A preocupante positividade tóxica no Brasil faz com que os brasileiros médios estejam no mais baixo nível de conscientização e vigilância da História recente do nosso país. Nem mesmo no auge da ditadura militar houve tanto conformismo, credulidade e indisposição para o questionamento. Chega-se mesmo a aceitar o golpe dos "cursos 100% gratuitos", uma aberrante farsa que em nada contribui para o verdadeiro aprendizado.
Falando em aprendizado, a mais recente traição de Lula às causas progressistas é a aliança com o magnata Jorge Paulo Lemann, que fornece a cervejinha que é uma espécie de mamadeira para adulto (eu, pessoalmente, detesto cerveja), para um projeto de parceria entre o Ministério da Educação, o Ministério das Comunicações e a ONG Mega Edu, financiada pelo empresário. Não nos esqueçamos que Lemann é um dos super-ricos que detém poder e privilégio abusivos no Brasil.
Em tese, o projeto tende a investir em conectividade na Internet nas escolas públicas, com recursos iniciais de R$ 6,6 milhões e avaliação de recursos de R$ 3,1 milhões a serem aplicados posteriormente. Embora seja destinado às escolas públicas, nota-se que é um projeto com a mesma perspectiva social do ensino privado.
Mas também não há muita diferença entre o ensino público e privado quando nos últimos anos se prevaleceu uma mentalidade neoliberal por conta da multiplicação de instituições privadas de ensino, nos tempos dos governos de Fernando Henrique Cardoso. A partir daí, o ensino tornou-se "correto", em termos pedagógicos, mas com o tempo o pensamento crítico, ferramenta das escolas e universidades públicas para transformar a realidade brasileira de maneira profunda, foi deixado em último plano.
Lula critica os neoliberais, no discurso, como se observou na festejada (no Brasil) abertura da Assembleia da ONU dias atrás. Só que Lula atua como um pelego e estabeleceu um projeto de "trabalho decente" com o presidente dos EUA, Joe Biden, um dos mentores estrangeiros do golpe político de 2016 e chefe da maior nação neoliberal do planeta.
É certo que hoje os lulistas tentam manobrar as narrativas conforme suas conveniências, abrindo mão até mesmo de muitas de suas ideias e abordagens que marcaram a mídia esquerdista há quase 15 anos. Hoje "neoliberalismo" é apenas um eufemismo para uma parcela radical da direita político-econômica, mas se até Paulo Guedes está elogiando o governo Lula, e ninguém considera o presidente brasileiro um pelego, então não se sabe que realidade é esta que dizem defender.
O Movimento dos Trabalhadores Sem-Terra (MST) é que começa a manifestar o ceticismo, pois o governo Lula demonstra muita frouxidão em suas medidas de caráter eminentemente progressista. O presidente cometeu erros graves, como demitir a ministra do Esporte, Ana Moser - que tinha uma visão social para o setor - , e os recentes projetos "sociais" que realiza são em parceria com representantes da plutocracia.
Lula confirma, com isso, o seu ilusionismo político, pois apenas traz progressos moderados para a população. Diferente do primeiro mandato, cujo progressismo sinalizava levemente ao cumprimento de promessas que João Goulart não pode realizar há 60 anos, o governo Lula 3.0 mais parece um mix do governo José Sarney com o de FHC, significando um projeto neoliberal com leves inclinações para o bem-estar social.
Ver que o setor privado irá intervir na educação pública, embora pareça "democraticamente inofensivo", tende a contribuir para a domesticação dos estudantes pobres. Se o aniquilamento do pensamento crítico, através de diversas manobras que vão da Educação ao culturalismo midiático, já acontece no seio da classe média universitária, apagando de vez o ímpeto crítico que se viu nos anos 1960, imagine então envolvendo a escola pública, com muitos alunos pobres atuando como carneirinhos politicamente corretos.
Ver o neoliberalismo atuando a serviço de Lula não significa que os neoliberais tenham se rendido ao "grande líder do Sul Global". Pelo contrário, é Lula, que teve a coragem de abrir mão de muitos princípios progressistas para atender ao Centrão, que se rende aos neoliberais e atua como um grande pelego político, neste mandato que já é considerado o mais fraco e o pior dos três.
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