Um conhecido dirigente funqueiro, em polêmica com um conhecido colunista de jornal, deu o tiro no pé.
Famoso por tentar ficar com a palavra final para tudo, o funqueiro demonstrou sua completa incompreensão sobre cultura.
Ele citou, na sua coluna em um periódico de esquerda - o funqueiro é famoso por fazer proselitismo a intelectuais de esquerda - , que a cultura "não modifica a sociedade".
Ele diz, no seu primarismo pedante, que a cultura apenas é o "reflexo" da sociedade, que por sua vez é o "espelho".
Comparação bastante simplória, mas defendida pelo funqueiro que acha que o "funk" é a medida de todas as coisas.
O grande equívoco dele é que a ideia de cultura é justamente a modificação de uma sociedade.
Isso está nos conceitos mais elementares da Antropologia.
Em toda sociedade, a cultura é usada como meio de intervir na realidade, sobretudo se percebermos que ela é uma forma de perpetuar uma comunidade, diante da efemeridade da vida.
A cultura acrescenta, sim, alguma coisa na vida das pessoas.
A cultura não é estática, daí a modificação que ela faz na sociedade.
Interferindo no cotidiano social, a cultura o modifica, e isso é fato.
No "funk", sabemos que durante muito tempo o som nada fez na evolução cultural.
O ritmo ficou durante muitos anos na estrutura estática de uma batida e um MC de voz esganiçada.
O próprio dirigente funqueiro se lembra disso. Foi um de seus "artistas".
Ele tanto quis comparar o "funk" com o samba, mas o samba sempre teve uma instrumental forte e uma musicalidade orgânica e livre.
Assim que o semba africano foi implantado no Brasil, ele virou samba mas se dividiu em coco, jongo, caxambu, lundu, maracatu e tudo o mais, tanta a riqueza sonora.
O "funk", pelo contrário, permaneceu na mesma pasmaceira.
Até suas "variações" são muito frouxas, e isso quando há alguma mudança no som.
Como no "funk de DJ", feito para turista ver, em que o DJ "capricha" nas colagens só para competir com os DJs eletrônicos de fora.
Ou como no "funk melody", calcada no pop convencional dançante.
De resto, outras "variações" são apenas ideológicas, sem representar diferencial no som produzido.
O "comercial", que mostra mulheres-objetos, o "de raiz", com letras pretensamente contestatórias e o "proibidão", com temáticas mais agressivas.
No fundo, porém, os três são a mesma coisa.
O "funk" não é cultura porque ele fica estático durante muito tempo.
Só muda se for do interesse dos DJs-empresários ou sob a pressão das circunstâncias ou das conveniências.
MC Carol fez uma música intitulada "Delação Premiada" para agradar as esquerdas com uma temática tendenciosa.
Ela faz isso enquanto é emergente e não atinge o sucesso que irá depois colocá-la na Rede Globo, Folha de São Paulo e, quem sabe, até nas revistas Veja e Caras.
Só que isso não vai fazê-la ser cantora de vanguarda, progressista ou coisa parecida, sendo um meio caminho entre as midiáticas Tati Quebra-Barraco e Anitta.
Se um ritmo só muda sua estrutura pelo sabor das conveniências, então ele não é cultura séria.
O "funk" permanece estático, no seu som, e degrada e involui nos valores abordados.
Portanto, não há como atribuir ao "funk" qualquer compromisso de evolução da sociedade.
Não há como definir o "funk" como cultura de verdade.
Ele não modifica a sociedade, rompendo com um compromisso que deveria ser a cultura autêntica.
O dirigente funqueiro, aliás, cometeu outro deslize ao dizer que a juventude pobre não tem o compromisso de herdar a cultura dos antepassados.
Ele deu outro tiro no pé. Acaba defendendo o rompimento cultural dos antepassados pelos jovens.
E, neste caso, nem é transformar ou modificar a cultura dos mais velhos, mas romper com ela.
Além do mais, o dirigente funqueiro tão "senhor" do pensamento esquerdista, faz palestras em eventos da Rede Globo, como um "Sérgio Moro" da música brasileira vindo das comunidades pobres.
Tudo o que se viu do "funk", seja o "funk carioca", o "funk ostentação" e o que vier, não foi cultura: foi tão somente consumismo e valores retrógrados calcados num som de qualidade bem duvidosa.
Se as esquerdas deixarem de lado a complacência paternalista, verá que o "funk", tratando as populações pobres de maneira caricata, não pode ser cultura autêntica.
O "funk" só pode ser definido com uma palavra: marketing. Por sinal, dos mais enganosos.
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