Três episódios muito diferentes entre si estão, na verdade, interrelacionados.
Em 21 de maio passado, a modelo e empresária Luíza Brunet foi violentada pelo namorado Lírio Parizotto, conhecido empresário que acabava de adquirir a fatia catarinense da Rede Brasil Sul.
No último dia 02 de julho, o estudante Diego Vieira Machado, de 30 anos, negro e homossexual, foi encontrado morto com sinais de violência no campus da UFRJ, no Fundão, Zona Norte do Rio de Janeiro.
No último dia 04, a página da cantora Negra Li foi invadida por hackers que, publicando a foto de um macaco, publicaram textos com ofensas raciais.
Tudo isso tem algo em comum.
A sociedade retrógrada e intolerante, ainda presa a vícios tão mesquinhos e valores tão reacionários.
Dos três casos, só um deles não é relacionado a um jovem, mas a um senhor de 63 anos.
O que mostra que é justamente nas elites que homens de 60 anos se tornam ainda mais imaturos.
Isso num tempo em que a meia-idade precisa ser reinventada, pois são cada vez mais raros os "coroas" que são capazes de transmitir sabedoria e experiência de vida para as pessoas.
Nossos cinquentões e sessentões não prepararam um país digno e justo, pois eles mesmos eram jovens durante a ditadura militar, onde era proibido ensinar e transmitir idealismo e dignidade, sob pena de prisão, tortura e até morte.
Eram "filhos" de uma histeria reacionária que não podiam controlá-la há 45 anos, porque eram proibidos, e que hoje não conseguem controlar sentimento semelhante nos jovens, porque são incapazes de fazê-los.
Os jovens reaças, que não aguentam as transformações sociais que revelam novos beneficiados e põem em xeque antigos plutocratas, partiram para o vandalismo na Internet.
Da mesma forma, também partiram para a violência física, não satisfeitos com o rancor e as ameaças que despejam, feito lixo derramado, nas mídias sociais.
São jovens que, a exemplo da canção "A Dança" da Legião Urbana, foram descritos por Renato Russo como "indivíduos que se acham tão modernos pela questão da idade".
Tinham o verniz do visual arrojado, das tatuagens, dos palavrões, do jeitão bagunceiro, das diversões modernas, do humor corrosivo, do jeito animado e do aparente dom de comunicabilidade.
Existem psicopatas que surgem de pessoas silenciosas e casmurras.
Mas há, e não poucos, os psicopatas que surgem de pessoas animadas, descontraídas e muito faladoras.
Gente que adora contar piada e parece muito alegre, simpática e divertida.
Que deixa a máscara cair quando, contrariado por alguém devido a determinado ponto de vista, decide humilhar esta pessoa da maneira mais violenta possível.
Tem muita gente boa que embarca, na boa-fé, no cyberbullying deste amigo mais "atrevido", por achar que ele está fazendo uma "brincadeira sadia".
Depois, essa gente boa, sem saber, acaba tendo ficha criminal, seus comentários também passam a ser registrados pelo delegado de polícia e suas atividades monitoradas pelo mesmo.
E isso apenas porque foi na carona do valentão carismático em seu ritual de linchamento moral de um discordante.
Fora dos limites digitais, quatro suspeitos de terem matado Diego Vieira Machado estão sendo investigados.
Seriam quatro universitários, e não se sabe se eram rapazes pouco enturmados ou se são pessoas de grande carisma social.
Em tempos de plutocracia, devemos tomar cuidado justamente com os que são extrovertidos demais e muito carismáticos.
Espera-se que os cyberbullies sejam pessoas isoladas, autistas, antissociais e caladas.
Nem sempre.
Eles podem estar por trás de gente muito influente, carismática, animada, divertida e supostamente "muito amiga".
Os hackers que atacaram a página de Negra Li podem ser gente muito bem querida por muitos internautas nas mídias sociais.
Da mesma forma, o Lírio Parisotto que quebrou quatro costelas da bela Luíza era um empresário em ascensão, executivo muito admirado pelos colunistas sociais.
É preciso tomar cuidado com quem detém prestígio e poder hoje em dia.
Afinal, é um Brasil desgovernado através de um projeto político cheio de ideias retrógradas.
Um governo temeroso (em todos os sentidos) respaldado pela "galera irada" que pediu para esse cenário político fosse consolidado.
Para um governo que promete precarizar o mercado de trabalho e desqualificar a educação nas escolas, faz sentido haver os surtos dessa sociedade reaça.
Machistas, homofóbicos, racistas, patriarcalistas, patrimonialistas, incapazes de ver a hora e a vez daqueles que não são a sua turminha nem os pretensos detentores de poder decisório.
É lamentável que haja gente que não aguente os novos valores sociais ou que ficam com mesquinharia.
Como um Lírio Parisotto que agrediu Luíza Brunet porque não aceitava ser confundido com o ex-marido dela, Armando Fernandez, pai dos dois filhos da modelo, Yasmin e Antônio.
Lírio não teve jogo de cintura para explicar o equívoco da confusão, e ainda discutiu com a namorada com aquela explosão desnecessária de ciúmes da repentina comparação com o ex.
Pois Lírio tenta desmentir a agressão com aquele vitimismo machista conhecido.
A própria sociedade machista também não aceita que um homem possa gostar de homens. E aí acabaram com um universitário que tinha apenas suas próprias escolhas amorosas.
E era negro. Como é a cantora Negra Li.
E aí tem o caso do racismo, que não aceita que negros ultrapassem os limites dos papéis pré-determinados pela sociedade plutocrática.
Negros e negras só podem rebolar, jogar bola, fazer papel de escravos, garis ou domésticas, e isso quando não há coisas piores como se prostituir, ser vítima de pedofilia quando menor de idade etc.
Quando esses limites são ultrapassados, a rebeldia plutocrática dos jovens reaças entra em ação com seus atos vingativos.
E muitos desses valentões são gente considerada "divertida" e "animada" nas redes sociais.
Daí o "sucesso" desses atos tão mesquinhos, tão covardes, tão humilhantes, tão perversos.
É quando cai a máscara do "irreverente admirável" e seus amigos "igualmente divertidos".
Demonstrando-se homofóbicos, machistas, racistas e outras posturas reacionárias.
Tudo a ver que haja um governo temeroso que quer retroceder o país.
A sociedade que apoia esse projeto de poder é retrógrada e, em diferentes episódios, mostra o seu grau de intolerância social e não-aceitação das transformações que aconteceram em nosso país e que ameaçam ser revertidas.
Infelizmente, há quem acredite ser possível fazer uma marcha-a-ré da História.
Mas a ditadura militar já ensinou que esse caminho é perigoso e desastroso. Daí que a marcha-a-ré de 1964 e 1968 só conseguiram provocar mais crises. A de 2016 não será diferente.
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