Pular para o conteúdo principal

INTELECTUAIS "BACANAS" SÓ VIRAM UM LADO DO ESPETÁCULO

PLATEIA DURANTE APRESENTAÇÃO DE SÉRGIO RICARDO COM A MÚSICA "BETO BOM DE BOLA", NO III FESTIVAL DE MPB, EM 1967.

A intelectualidade "bacana" do Brasil, tomada de suas surpresas desagradáveis - o fim da rádio brega-popularesca Beat 98 FM e o direitismo assumido de Zezé di Camargo - , já não parece tão prestigiada diante de tantas contradições que havia cometido.

Confiantes na formação acadêmica, já que muitos deles têm doutorado, e com a visibilidade fácil que, até pouco tempo atrás, lhes fazia encher plateias nas suas palestras, até pouco tempo atrás eles monopolizavam os espaços abertos e ditavam o que deveria ser a visão ideal da cultura brasileira.

Com um discurso completamente mirabolante, eles pregavam a bregalização do país e a subordinação da cultura popular aos mecanismos da chamada indústria cultural. Seu discurso apresentava contradições, argumentos duvidosos e falhos, uma abordagem persuasiva que não raro ia contra a objetividade acadêmica ou informativa que tanto pregavam.

Um dos aspectos bastante falhos de sua abordagem é juntar alhos com bugalhos entre a MPB modernista e os bregas. Um festejado Pedro Alexandre Sanches sonhava ver a reunião dos dois extremos, a modernista MPB pós-tropicalista (que incluía alguns nomes de raiz e outros derivados, como a cena da Lira Paulistana) ao lado de bregas setentistas e funqueiros.

Como se unissem num mesmo balaio adeptos de Che Guevara e seguidores do ultrarreacionário Joseph McCarthy num impensável marx-carthismo (que virou moda no Brasil de 2005-2010, o do "esquerdista" com QI de direita), os intelectuais "bacaninhas", eles mesmos originários dos setores acadêmicos do PSDB, tentam, até hoje, um vínculo forçado com o esquerdismo.

E eles, quando juntam esses dois extremos, se servem de um único pretexto que têm em mãos para justificar a defesa desesperada que fazem à bregalização do país, em todos os seus aspectos: a única, e superficial coincidência da vaia que receberam do público.

"VAIA" COMO ATESTADO DE "QUALIDADE"

A intelectualidade estava, simbolicamente, no palco, mas, em vez de observar que cantores e músicos comandavam o espetáculo, observava tão somente a plateia. O único com que os intelectuais ouviam eram os de urros, assobios, xingações e desaforos dos descontentes.

Isso permitiu que eles colocassem no mesmo balaio "malditos" da MPB e bregas, os primeiros com um compromisso artístico bastante ousado, os segundos sem qualquer compromisso sério com a arte. Os primeiros, a antecipar futuras tendências musicais, os segundos, os últimos a saber dos modismos que já passaram.

Os bregas nunca poderiam ser vanguarda porque, sendo os últimos a saber, fazem o tipo daqueles que chegam à festa depois que ela acabou. E nós é que temos que prolongar a festa para permitir a entrada desses penetras de última hora e transformá-los em anfitriões de um espetáculo que não era deles e do qual não foram convidados e que eles, no começo, se recusavam radicalmente a participar.

Sim, porque, antes da MPB ser acusada de rejeitar o brega, o brega, na verdade, é que rejeitava a MPB. O brega não era um artista musical, mas um autista musical, isolado na dele, indiferente às raízes brasileiras, perdido em referências de fora, em desejos que não eram seus, na obsessão de querer ser tudo, menos ele mesmo.

O brega só queria saber de modismos estrangeiros, tardiamente introduzidos no Brasil, e mesmo assim quando até aqui eles soavam datados. Os primeiros bregas fizeram serestas dez anos depois delas terem saído de moda. A segunda geração brega, com o mesmo atraso de uma década, assumiu elementos que eram melhor expressos pela pré-Jovem Guarda e pelo sambalanço de 1958-1962.

Que vanguarda se esperava, então, dos bregas? Nenhuma. Em princípio, a MPB vanguardista de São Paulo começou a assimilar o brega apenas como um recurso de humor, seguindo a linha paródica de Frank Zappa, que parodiava o doo-wop e usava elementos nonsense na sua música.

No entanto, com a moda, que aqui chegou unificada, entre a cultura trash e a ideologia politicamente correta, a apreciação humorística do brega se converteu numa choradeira e num apologismo "cabeça" que levou a bregalização a sério demais, o que criou não uma ruptura do preconceito ao brega, mas num preconceito absurdo contra a MPB.

Tudo porque os bregas e os "malditos" da MPB eram apenas vaiados. Usou-se algo tão genérico que não podia servir de diferencial, que era um público vaiando. E aí a intelectualidade foi promover o chamado "mau gosto popular" como "bandeira libertária" e se deram mal, porque romper o preconceito passou a ter o sentido preconceituoso de aceitar tudo sem critérios.

Por isso, os intelectuais tão festejados, tão influentes e tão prestigiados, com sua coleção de títulos acadêmicos e umas poucas façanhas profissionais, não conseguiram nos convencer. Eles só viram o espetáculo pelo outro lado, o da crítica e do público que odiava os "sucessos do momento". Mas eles se esqueceram de verificar o que estava dentro do palco.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

RELIGIÃO DO AMOR?

Vejam como são as coisas, para uma sociedade que acha que os males da religião se concentram no neopentecostalismo. Um crime ocorrido num “centro espírita” de São Luís, no Maranhão, mostra o quanto o rótulo de “kardecismo” esconde um lodo que faz da dita “religião do amor” um verdadeiro umbral. No “centro espírita” Yasmin, a neta da diretora da casa, juntamente com seu namorado, foram assaltar a instituição. Os tios da jovem reagiram e, no tiroteio, o jovem casal e um dos tios morreram. Houve outros casos ao longo dos últimos anos. Na Taquara, no Rio de Janeiro, um suposto “médium” do Lar Frei Luiz foi misteriosamente assassinado. O “médium” era conhecido por fraudes de materialização, se passando por um suposto médico usando fantasias árabes de Carnaval, mas esse incidente não tem relação com o crime, ocorrido há mais de dez anos. Tivemos também um suposto latrocínio que tirou a vida de um dirigente de um “centro espírita” do Barreto, em Niterói, Estado do Rio de Janeiro. Houve incênd...

LULA GLOBALIZOU A POLARIZAÇÃO

LULA SE CONSIDERA O "DONO" DA DEMOCRACIA. Não é segredo algum, aqui neste blogue, que o terceiro mandato de Lula está mais para propaganda do que para gestão. Um mandato medíocre, que tenta parecer grandioso por fora, através de simulacros que são factoides governamentais, como os tais “recordes históricos” que, de tão fáceis, imediatos e fantásticos demais para um país que estava em ruínas, soam ótimos demais para serem verdades. Lula só empolga a bolha de seus seguidores, o Clube de Assinantes VIP do Lulismo, que quer monopolizar as narrativas nas redes sociais. E fazendo da política externa seu palco e seu palanque, Lula aposta na democracia de um homem só e na soberania de si mesmo, para o delírio da burguesia ilustrada que se tornou a sua base de apoio. Só mesmo sendo um burguês enrustido, mesmo aquele que capricha no seu fingimento de "pobreza", para aplaudir diante de Lula bancando o "dono" da democracia. Lula participou da Assembleia Geral da ONU e...

BREGALIZAÇÃO CULTURAL E O PERIGO DE FALSOS SURTOS NOSTÁLGICOS

HÁ CRÍTICOS MUSICAIS QUE CONSIDERAM SUCESSOS DA MÚSICA BREGA "CLÁSSICOS" SÓ PORQUE TOCARAM NOS MOMENTOS DA INFÂNCIA, COMO OS PASSEIOS PARA A PRAIA COM A FAMÍLIA. A lembrança nostálgica, para a arte e a cultura, deveria levar em conta os critérios artísticos e a relevância cultural, critérios que não podem envolver uma simples impressão solipsista de um público ouvinte e suas recordações meramente pessoais ou grupais. O comercialismo musical, ultimamente sobre o tratamento gurmê da grande mídia, se aproveita da ingenuidade coletiva para promover surtos nostálgicos que soam postiços. Tantos falsos saudosismos são montados pela mídia e pelo mercado, visando prolongar o sucesso comercial de ídolos veteranos, vide a onda do brega-vintage que tentou reciclar com embalagem de luxo nomes da mediocridade musical como. Michael Sullivan, É O Tchan, Bell Marques e Chitãozinho & Xororó, estes com a música “ Evidências”. O brega-vintage foi uma amostra de como a bregalização cultural -...

O NEGACIONISMO FACTUAL E A 89 FM

Era só o que faltava. Textos que contestam a validade da 89 FM - que celebra 40 anos de existência no dia 02 de dezembro, aniversário de Britney Spears - como “rádio rock” andam sendo boicotados por internautas que, com seu jeito arrogante e boçal, disparam o bordão “Lá vem aquele chato criticar a 89 novamente”. Os negacionistas factuais estão agindo para manter tudo como o “sistema” quer. Sempre existe uma sabotagem quando a hipótese de um governo progressista chega ao poder. Por sorte, Lula andou cedendo mais do que podia e reduziu seu terceiro mandato ao mínimo denominador comum dos projetos sociais que a burguesia lhe autorizou a fazer. Daí não ser preciso apelar para a farsa do “combate ao preconceito” da bregalização cultural que só fez abrir caminho para Jair Bolsonaro. Por isso, a elite do bom atraso investe na atuação “moderadora” do negacionista factual, o “isentão democrático”, para patrulhar as redes sociais e pedir o voicote a páginas que fogem da assepsia jornalística da ...

O ERRO QUE DENISE FRAGA COMETEU, NA BOA-FÉ

A atriz Denise Fraga, mesmo de maneira muito bem intencionada, cometeu um erro ao dar uma entrevista ao jornal O Estado de São Paulo para divulgar o filme Livros Restantes, dirigido por Márcia Paraíso, com estreia prevista para 11 de dezembro. Acreditando soar “moderna” e contemporânea, Denise, na melhor das intenções, cometeu um erro na boa-fé, por conta do uso de uma gíria. “As mulheres estão mais protagonistas das suas vidas. Antes esperavam que aos 60 você estivesse aposentando; hoje estamos indo para a balada com os filhos”. Denise acteditou que a gíria “balada” é uma expressão da geração Z, voltada a juventude contemporânea, o que é um sério equívoco sem saber, Denise cometeu um grave erro de citar uma gíria ligada ao uso de drogas alucinógenas por uma elite empresarial nos agitos noturnos dos anos 1990. A gíria “balada” virou o sinônimo do “vocabulário de poder” descrito pelo jornalista britânico Robert Fisk. Também simboliza a “novilíngua” do livro 1984, de George Orwell, no se...

LULA APROVA SALÁRIO MÍNIMO COM REAJUSTE MIXURUCA

O salário mínimo para 2026 teve um reajuste de menos de 7%, atingindo somente um índice de 6,78%, em relação a este ano. Isso significa que o valor de R$ 1.518, cujo aumento chegou a ser cogitado para R$ 1.631 e, depois, para R$ 1.627, foi acrescido somente de R$ 103, ficando para a quantia de R$ 1.621 para 2026. É um reajuste típico de sindicalistas pelegos, desses que não ameaçam os privilégios dos patrões, trazendo para os trabalhadores apenas uma parte parcial da remuneração reivindicada, garantindo apenas poucos ganhos para a população mais necessitada. A desculpa usada pelo governo Lula para dar um reajuste fajuto para o salário mínimo é que a inflação ficou mais baixa que o esperado e, portanto, só foi preciso um aumento nestes parâmetros, considerado pelos tecnocratas do Governo Federal como “aumento real”. Todavia, esse aumento só vai pesar menos para as classes mais abastadas, sobretudo a chamada burguesia ilustrada, a parte mais festiva e lúdica das classes privilegiadas. O ...

“JORNALISMO DA OTAN” BLINDA CULTURALISMO POPULARESCO DO BRASIL

A bregalização e a precarização de outros valores socioculturais no Brasil estão sendo cobertos por um véu que impede que as investigações e questionamentos se tornem mais conhecidos. A ideologia do “Jornalismo da OTAN” e seu conceito de “culturalismo sem cultura”, no qual o termo “cultura” é um eufemismo para propaganda de manipulação política, faz com que, no Brasil, a mediocridade e a precarização cultural sejam vistas como um processo tão natural quanto o ar que respiramos e que, supostamente, reflete as vivências e sentimentos da população de cada região. A mídia de esquerda mordeu a isca e abriu caminho para o golpismo político de 2016, ao cair na falácia do “combate ao preconceito” da bregalização. A imprensa progressista quase faliu por adotar a mesma agenda cultural da mídia hegemônica, iludida com os sorrisos desavisados da plateia que, feito gado, era teleguiada pelo modismo popularesco da ocasião. A coisa ainda não se resolveu como um todo, apesar da mídia progressista ter ...

FARIA LIMA ESTÁ CASTRANDO O PENSAMENTO E A CULTURA NO BRASIL

Notaram que a cultura brasileira, em diversos aspectos, sucumbiu a um padrão degradante, que domestica o povo e garante poder maior ao empresariado? Expressões culturais de qualidade continuam existindo, mas elas tiveram seus espaços de manifestação reduzidos, colocados quase à margem da chamada opinião pública, tendo menos visibilidade e menos impacto de influência. O Brasil está social e culturalmente degradado, acumulando retrocessos que se transformaram nos “novos normais” que passaram a ser aceitos dentro das zonas de conforto da complacência coletiva. Mesmo com a redemocratização, não recuperamos os parâmetros socioculturais que se desenhavam nos tempos de Juscelino Kubitschek e João Goulart. Ainda mantemos os resíduos dos tempos dos generais Emílio Médici e Ernesto Geisel, e, o que é pior, com vários desses entulhos promovidos a falsos tesouros nostálgicos. E como é que muitos acreditam que o Brasil ainda vai chegar ao Primeiro Mundo com uma precarização sociocultural em níveis ...

JUVENTUDE DESCOLADA MOSTRA UM BRASIL DECADENTE SOB HEDONISMO TÓXICO

FARIA LIMA EM FESTA - JUVENTUDE WOKE  INDO "PRA BALADA" COM A BURGUESIA ILUSTRADA. Enquanto no exterior vemos atores e atrizes ligadas ao universo juvenil ouvindo rock clássico e música folk  e buscando hábito de leitura em livros, no Brasil o hedonismo tóxico é que impera e a juventude woke  parece atuar como um bando de marionetes do empresariado da Faria Lima. Nas conversas que eu ouço, o hedonismo viciado impera. Num dia, é o fanatismo pelo futebol. Noutro, é a adoração a ritmos popularescos, como piseiro, "pagode romântico", "funk" e sofrência. Em seguida, é uma tal de "ir pra balada", "balada LGBT", "balada isso, balada aquilo", usando e abusando desse jargão farialimer . Mais adiante, é falar sobre marcas de cerveja. Noutra, é exaltar aquele intervalo para fumar um cigarro. É esse o Brasil que está pronto para se tornar país desenvolvido? Que geração é essa que vai liderar o futuro da nação? Gente aderindo a um hedonism...

O BRASIL DOS SONHOS DA FARIA LIMA

Pouca gente percebe, mas há um poder paralelo do empresariado da Faria Lima, designado a moldar um sistema de valores a ser assimilado “de forma espontânea” por diversos públicos que, desavisados, tom esses valores provados como se fossem seus. Do “funk” (com seu pseudoativismo brega identitário) ao Espiritismo brasileiro (com o obscurantismo assistencialista dos “médiuns”), da 89 FM à supervalorização de Michael Jackson, do fanatismo gurmê do futebol e da cerveja, do apetite “original” pelas redes sociais, pelo uso da gíria “balada” e dos “dialetos” em portinglês (como “ dog ”, “ body ” e “ bike ”), tudo isso vem das mentes engenhosas das elites empresariais do Itaim Bibi, na Zona Sul paulistana, e de seis parceiros eventuais como o empresariado carnavalesco de Salvador e o coronelismo do Triângulo Mineiro, no caso da religião “espírita”. E temos a supervalorização de uma banda como Guns N'Roses, que não merece a reputação de "rock clássico" que recebe do público brasile...