Depois do fenômeno dos blogues, há cerca de dez anos, agora surge o fenômeno dos vlogues, através do uso do canal do YouTube, em que determinado indivíduo ou grupo de pessoas produzem algo para seu canal de vídeos que dura geralmente uns breves minutos.
Num país com pouco hábito de leitura e um mercado de livros praticamente restrito à água-com-açúcar do tripé "ficção, humor e religião", do qual pessoas com alergia para aprimorar seus conhecimentos - dizem que "inteligência" é o "capim dos burros", os mais ignorantes pensam que é fácil ser inteligente ficando de braços cruzados e sem precisar raciocinar - os youtubers são um caso a pensar.
Evidentemente é um meio que mostra pessoas competentes. Não tive ainda um tempo hábil para verificar o que dizem os vlogueiros, mas observa-se que, de fato, a maior estrela do fenômeno, Kéfera Buchmann - a supergracinha linda que eu pude ver quando ela apresentou um programa na atual rede MTV - tem um mérito indiscutível.
Kéfera, mesmo dentro do contexto comportamento, que normalmente costuma ser inócuo e pouco além dos temas chavões, procura se sobressair. Ela é como a Mônica Iozzi no Vídeo Show, no sentido de que procura estender a mão aos jovens para tirá-los do fundo do poço da mesmice e da imbecilização cultural.
Há outros exemplos, dos quais sou pouco especializado. Há o "loko" Christian Figueiredo (não é meu parente), há as vlogueiras Jout Jout e Isabela Freitas. Há o humor do Porta dos Fundos - que revelou os talentosos e conhecidíssimos Fábio Porchat e Gregório Duvivier - e o veterano PC Siqueira do vlogue Maspoxavida.
É saudável ver essas pessoas se movimentando assim, e em muitos casos eles dão oxigênio novo ao humor juvenil. Conseguem dialogar com os jovens de uma maneira que um Luciano Huck, o "rei da visibilidade" e cujo maior triunfo foi "empurrar" a gíria "balada" até para fãs de grunge e para os pais de família mais caretas, não consegue, até porque o apresentador não é lá um primor de simpatia e carisma.
Claro que ninguém vai ficar preso nas "lokuras" de um Christian Figueiredo. Os Youtubers são um fenômeno interessante, e é válido que eles também lancem livros nos quais contam suas experiências de vida. O problema é quando as pessoas começam a ficar presas nesse universo e o fenômeno passa a se banalizar de vez.
Nada contra os youtubers, o sucesso deles é um fenômeno interessante, mas a vida pede para que as pessoas vejam um vlogue hilário, mas entre um Christian Figueiredo e outro, que leiam um Millôr Fernandes, humorista mais experiente, e também leiam História, saibam melhor sobre Política, Sociologia e Antropologia.
Com toda certeza, os pioneiros e os mais destacados têm um valor indiscutível. O sucesso de Kéfera pode ser excepcional, mas é devidamente justificado pelo talento e pelo estilo da gata. Christian é um adolescente, e seu humor talvez soasse estranho se fosse lançado por um veterano querendo "surfar" na onda dos vlogues mais hilários.
Aliás, esse é o problema. Isso acaba criando uma "mina de ouro" e a banalização do fenômeno vlogue pode fazer com que qualquer oportunista que ache que pode "filosofar" sobre espinha na cara e fazer vídeos com edições hilárias de imagem mas sem conteúdo relevante pense que pode fazer sucesso no YouTube.
Prevenida, Kéfera até usou uma música do ícone popularesco Anitta - ela teve que, como alguém produzindo antídoto a partir do veneno que quer combater - para criticar a onda de vlogueiras que se preocupam demais com maquiagens e tentam abordar um simples batom como se fosse um drama existencial.
E aí, mesmo com o fenômeno acessível dos Youtubers, uma questão vem à tona. Talento não é para qualquer um. Há apenas um grupo seleto de pessoas que têm o que dizer, mas uma grande porção de pessoas que só querem pegar carona no modismo que faz mais sucesso.
É como se vê no mercado popularesco, em que uma inflação de subcelebridades torna-se "modelo de vida" num cenário de mediocrização, que impulsiona gente comum a ficar fazendo selfies e postando fotos narcisistas no Instagram. O brega-popularesco não tem a palavra "talento" em seu vocabulário.
Precisamos de novas mentes, e reavaliar a nossa cultura. A crise cultural existe, e os vlogueiros são apenas uma tentativa, à maneira deles, de minimizar os efeitos mais dramáticos desse quadro. A ascensão deles pode parecer que a cultura está bem, mas eles na verdade são como flores no deserto que podem sinalizar uma renovação da cultura jovem.
Portanto, para quem tem talento, como Kéfera Buchmann - que imaginamos ser no futuro uma "tia experiente" a dar lições para gerações futuras - e a turma do Porta dos Fundos, desejamos sucesso e que eles possam representar alguma luz no túnel tenebroso da mediocridade. E mostrar coisas interessantes para os jovens que ainda estão pensando para que servem os livros para colorir.
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