Em tempo de positividade tóxica desses tempos em que vivemos, em que Lula está mais para um ursinho de pelúcia dos neoliberais do que o leão gigante a bradar pelo progresso e pela liderança mundial do Brasil, prefiro ficar no meu ceticismo, duvidando das esperanças num tempo em que o golpismo de 2016 foi ainda há pouco.
Paciência. Eu junto peças dos quebra-cabeças e vejo os ponteiros do relógio se movimentarem. 2016 não é 100 anos atrás. E fatos soltos parecem inofensivos quando mantidos como peças fragmentárias, cuja dispersão faz as pessoas não desconfiarem de contradições e problemas existentes.
Com o desmonte do bolsonarismo e seus vilões de seriado de super-heróis, quando o Poder Judiciário ordena a quebra de sigilo bancário de empresários bolsonaristas que ameaçam dar um golpe diante da vitória de Lula, cria-se agora um ambiente de "limpeza" no qual a boa burguesia empresarial, mesmo com boa parte de protagonistas do golpismo de 2016 e do governo Michel Temer, tenta se livrar de outros empresários mais alinhados com Jair Bolsonaro.
Para quem não sabe, os empresários bolsonaristas acusados de ameaçar dar um golpe no caso da vitória eleitoral de Lula são: Luciano Hang (Havan), Afrânio Barreira Filho (Coco Bambu), Marco Aurélio Raymundo (Mormaii, rede de moda para surf), Meyer Joseph Nigri (Tecnisa, ligada ao ramo imobiliário) e José Isaac Peres (Rede Multiplan, de shopping centers como Barra Shopping, no Rio de Janeiro, e os shoppings Morumbi e Anália Franco, em São Paulo).
Mesmo diante de um cenário que está mais para um conservador "positivo" do que para um cenário realmente transformador, há muita expectativa da "boa sociedade", ávida em ver um Lula domesticado governando o Brasil, sob o freio rigoroso de Geraldo Alckmin. É um projeto neoliberal assistencialista, conhecido como social-liberalismo, corrente ideológica que soa como um capitalismo dotado de certo bom-mocismo.
Isso cria um zeitgeist, ou seja, o "espírito do tempo", no qual se desmonta alguns ícones simbólicos do bolsonarismo. Empresários bolsonaristas, músicos "sertanejos" como Gusttavo Lima, "militantes ligados ao Movimento Brasil Livre (leia-se Movimento Me Livre do Brasil) e no plano religioso, os neopentecostais, são agora alvos de um processo de "limpeza", não necessariamente para combater todo o legado golpista, mas para botar a culpa do golpismo de 2016 para um seleto número de envolvidos.
E como falamos em religião, vemos que agora o filão dos horrendos "filmes espíritas" - sim, estamos falando do Espiritismo brasileiro que eu segui durante 28 anos e do qual há 10 anos me livrei dessa verdadeira intoxicação astral - , na verdade arremedos de novelas da Rede Globo ruins só que em formato de longa-metragens, dotados de temática piegas e sem serventia alguma para a vida humana.
Pois, recentemente, um filme foi lançado e, numa entrevista coletiva, os atores Juliana Paes e Danton Mello, em dado momento, choraram supostamente por causa do enredo do filme, repetindo um hábito um tanto cafona e bastante exagerado daqueles que se envolvem de uma forma ou de outra nas atividades dessa religião "espírita" que trai Allan Kardec, no mínimo, setenta vezes sete vezes mais do que Judas Iscariotes traindo Jesus Cristo.
Trata-se da prática da comoção fácil, que muitas doutrinárias "espíritas" prometem. As lágrimas como um divertimento, como um entretenimento. Tudo na mais chorosa e gosmenta pieguice. É como um conto de fadas para adultos, com estórias que variam de certos "predestinados", "missionários" ou "iluminados" que alegam receber mortos e, na encenação toda, com aquela carga dramática pomposa, fazem um ritual que envolve, emocionalmente, os espectadores.
Trata-se de uma masturbação com os olhos ou pelos olhos. Pois a comoção religiosa é uma espécie de orgasmo da fé, que só não seria definida como "punheta" porque as mãos não tocam os olhos, ocupadas em ficar pelo ar estendidas, como em posição de louvor. Mas se trata de uma mesma orgia, que na fé pseudo-racional do Espiritismo de chiqueiro que aqui existe se torna uma marca para enganar muita gente boa, mesmo jornalistas investigativos que, volta e meia, se cansam de tanta digitação e veem na glorificação de "médiuns espíritas" a chance de substituir o teclado pela flanela.
Tudo isso envolve interesses comerciais, sim, e as novelas, digo, os filmes "espíritas" são de uma pieguice terrível. Já vi um deles, um tal de Filme dos Espíritos, que preguiçosamente descreve a sinopse como "inspirado em O Livro dos Espíritos de Allan Kardec". Você vai ver o filme e concluirá que essa alegação não passa de uma grande lorota. Mais fácil é Edir Macedo dançar num ritual de candomblé do que haver algum vestígio real de Kardec no Espiritismo feito por aqui.
É terrível essa masturbação pelos olhos, porque muita gente, sem saber, acaba se divertindo com o sofrimento dos outros, sentindo aquele êxtase da comoção fácil, que nas doutrinárias mostra adultos e, sobretudo, idosos, com caras de bebês chorões, seja quando uma estória é narrada, seja quando uma atividade "mediúnica" traz algum resultado.
Tudo vira um sadismo mal disfarçado e nunca percebido. E como ninguém se dá conta que o Espiritismo brasileiro se fundamenta em ideias medievais, já que a religião brasileira, por conta de um tal "médium da peruca", resolveu se tornar o depósito de lixo do Catolicismo (o que os católicos descartam de tão velho, os "espíritas" pegam para si), que a "maravilhosa doutrina kardecista" na verdade se baseia nos postulados obscurantistas da Teologia do Sofrimento, então muita gente aceita com submissão bovina e passando muito pano nos "médiuns".
É horrível perder tempo chorando com obras "espíritas", uma comoção sem sentido algum. Mas em outros momentos eu vi que havia também sorrisos bobos, principalmente em entrevistas transmitidas pela Internet. Um semblante infantilizado, tolo, piegas. Em para piorar, a toxicidade "espírita" ainda contamina o Instagram que eu uso clandestinamente (não tenho perfil oficial), no feed de imagens.
O Espiritismo brasileiro é a religião da elite do atraso. É a religião dos que fingem ajudar o próximo, apenas dando migalhas para os pobres. É a seita dos ressentidos, que, aborrecidos em não alcançar valores realmente sublimes e belos, cabendo atribuir pretensa beleza em "médiuns" feiosos e muito mais feios por dentro, com feiura espiritual capaz de, num programa de televisão, defender com assustador radicalismo regimes marcados pela opressão, como a ditadura militar.
Mas hoje essa religião tenta ser o contraponto "não-raivoso" do Neopentecostalismo, dentro do clima de positividade tóxica que se sucede ao niilismo da primeira fase do golpe de 2016 (2016-2021). Tanto que a "isenta" Juliana Paes, acusada de ser bolsomínion, foi atuar num filme "espírita", na esperança do barco Spiritanic se tornar um diferencial em relação às canoas furadas dos "neopenteques".
Só que é mais um cenário de pseudo-novo que envolve um neoliberalismo travestido de socialismo, um culturalismo sorridente que mistura Tropicalismo com "funk" e "pagode romântico", e que esconde debaixo do tapete o passado sombrio de Geraldo Alckmin (quando ordenou, com a frieza de um Pôncio Pilatos, a destruição do bairro popular Pinheirinho, em São José dos Campos), que agora virou um "queridinho" das esquerdas médias.
Tinha que haver uma religião sintonizada com esse clima de "boa" hipocrisia, em que a nata da elite do atraso não se assume como tal, "moderna", "alegre" e "generosa" que é. Um Espiritismo à brasileira, que publica inescrupulosamente obras fake, as psicografakes - que num passado longínquo arruinaram com a reputação de um Humberto de Campos - , que o senso comum dominante deixa passar devido a mensagens que evitam usar a língua do hidrofobês. Com um discurso sem raiva, no Brasil de hoje, até o Diabo ingressa fácil, fácil ao Paraíso, não é mesmo?
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