
ANTES RECONHECIDA COMO SÉRIO PROBLEMA HABITACIONAL, A FAVELA (NA FOTO, A ROCINHA NO RIO DE JANEIRO) TORNOU-SE OBJETO DA GLAMOURIZAÇÃO DA POBREZA FEITA PELAS ELITES INTELECTUAIS BRASILEIRAS.
A ideia, desagradável para muitos, de que o Brasil não tem condições para se tornar um país desenvolvido está na deterioração sociocultural que atingiu o Brasil a partir de 1964. O próprio fato de muitos brasileiros se sentirem mal acostumados com essa deterioração de valores não significa que possamos entrar no clube de países prósperos diante dessa resignação compartilhada por milhares de pessoas.
Não existe essa tese de o Brasil primeiro chegar ao Primeiro Mundo e depois “arrumar a casa”, como também se tornou inútil gourmetizar a decadência cultural sob a desculpa de “combater o preconceito”. Botar a sujeira debaixo do tapete não limpa o ambiente.
Nosso país discrimina o senso crítico, abrindo caminho para os “novos normais” que acumulamos, precarizando nosso cotidiano na medida em que nos resignamos com retrocessos a cada ano. É tanta resignação que aquilo que parecia pior há 60 anos hoje é fonte de “felicidade” para muita gente boa.
A bregalização musical, por exemplo, que sempre simbolizou a decadência da cultura musical brasileira, virou alvo de pretensos surtos nostálgicos. No reboque desse falso saudosismo, tendências popularescas mais recentes, como o “funk” e a versão de Chitãozinho & Xororó para “Evidências” são vendidas de forma tendenciosa para simbolizar a juventude pseudo-cool do Brasil.
Da bregalização musical à precarização do trabalho, passando pelo obscurantismo da “fé espírita” e o charlatanismo assediador dos “médiuns” e a ideologia do “orgulho de ser pobre”, o país passou por inúmeros retrocessos que se tornaram naturalizados só porque as pessoas passaram a aceitar tudo numa boa. E criou-se uma perigosa tradição de uma elite que impõe limitações e prejuízos “suportáveis” para a população, como se criar dificuldades fosse a coisa mais natural da vida. É como se jogasse pimenta nos olhos das pessoas apenas com água junto para doer menos na visão.
O Brasil tornou-se conservador depois de tentativas de progresso sociocultural entre 1958 e 1964, 1984 e 1989 e 1999. Mesmo nos dois primeiros mandatos de Lula houve a sabotagem do culturalismo brega-popularesco e seu constrangedor “combate ao preconceito”, que desmobilizou as classes populares “sequestradas” pelo entretenimento “popular demais” e abriu caminho para o golpe de 2016.
Isso fez o Brasil decair ainda mais, pois o culturalismo do “combate ao preconceito” que, entre outras coisas, glamourizava a pobreza (principalmente exaltando as favelas, não mais como um problema habitacional, mas como supostas arquiteturas pós-modernas), legitimou valores próprios da ditadura militar, mesmo numa falsa resignificação de esquerda.
Daí que, com tantos atrasos neste sentido, o nosso país perdeu as condições de chegar ao Primeiro Mundo, e não será a pressa de um Lula sonhador que irá resolver os problemas. Até porque Lula não teve coragem de reverter os retrocessos de Michel Temer, mantendo-os quase inteiros, tal como os valores culturais dos tempos da ditadura militar. Desenvolvimentismo não combina com viralatismo.
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