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NÃO HÁ POSSIBILIDADE DE UM PROGRAMA DE ESQUERDA SOB ALIANÇA LULA-ALCKMIN


Sonhador, o cientista político Mathias Alencastro, em entrevista ao programa Giro das 11, do Brasil 247, acredita no "paradoxo" de Lula estabelecer uma aliança com a chamada direita civilizada e mesmo assim manter um programa de governo de esquerda.

Disse o analista:

"Fiquei surpreso quando em plenas férias de janeiro, o PT colocou na mesa dois temas estruturantes e difíceis: o teto de gastos e a reforma trabalhista. Foi um movimento perfeito, porque o PT sinalizou para a esquerda que a política de alianças será feita com base num programa de esquerda para o governo".

Corroborando com o cientista político, Mauro Lopes, apresentador do Giro das 11, escreveu em sua coluna no mesmo portal:

"Isso é inovador e, de fato, surpreendente. Uma política de alianças ampla, com setores do centro, centro-direita e até direita tradicional que terá como pano de fundo um programa de governo que deve ser o mais à esquerda das quatro eleições que levaram Lula e Dilma ao Planalto".

Já o próprio Lula, em entrevista à rádio CBN Vale do Paraíba, de São José dos Campos, disse o seguinte, ao definir a função de vice-presidente como "de grande importância":

"Eu tenho confiança no Alckmin. Fui presidente por oito anos, tive relações com Alckmin e sempre foram relações de respeito, institucionais. Se der certo da gente construir essa aliança, eu tenho certeza que vai ser bom para o Alckmin, vai ser bom para mim, vai ser bom para o Brasil e sobretudo deve ser bom para o povo brasileiro".

"Quando você escolhe uma pessoa para vice, está estabelecendo uma relação de confiança. O vice não é uma pessoa distante, é um cara que tem que estar na sala, na cozinha, tem que estar em todo lugar junto do presidente porque ele faz parte da governança do país".

É bom demais para ser verdade. Mas, observando as coisas de maneira lógica, verá que isso será praticamente impossível.

Tudo parece simples, na teoria e no discurso. E até o colunista Elio Gaspari, da direita moderada, compara Lula a Tancredo Neves de 1985, que recorreu a José Sarney como vice para combater o ultraconservadorismo representado por Paulo Maluf nas eleições indiretas.

Correta a comparação. Mas Lula está mais próximo do João Goulart da fase parlamentarista, cujo primeiro-ministro, entre setembro de 1961 e o meio de 1962, foi o mesmíssimo Tancredo Neves.

Lula sonha demais, promete demais, só faltando prometer a descoberta da origem do universo.

O que Mathias Alencastro se esquece é que os temas "difíceis", o teto de gastos públicos e a reforma trabalhista, só foram acolhidos por Lula depois da contrarreforma feita na Espanha.

Não foi um "fato surpreendente". Lula, antes da decisão do governo espanhol, estava calado quanto à promessa de revogar os principais retrocessos lançados pelo governo Michel Temer.

Nota-se que esses argumentos acima citados são muito vagos, têm um teor de idealização e não têm um caráter técnico, objetivo. É tudo especulação.

Fala-se que Lula, mesmo aliado a direitistas, irá fazer um programa de esquerda "mais ousado" do que o dos dois governos anteriores dele e os dois de Dilma Rousseff.

Grande engano. E Lula enfatizando que quer Geraldo Alckmin governando ao lado dele, na prática como um co-presidente, não mais como um vice.

Mas, como assim? Será que Geraldo Alckmin irá engolir uma agenda esquerdista ousada? Será que ele e o "PSDB histórico" irão engolir medidas contrárias a suas ideias?

Por exemplo. O "PSDB da Constituinte" é conhecido pelo escândalo vexaminoso e abusivo das privatizações, uma série de episódios conhecida como Privataria Tucana.

Será que os "novos amigos de infância" de Lula vão aceitar que ele reverta as privatizações mais recentes, resgate o pré-sal dos estrangeiros e reconstrua com êxito e fôlego reforçado a Petrobras, incluindo a ressurreição da hoje finada BR Distribuidora?

Até agora, a pessoa que não deu declarações precisas a respeito dessa "frente ampla" de Lula foi o próprio Geraldo Alckmin.

Ele deu declarações rápidas, coisas do tipo "achar ótimo" e "ter muita vontade de ser vice de Lula".

Mas não há uma autocrítica a respeito de suas ações políticas nocivas no passado, das quais a destruição dramática da comunidade de Pinheirinho, em São José dos Campos, é uma das realizações mais traumáticas.

É a mesma São José dos Campos da rádio CBN Vale, para a qual Lula concedeu entrevista. Talvez ele esteja se esquecido da tragédia de Pinheirinho, com moradores violentamente expulsos em plena manhã de domingo.

Geraldo Alckmin governará com Lula para castrar o programa de governo dele.

Lula pode não ter o jeito contido de João Goulart, mas em todo caso terá que ceder e será politicamente castrado.

É impossível, pensando de maneira objetiva - não se trata aqui de uma mera opinião, mas de uma constatação sobre os diversos lados que envolvem a situação da aliança - , que o programa de esquerda seja mantido ou ampliado, com tais alianças.

Lula é negociador? É. Vai haver diálogo? Vai. Mas nesse processo todo, alguém tem que ceder.

Boa parte dos aliados de Lula foram mentores (sim, mentores!) do golpe político contra Dilma, ajudaram na interdição eleitoral do próprio petista e, nesse ínterim entre 2016 e 2021, colaboraram na agenda retrógrada implantada por Michel Temer e completada por Jair Bolsonaro.

O que surpreende, negativamente, a respeito de Lula, é que ele deu uma alfinetada na ex-presidenta, na mesma entrevista à CBN Vale:

"Dilma é uma tecnicamente é uma pessoa inatacável. Ela tem uma competência extraordinária. Onde que a companheira Dilma, na minha opinião, erra? É na política. Ela não tem a paciência que a política exige que a gente tenha para conversar. Para ouvir as pessoas dizerem não. Para atender as pessoas, mesmo quando você não gosta do que a pessoa está falando. Você não pode ficar agressivo, precisa atender. Eu sou daqueles políticos que, quando um cara conta uma piada que eu já sei, eu não vou dizer para o cara 'eu já sei essa'. Conta outra vez. Se for necessário rir, eu vou rir".

O fato de Lula parecer conciliador não garante que ele possa acariciar os rostos dos direitistas com quem busca se aliar e, depois, fazer um governo "mais esquerdista que os anteriores".

A lógica dos fatos mostra imprevistos, impasses, conflitos e divergências das quais haverá dificuldade em contornar.

É muito fácil Lula se dispor a ouvir pessoas dizerem não. Mas vai haver um momento em que ele terá que acatar o "não" ao seu programa de governo, ou então o "não" de um golpe futuro que não será um ressentido Jair Bolsonaro que irá dar, mas um certo "titio lá do Norte"...

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