para serem ouvidas por gente lúcida e sóbria, devido ao evidente vazio cultural e à baixa qualidade musical dessas canções que deveriam ter durado apenas um verão de sucesso comercial, para depois caírem no esquecimento.

Em país menos tolo, a axé-music seria alvo de um profundo esquecimento. Mas interesses financeiros fazem com que essa música tão comercial quanto um banco de investimentos se recicle sem a menor necessidade, com seus ídolos sem ter o que compor, até porque precisam ficar se copiando o tempo todo, já que criatividade é o que a axé-music não tem e que nem as verbas autorizadas pela ministra e cantora Margareth Menezes irão garantir. Afinal, dinheiro não compra talento.

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