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LULA FAZ MEA CULPA INSTITUCIONAL, MAS NÃO DEMONSTRA AUTOCRÍTICA


No último seminário do Partido dos Trabalhadores - hoje atuando mais como o Partido dos Tucanos - , o presidente Lula expôs críticas em relação ao partido, aos parlamentares e à equipe de governo, como se isso indicasse uma postura autocrítica do chefe da nação.

Foi em Brasília, no último dia 06, e Lula repetiu sempre os mesmos discursos quando faz, por exemplo, as reuniões ministeriais. Suas críticas se voltam, sobretudo, à "falha na comunicação" da equipe de governo, por não se empenhar, supostamente, na transmissão da informação das aparentes realizações do presidente, ao dizer:

"Temos um problema sério de formação política. Nós desaprendemos a fazer formação porque o jeito de fazer política ficou mais institucionalizado, nós não conseguimos sequer ter possibilidade de utilizar a internet com o poder de alcance que ela pode ter".

Apostando na retórica da "reconstrução rápida demais", trazida por relatórios que, estranhamente, enumeram "recordes históricos" do governo Lula, em ações que não conseguimos ver na realidade senão apenas uma parte delas, o presidente brasileiro exagera ao mencionar suas realizações:

"Nesses dois anos de governo, já fiz muito mais entrega de políticas públicas para a sociedade do que fiz nos oito anos anteriores [2003-2010]. Mas eu sinto que, cada vez eu viajo, converso, que atendo ministro, que nós não estamos entregando de forma adequada para q a sociedade tenha as informações daquilo que nós fizemos".

Lembremos que, antes dos relatórios, a realidade concreta é que tem que ser considerada. Não é porque se gosta de fulano ou sicrano que se vai confiar cegamente nos relatórios e achar que são "realtórios", sem sair de casa para ver a realidade concreta, feito o lulista das redes sociais que, na sua arrogância, pensa que observa o mundo sentado no seu sofá, no conforto de sua casa.

Lula não fez "muito mais entrega de políticas públicas" para a sociedade do que nos dois mandatos anteriores. Reconhecemos que Lula fez até realizações significativas nos outros governos, mas, claro, longe de ser algo revolucionário, como as realizações de Getúlio Vargas e o projeto que João Goulart foi impedido de realizar em 1964.

Afinal, observando bem as "realizações" do atual mandato de Lula, a maioria delas é paliativa, sem grandes benefícios para a sociedade. E falamos apenas de uma pequena parte, pois o resto são apenas opiniões, promessas e propostas que se vendem como "realizações" no malabarismo discursivo do presidente, coisa que só é respaldada pela blindagem que o chefe do Executivo federal recebe nas redes sociais.

Lula demonstra também a obsessão pelo bolsonarismo, o que fez com que ele suavizasse sua visão em relação à ditadura militar, à atuação neoliberal do PSDB, ao golpe de 2016 e ao governo Michel Temer, como se tudo, agora, fosse obra de Jair Bolsonaro (antes era Sérgio Moro, mas ele "morreu" politicamente). Imagine Bolsonaro, com nove anos de idade, dando ordens a Olímpio Mourão Filho para derrubar Jango em 1964! Disse Lula:

"O PT tem culpa, meu governo tem culpa. Porque a gente não pode permitir, em nenhum momento, que alguém que pensa como pensa a extrema direita no nosso país tenha mais espaço nas redes sociais que nós, tenha mais informações na internet do que nós".

O presidente Lula reclama da "institucionalização" do PT, acha que o partido ficou dependente da atuação dos deputados, e no discurso ele pediu para que o partido "voltasse às origens", dialogando com as bases sociais, "conversando com as igrejas e fábricas". Segundo Lula, o PT "não pode ser subordinado a mandato de deputado, tem que ter base mandando".

Só que aí temos um grande problema. Afinal, se ocorreu o afastamento do PT das bases sociais - leia-se as classes populares - , isso não ocorreu pela mera atuação parlamentar nem na falha da comunicação do governo. Se, no evento de Primeiro de Maio, Lula encontrou uma plateia vazia, a culpa é única e pessoalmente dele.

Como um político pelego, Lula fez muito pouco pelos trabalhadores, desempregados e outros excluídos sociais da vida real, diferentes dos "excluídos" que foram incluídos no Clube de Assinantes VIP da democracia de um homem só" do presidente brasileiro.

Nota-se que Lula só dá aumento anual de R$ 90 para o salário mínimo, e no seu governo ele não realizou politicas em favor dos camponeses, dos povos indígenas, dos movimentos afro-brasileiros, dos produtores culturais independentes, dos professores e servidores do ensino público em geral. Sinal de que o discurso de que Lula realizou em dois anos no atual mandato "muito mais" do que em oito anos de governos anteriores do presidente é uma cascata.

Lula tornou-se um pelego, tomando gosto pelas alianças espúrias com a direita moderada, a mesma que se envolveu, no passado recente, com a defesa das privatizações nos anos 1990 e pelos retrocessos trabalhistas do governo Michel Temer. 

Daí, por exemplo, Lula estar passando pano na precarização expressa na escala 6x1 do mercado de trabalho, só esperando a proposta de Erika Hilton se massificar para o presidente se apropriar da causa do fim desta escala como se fosse uma ideia original dele.

Lula já chegou a ter algum desempenho técnico na resolução dos problemas do país, nos mandatos anteriores, e talvez até tivesse uma atuação exemplar na época da pandemia, se ele tivesse sido o presidente brasileiro. Mas a Lava Jato e o bolsonarismo fizeram Lula enlouquecer e, num momento em que o Brasil precisava mais de uma dedicação presencial do presidente para a tal reconstrução nacional, ele fez o que não devia, priorizar a política externa.

Com tudo isso, Lula fingiu admitir autocrítica. Mas a "autocrítica" e a mea culpa foram apenas "institucionais", responsabilizando a equipe do governo, o departamento de comunicação e a cúpula partidária. No entanto, se o PT e o governo Lula sofrem uma séria crise, a maior responsabilidade deveria ser, unicamente, do próprio presidente da República.

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