Pular para o conteúdo principal

ANTROPÓLOGA LANÇA LIVRO SOBRE MR. CATRA


A intelectualidade "bacaninha" não desiste e a máquina marqueteira do "funk carioca" (ou de seu genérico paulista "funk ostentação") não para de funcionar, e a antologia de livros "etnográficos" do brega-popularesco agora aposta em mais um nome a ser salvo do ostracismo pela "etnografia de resultados" da intelligentzia mais legal do país.

Lembrando o que tentou ser feito com o É O Tchan, através do livro Que Tchan é Esse?, de Mônica Neves Leme, agora o foco é o funqueiro Mr. Catra - que o "bom etnocentrismo" de Pedro Alexandre Sanches sonharia ver equiparado a Itamar Assumpção - e a "bacaninha" em questão é a antropóloga Mylene Mizhari e seu "salto ousado" para o "estudo do consumo".

Mr. Catra, sabemos, sempre recebeu o apoio dos barões da grande mídia e tem a solidariedade de Lobão mesmo nos seus mais histéricos surtos direitistas, já que o "grande lobo" prefere o "funk" ao Rock Brasil (com a ressalva do Ultraje a Rigor, banda de seu parceiro de pregações ideológicas, Roger Rocha Moreira). Catra seria a última pessoa a ser considerada modernista e progressista.

O trabalho é resultado do Programa de Pós‐Graduação  em  Sociologia  e  Antropologia do Instituto de Filosofia e Ciências Sociais  da Universidade Federal do Rio de Janeiro – PPGSA‐ IFCS‐UFRJ, e foi financiado pela CAPES, muito provavelmente como intermediadora de recursos da Fundação Ford (que sinalizou patrocinar o "funk carioca"), entidade ligada à CIA, órgão de informação dos EUA.

O livro, para manter a praxe da onda de pretensiosismo pseudo-ativista e pseudo-etnográfico que cerca o "funk carioca", foi lançado na Livraria da Travessa, em Ipanema, o que mostra que a "galera zona sul" anda feliz no seu etnocentrismo ao mesmo tempo politicamente correto e trash que a faz apreciar a imbecilização social do "funk".

A título de questionamento e não de apreciação condescendente, vale aqui reproduzir o release do trabalho, uma grande "viagem" intelectualoide dessas que geraram até piada, como o antropólogo Albenzio Peixoto interpretado pelo humorista Bruno Mazzeo no seriado Cilada. Reproduzo todo o texto, só para mostrar as "pérolas" que são os discursos "etnográficos" dessa patota toda:

MR. CATRA QUERENDO AGRADAR A NOSSA INTELLIGENTZIA.

"PESQUISADORA DO GRUPO DE ESTUDOS DO CONSUMO LANÇA LIVRO SOBRE A ESTÉTICA FUNK CARIOCA

A figura excêntrica e polêmica de Mr. Catra – autor de sucessos como “Mama”, “Adultério”, “Soltinha” que descem o morro e abalam festas da Zona sul – é o ponto de partida para Mylene Mizrahi explorar o universo do funk carioca. Em A estética do funk – Criação e conectividade em Mr. Catra, a autora mergulha sem preconceitos no mundo do funk; derrubando estereótipos, seu estilo inovador de pesquisa aposta na criatividade funk como produto do encontro, destacando o potencial de conectividade dessa cultura.

O olhar atento de pesquisadora de Mylene segue passo a passo o dia a dia de Catra, suas várias mulheres e filhos. Como num documentário, a autora frequenta as vans que levam aos shows do cantor e os bastidores, acompanha suas mulheres em cabeleireiros, circula pelos espaços íntimos de suas famílias, e pelo espaço público da comunidade. E relata tudo neste livro, com a desenvoltura teórica e maturidade de antropóloga.

O resultado é uma reveladora etnobiografia, que traz à luz a conectividade entre a favela e o asfalto através de um cantor que circula por entre os dois mundos; um artista que é produto da periferia, e que usa o escracho, o erotismo hilário e o deboche como armas de comunicação para divertir todas as classes. Escolhendo um caminho à margem da vertente dominante de estudos sobre o funk, que os circunscrevem à periferia, Mylene Mizhari dá um salto ousado (e bem-sucedido) nesta obra, revelando não só novos aspectos do seu objeto de pesquisa mas, principalmente, novos modos de se pensar as possibilidades dos estudos antropológicos contemporâneos."

Francamente. "A autora mergulha sem preconceitos"? "Mylene Mishari dá um salto ousado", o trabalho foi "derrubando estereótipos"? Sinceramente, ideias ridículas que apenas apelam para que aceitemos as coisas sem verificar.

Esse trabalho, assim como tantos outros feitos para defender o "funk" e outras "expressões" da "admirável cultura de massa" brega-popularesca, não é mais do que uma estratégia de marketing travestida de (mais um) trabalho acadêmico. E mostra o quanto a intelectualidade é acionada sempre que algum ídolo popularesco sem ter mais o que fazer é ameaçado a cair no ostracismo.

O trabalho nada tem de questionativo, é meramente descritivo e investe nos mesmos clichês da narrativa intelectualoide. Apropriações de técnicas discursivas como o Novo Jornalismo (jornalismo narrado como se fosse romance) e História das Mentalidades (história narrada priorizando personagens mais modestos) e a mesma retórica pretensamente modernista.

No fundo, esse trabalho nada quer dizer, como tantos outros por aí. Nem o público funqueiro acabará entendendo isso, porque esse trabalho "sem preconceitos" é, na verdade, bastante tendencioso, porque o que Mylene escreve não é a realidade do "funk", mas um "recorte" que o etnocentrismo paternalista e positivista dos intelectuais brasileiros faz do "funk".

Portanto, é mais um trabalho de julgamento de valor. O intelectual vê no "funk" coisas que os funqueiros não vivem. E ocultam todo um sistema de dominações de ordem política, econômica e midiática que faz o "funk" glamourizar a pobreza, a ignorância e a imoralidade, representando não uma ruptura de estereótipos, mas a reafirmação de uma visão estereotipada do povo das periferias.

Trabalhos como esse livro deixam George Soros e seus amigos bastante tranquilos. Eles dormem serenos o seu sono elitista, vendo que o povo dos países emergentes é estimulado pelos intelectuais locais a, em vez de irem para as ruas lutarem por qualidade de vida, esquecerem seus problemas dançando o "funk", o "tchan", o "kuduro", o tecnobrega e outras bobagens.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

LULA GLOBALIZOU A POLARIZAÇÃO

LULA SE CONSIDERA O "DONO" DA DEMOCRACIA. Não é segredo algum, aqui neste blogue, que o terceiro mandato de Lula está mais para propaganda do que para gestão. Um mandato medíocre, que tenta parecer grandioso por fora, através de simulacros que são factoides governamentais, como os tais “recordes históricos” que, de tão fáceis, imediatos e fantásticos demais para um país que estava em ruínas, soam ótimos demais para serem verdades. Lula só empolga a bolha de seus seguidores, o Clube de Assinantes VIP do Lulismo, que quer monopolizar as narrativas nas redes sociais. E fazendo da política externa seu palco e seu palanque, Lula aposta na democracia de um homem só e na soberania de si mesmo, para o delírio da burguesia ilustrada que se tornou a sua base de apoio. Só mesmo sendo um burguês enrustido, mesmo aquele que capricha no seu fingimento de "pobreza", para aplaudir diante de Lula bancando o "dono" da democracia. Lula participou da Assembleia Geral da ONU e...

INFANTILIZAÇÃO E ADULTIZAÇÃO

A sociedade brasileira vive uma situação estranha, sob todos os aspectos. Temos uma elite infantilizada, com pessoas de 18 a 25 anos mostrando um forte semblante infantil, diferente do que eu via há cerca de 45 anos, quando via pessoas de 22 anos que me pareciam “plenamente adultas”. É um cenário em que a infantilizada sociedade woke brasileira, que chega a definir os inócuos e tolos sucessos “Ilariê” e “Xibom Bom Bom” cono canções de protesto e define como “Bob Dylan da Central” o Odair José, na verdade o “Pat Boone dos Jardins”, apostar num idoso doente de 80 anos para conduzir o futuro do Brasil. A denúncia recente do influenciador e humorista Felca sobre a adultização de menores do ídolo do brega-funk Hytalo Santos, que foi preso enquanto planejava fugir do Brasil, é apenas uma pequena parte de um contexto muito complexo de um colapso etário muito grande. Isso inclui até mesmo uma geração de empresários e profissionais liberais que, cerca de duas décadas atrás, viraram os queridões...

RELIGIÃO DO AMOR?

Vejam como são as coisas, para uma sociedade que acha que os males da religião se concentram no neopentecostalismo. Um crime ocorrido num “centro espírita” de São Luís, no Maranhão, mostra o quanto o rótulo de “kardecismo” esconde um lodo que faz da dita “religião do amor” um verdadeiro umbral. No “centro espírita” Yasmin, a neta da diretora da casa, juntamente com seu namorado, foram assaltar a instituição. Os tios da jovem reagiram e, no tiroteio, o jovem casal e um dos tios morreram. Houve outros casos ao longo dos últimos anos. Na Taquara, no Rio de Janeiro, um suposto “médium” do Lar Frei Luiz foi misteriosamente assassinado. O “médium” era conhecido por fraudes de materialização, se passando por um suposto médico usando fantasias árabes de Carnaval, mas esse incidente não tem relação com o crime, ocorrido há mais de dez anos. Tivemos também um suposto latrocínio que tirou a vida de um dirigente de um “centro espírita” do Barreto, em Niterói, Estado do Rio de Janeiro. Houve incênd...

LUÍS INÁCIO SUPERSTAR

Não podemos estragar a brincadeira. Imagine, nós, submetidos aos fatos concretos e respirando o ar nem sempre agradável da realidade, termos que desmascarar o mundo de faz-de-conta do lulismo. A burguesia ilustrada fingindo ser pobre e Lula pelego fingindo governar pelos miseráveis. Nas redes sociais, o que vale é a fantasia, o mundo paralelo, o reino encantado do agradável, que ganha status de “verdade” se obtém lacração na Internet e reconhecimento pela mídia patronal. Lula tornou-se o queridinho das esquerdas festivas, atualmente denominadas woke , e de uma burguesia flexível em busca de tudo que lhe pareça “legal”, daí o rótulo “tudo de bom”. Mas o petista é visto com desconfiança pelas classes populares que, descontando os “pobres de novela”, não se sentem beneficiadas por um governo que dá pouco aos pobres, sem tirar muito dos ricos. A aparente “alta popularidade” de Lula só empolga a “boa” sociedade que domina as narrativas nas redes sociais. Lula só garante apoio a quem já está...

DENÚNCIA GRAVE: "MÉDIUM" TIDO COMO "SÍMBOLO DE AMOR E FRATERNIDADE" COLABOROU COM A DITADURA

O famoso "médium" que é conhecido como "símbolo maior de amor e fraternidade", que "viveu apenas pela dedicação ao próximo" e era tido como "lápis de Deus" foi um colaborador perigoso da ditadura militar. Não vou dizer o nome desse sujeito, para não trazer más energias. Mas ele era de Minas Gerais e foi conhecido por usar perucas e ternos cafonas, óculos escuros e por defender ideias ultraconservadoras calcadas no princípio de que "devemos aceitar os infortúnios e agradecer a Deus pela desgraça obtida". O pretexto era que, aceitando o sofrimento "sem queixumes", se obterá as prometidas "bênçãos divinas". Sádico, o "bondoso homem" - que muitos chegaram a enfiar a palavra "Amor" como um suposto sobrenome - dizia que as "bênçãos futuras" eram mais dificuldades, principalmente servidão, disciplina e adversidades cruéis. Fui espírita - isto é, nos padrões em que essa opção religi...

CRISE DA MPB ATINGE NÍVEIS CATASTRÓFICOS

INFELIZMENTE, O MESTRE MILTON NASCIMENTO, ALÉM DE SOFRER DE MAL DE PARKINSON, FOI DIAGNOSTICADO COM DEMÊNCIA. A MPB ainda respira, mas ela já carece de uma renovação real e com visibilidade. Novos artistas continuam surgindo, mas poucos conseguem ser artisticamente relevantes e a grande maioria ainda traduz clichês pós-tropicalistas para o contexto brega-identitário dos últimos tempos. Recentemente, o cantor Milton Nascimento, um dos maiores cantores e compositores da música brasileira e respeitadíssimo no exterior por conta de sua carreira íntegra, com influências que vão da Bossa Nova ao rock progressivo, foi diagnosticado com um tipo de demência, a demência de corpos de Lewy. Eu uma entrevista, o filho Augusto lamentou a rotina que passou a viver nos últimos anos , quando também foi diagnosticado o Mal de Parkinson, outra doença que atinge o cantor. Numa triste e lamentável curiosidade, Milton sofre tanto a doença do ator canadense Michael J. Fox, da franquia De Volta para o Futuro ...

NITERÓI: CONDOMÍNIO SEM COMÉRCIO DIGNO NO ANTIGO RIO DECOR É UMA RAJADA DE METRALHADORA NO PÉ

TERRENO VAZIO APÓS DEMOLIÇÃO DO PRÉDIO DO ANTIGO RIO DECOR, NA AVENIDA FELICIANO SODRÉ, EM NITERÓI. Um dos antigos prédios de Niterói não existe mais. Por um gigantesco erro estratégico, o Rio Decor, durante a pandemia, abandonou o grande prédio da Av. Feliciano Sodré, que no passado foi das Lojas Maveroy e que era um grande espaço para um shopping center . O Rio Decor se mudou para a Av. Jansen de Mello e perdeu boa parte da demanda, sobretudo São Gonçalo, ficando "escondido" na esquina da Rua São Lourenço. Com isso, o prédio, antes imponente, virou uma espécie de Cracolândia niteroiense. Nos últimos tempos houve incêndio e homicídio, além do grande perigo que representava principalmente para quem ficava num ponto de ônibus em frente ao local. Depois de tais incidentes, a estrutura do prédio foi danificada e a Prefeitura de Niterói preferiu demolir. Hoje é um terreno vazio, do qual há intenções de construção de um condomínio, o que não é má ideia, porque dará movimento ao lo...

A HIPOCRISIA DA ELITE DO BOM ATRASO

Quanta falsidade. Se levarmos em conta sobre o que se diz e o que se faz crer, o Brasil é um dos maiores países socialistas do mundo, mas que faz parte do Primeiro Mundo e tem uma das populações mais pobres do planeta, mas que tem dinheiro de sobra para viajar para Bariloche e Cancún como quem vai para a casa da titia e compra um carro para cada membro da família, além de criar, no mínimo, três cachorros. É uma equação maluca essa, daí não ser difícil notar essa falsidade que existe aos montes nas redes sociais. É tanto pobre cheio da grana que a gente desconfia, e tanto “neoliberal de esquerda” que tudo o que acaba acontecendo são as tretas que acontecem envolvendo o “esquerdismo de resultados” e a extrema-direita. A elite do bom atraso, aliás, se compôs com a volta dos pseudo-esquerdistas, discípulos da Era FHC que fingiram serem “de esquerda” nos tempos do Orkut, a se somar aos esquerdistas domesticados e economicamente remediados. Juntamente com a burguesia ilustrada e a pequena bu...

NEGACIONISTA FACTUAL E SUAS RAÍZES SOCIAIS

O NEGACIONISTA FACTUAL REPRESENTA O FILHO DA SOCIALITE DESCOLADA COM O CENSOR AUSTERO, NOS ANOS DE CHUMBO. O negacionista factual é o filho do casamento do desbunde com a censura e o protótipo ilustrativo desse “isentão” dos tempos atuais pode explicar as posturas desse cidadão ao mesmo tempo amante do hedonismo desenfreado e hostil ao pensamento crítico. O sujeito que simboliza o negacionista factual é um homem de cerca de 50 anos, nascido de uma mãe que havia sido, na época, uma ex-modelo e socialite que eventualmente se divertia, durante as viagens profissionais, nas festas descoladas do desbunde. Já o seu pai, uns dez anos mais velho que sua mãe, havia sido, na época da infância do garoto, um funcionário da Censura Federal, um homem sisudo com manias de ser cumpridor de deveres, com personalidade conservadora e moralista. O casal se divorciou com o menino tendo apenas oito anos de idade. Mas isso não impediu a coexistência da formação dúbia do negacionista factual, que assimilou as...

A IMPORTÂNCIA DE SABERMOS A LINHA DO TEMPO DO GOLPE DE 2016

Hoje o golpismo político que escandalizou o Brasil em 2016 anda muito subestimado. O legado do golpe está erroneamente atribuído exclusivamente a Jair Bolsonaro, quando sabemos que este, por mais nefasto e nocivo que seja, foi apenas um operador desse período, hoje ofuscado pelos episódios da reunião do plano de golpe em 2022 e a revolta de Oito de Janeiro em 2023. Mas há quem espalhe na Internet que Jair Bolsonaro, entre nove e trinta anos de idade no período ditatorial, criou o golpe de 1964 (!). De repente os lulistas trocaram a narrativa. Falam do golpe de 2016 como um fato nefasto, já que atingiu uma presidenta do PT. Mas falam de forma secundária e superficial. As negociações da direita moderada com Lula são a senha dessa postura bastante estranha que as esquerdas médias passaram a ter nos últimos quatro anos. A memória curta é um fenômeno muito comum no Brasil, pois ela corresponde ao esquecimento tendencioso dos erros passados, quando parte dos algozes ou pilantras do passado r...