Pode parecer uma paródia.
Estudantes de uma escola de Curitiba, a Escola Municipal Profª Maria Gai Grendel, fazendo uma versão de "Baile de Favela", do funqueiro-ostentação MC João, mas citando ideias marxistas.
"Karl Marx é 'baile de favela", diz um trecho da manifestação.
A ideia é protestar contra a expulsão de uma professora, Gabriela, que ensinava Sociologia e foi condenada por ensinar o pensamento do famoso economista alemão, ícone do socialismo científico.
Seria um protesto contra a implantação sutil do projeto Escola Sem Partido nas escolas do país.
Até aí, nada de mais.
O problema é, mais uma vez, o vínculo forçado do "funk" ao esquerdismo.
Se o "funk" estivesse na dele, sendo um pop dançante sem muito compromisso, não sendo levado a sério demais, não haveria problema.
O problema é que o "funk" quer se impor como "ativismo" e tenta se apropriar do esquerdismo para levar vantagem.
O "funk" sempre soou como um acalanto para os barões da mídia, por ser ao mesmo tempo um ritmo comercial, que aborda o povo pobre de maneira caricata e desvia o foco dos debates culturais de esquerda.
O "funk" não veio de Marte. Veio da Globo. "Funk" é o Caldeirão. Do Luciano Huck.
A propósito, um dos propagandistas do Escola Sem Partido é bastante conhecido e adorado pelos funqueiros.
Trata-se de Alexandre Frota, que teve uma breve passagem como ator pornô, empresariou funqueiras e criou as precursoras das mulheres-frutas do gênero.
Foi ele que criou a "Enfermeira do Funk", em 2001.
Nessa época, a jornalista Bia Abramo, no seu texto "O funk e a juventude pobre carioca", classificou uma ação judicial promovida por enfermeiras de verdade como "moralismo hipócrita".
As enfermeiras podem sofrer discriminação. O "funk", não.
Bia acabou defendendo uma cliente de Alexandre Frota, que nunca foi alguém identificado com as causas progressistas.
Frota até tentou uma carreira de ator sério, participou das novelas Roque Santeiro e Sassaricando, mas depois mergulhou no popularesco de vez.
E nem de longe Frota parecia ter militado no esquerdismo.
Pelo menos temos que admitir que Reinaldo Azevedo, Lobão, Marcelo Madureira e até mesmo Olavo de Carvalho haviam sido esquerdistas uma vez.
Alexandre Frota, não. Ele ingressou na direita não como um esquerdista frustrado (ou "ex-querdista"), mas como um homem originalmente "sem ideologias".
E foi justamente sob este pretexto de "sem ideologias" que ele apoiou o projeto Escola Sem Partido, idealizado por Miguel Najib e apoiado por diversos parlamentares de todo o país.
Quanto ao "funk", pode não ser culpa da juventude a escolha do ritmo para tal processo.
Vivemos numa sociedade hipermidiatizada, dominada pela sociedade do espetáculo.
Aqui não há um equivalente a Guy Debord para questionarmos os excessos movidos pela espetacularização, pelo consumismo e pela overdose de informações.
Em vez de questionarmos, aceitamos tudo isso como se fossem a "salvação da pátria".
Temos até similares a Guy Debord mas a burocracia acadêmica e o habitual rabo preso econômico barraram tais intelectuais nas primeiras inscrições para a pós-graduação.
Paciência, é o país de Sérgio Moro e sua parcialidade.
Curitiba é o reduto de Moro, uma cidade que acompanha a decadência do Sul e Sudeste.
Antes desenvolvidas, as duas regiões sofrem um surto violento de provincianismo, experimentando retrocessos antes típicos do Norte e Nordeste.
Junte-se o cenário midiático de Curitiba, quase totalmente plutocrático, e veja o que temos.
Jovens usando um "funk" para fazer um protesto progressista.
Só que usam um "instrumento" da direita para defender uma causa esquerdista.
O "funk" é o Cabo Anselmo de hoje. Forja um esquerdismo que, mesmo postiço, empolga muitos pela catarse que produz.
Mas o "funk" comprovou-se colaborar para a CIA - é defendido por instituições financiadas por entidades ligadas a esse órgão - e já traiu as esquerdas bem mais do que o temível militar, já que, a cada vitória obtida, os funqueiros sempre comemoram abraçados aos barões da mídia.
Karl Marx é "baile de favela"? Não.
Guy Debord também não poderia ser.
Mas Cabo Anselmo é "baile de favela". E a Rede Globo, sobretudo.
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