Pular para o conteúdo principal

DILMA É REELEITA NO CONTEXTO DE UM BRASIL COMPLEXO


Com uma margem apertada de 51% contra 48% do rival, a presidenta Dilma Rousseff ganhou mais quatro anos de mandato e segue no comando do Executivo federal até 2018, chefiando um Brasil extremamente complexo e complicado.

O Brasil sofre um embate entre um projeto de país tecnocrático sonhado pela ditadura militar, adaptado às variações de contexto na sociedade atual, e um projeto social de país interrompido pela crise política do governo João Goulart, há 50 anos.

Há conflitos diversos entre o fisiologismo político, as correntes privatistas, o reformismo, o esquerdismo mais radical, e forças golpistas remanescentes. Não há um maniqueísmo fácil entre o que é moderno e o que é antiquado, num país cuja "cultura de massa" é ultrapassada, mofada, presa a paradigmas vigentes desde 1974 e reciclados a partir dos anos 90.

Este é um país complicado, um país emergente que não tem noção do que é modernidade e progresso social, e cuja juventude ainda é mercada pelo vandalismo das periferias e pelo vandalismo digital, além do reacionarismo midiático e do populismo de mercado cujo maior expoente é o "funk".

Temos tecnocratas que querem comandar os sistemas de ônibus com mão de ferro, a pretexto de "apenas disciplinar o serviço" e impondo pintura padronizada atropelando a lei praticando uma espécie de "mobilidade urbana" cafajeste e demagógica que só faz bonito em palestras sobre transporte e urbanismo, pela retórica arrumadinha, mas fantasiosa, que é sua única qualidade.

Temos outros tecnocratas, os cientistas sociais, respaldados por jornalistas culturais e cineastas documentaristas, que apostam numa cultura popular bregalizada, achando que a supremacia do "mau gosto" promoverá o progresso das classes populares, expressando essa intelectualidade uma visão "generosa", porém claramente paternalista e etnocêntrica, do povo pobre.

EDITORA ABRIL, ONDE FUNCIONA A REDAÇÃO DE VEJA, FOI ALVO DE PROTESTOS COM INSTALAÇÕES E PLACAS PICHADAS E LIXO JOGADO NO PORTÃO DE ENTRADA.

Temos também uma mídia reacionária e ultraconservadora, que há muito perdeu a hegemonia de opinião, e que não consegue esconder suas convicções elitistas, a ponto da mais radical dela, a revista Veja, ser alvo, na semana passada, de protestos com placas e instalações localizadas na entrada pichadas, além de uma grande quantidade de lixo despejada no portão, na sede da Editora Abril.

Há os ativistas sociais que protestam contra o abuso dos políticos, dos tecnocratas, dos dirigentes esportivos, mas há outros que cometem vandalismos diversos. Há outros ativistas sérios, que querem a melhoria de vida das classes populares, e outros que fingem ter a mesma causa, mas preferem a espetacularização da provocatividade, sob as mesadas generosas de George Soros.

Há um machismo decadente, de antigos feminicidas de 20 a 45 anos atrás que falecem sem saber de suas tragédias e sem que nós saibamos por causa do silêncio da mídia. E há um machismo festivo que jura de pés juntos que as mulheres-objeto que cultuam são "feministas" só porque trabalham um estereótipo supostamente independente e avesso à natureza masculina.

Há um feminismo atuante, que se mobiliza desde a ditadura militar - quando o AI-5 ainda existia, mas o cenário político ficava mais flexível - e que busca uma maturidade numa época em que até Emma Watson se destaca em ativismo semelhante.

Mas há outro feminismo, espetacularizado e sensacionalista, com manifestantes que preferem a provocatividade como um fim em si mesmo, usando palavras de ordem pintadas diante de peitos nus e mais preocupadas em causar escândalo do que em superar a opressão machista, não obstante sob as finanças generosas de um homem, George Soros.

Soros, que financia até o "funk" no Brasil, tenta transformar os movimentos sociais em espetáculos sensacionalistas, apostando até numa militância LGBT de feministas agressivas e homossexuais estereotipados desfilando nas paradas gays, num tempo em que, no exterior, pessoas podem ser homossexuais sem perder suas naturezas masculinas ou femininas.

A trolagem é um fenômeno de reacionarismo que substituiu o antigo Comando de Caça aos Comunistas (que parece continuar existindo), com internautas despejando intolerância social extrema ou manifestando defesa radical do "estabelecido" pela mídia, pela política ou pelo mercado.

O reacionarismo é violento e de efeitos maléficos, mas acaba sendo passageiro pelas circunstâncias, porque em dado momento o próprio troleiro sofre as reações diversas contra seus atos, seja pelo rastreamento de suas atividades pela Justiça, seja pela descoberta de seus atos pelos próprios amigos, que se afastam dele, ou pelos patrões, que o demitem do emprego.

Neste país em que conservadorismo e progressismo entram em conflito, em que as noções de moderno e retrógrado se tornam mais confusas - o ritmo mais "moderno" do país é o "funk", de valores sócio-culturais e artísticos retrógrados, e uma das pessoas mais reacionárias do país é um roqueiro, o músico Lobão - , Dilma venceu sob vantagem apertada contra Aécio Neves.

Se isso ocorresse na década de 1950, isso teria dado uma reação furiosa da direita. A UDN, o PSDB da época, protestaria com raiva, sobretudo pela oratória agressiva de Carlos Lacerda. Mas os tempos são outros e Lacerda já não está mais entre nós há 37 anos, e a Veja é grotesca demais para herdar sua agressividade paranoica, mas bastante elaborada.

Isso porque os tempos de hoje são muito mais complexos do que há 50 anos atrás. E Dilma Rousseff, com uma vitória apertada, comandará os próximos quatro anos de um país em transformação, que vive um período bastante complicado e imprevisível, mas com toda a certeza longe da letargia pragmática dos anos 90.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

RELIGIÃO DO AMOR?

Vejam como são as coisas, para uma sociedade que acha que os males da religião se concentram no neopentecostalismo. Um crime ocorrido num “centro espírita” de São Luís, no Maranhão, mostra o quanto o rótulo de “kardecismo” esconde um lodo que faz da dita “religião do amor” um verdadeiro umbral. No “centro espírita” Yasmin, a neta da diretora da casa, juntamente com seu namorado, foram assaltar a instituição. Os tios da jovem reagiram e, no tiroteio, o jovem casal e um dos tios morreram. Houve outros casos ao longo dos últimos anos. Na Taquara, no Rio de Janeiro, um suposto “médium” do Lar Frei Luiz foi misteriosamente assassinado. O “médium” era conhecido por fraudes de materialização, se passando por um suposto médico usando fantasias árabes de Carnaval, mas esse incidente não tem relação com o crime, ocorrido há mais de dez anos. Tivemos também um suposto latrocínio que tirou a vida de um dirigente de um “centro espírita” do Barreto, em Niterói, Estado do Rio de Janeiro. Houve incênd...

LULA GLOBALIZOU A POLARIZAÇÃO

LULA SE CONSIDERA O "DONO" DA DEMOCRACIA. Não é segredo algum, aqui neste blogue, que o terceiro mandato de Lula está mais para propaganda do que para gestão. Um mandato medíocre, que tenta parecer grandioso por fora, através de simulacros que são factoides governamentais, como os tais “recordes históricos” que, de tão fáceis, imediatos e fantásticos demais para um país que estava em ruínas, soam ótimos demais para serem verdades. Lula só empolga a bolha de seus seguidores, o Clube de Assinantes VIP do Lulismo, que quer monopolizar as narrativas nas redes sociais. E fazendo da política externa seu palco e seu palanque, Lula aposta na democracia de um homem só e na soberania de si mesmo, para o delírio da burguesia ilustrada que se tornou a sua base de apoio. Só mesmo sendo um burguês enrustido, mesmo aquele que capricha no seu fingimento de "pobreza", para aplaudir diante de Lula bancando o "dono" da democracia. Lula participou da Assembleia Geral da ONU e...

LUÍS INÁCIO SUPERSTAR

Não podemos estragar a brincadeira. Imagine, nós, submetidos aos fatos concretos e respirando o ar nem sempre agradável da realidade, termos que desmascarar o mundo de faz-de-conta do lulismo. A burguesia ilustrada fingindo ser pobre e Lula pelego fingindo governar pelos miseráveis. Nas redes sociais, o que vale é a fantasia, o mundo paralelo, o reino encantado do agradável, que ganha status de “verdade” se obtém lacração na Internet e reconhecimento pela mídia patronal. Lula tornou-se o queridinho das esquerdas festivas, atualmente denominadas woke , e de uma burguesia flexível em busca de tudo que lhe pareça “legal”, daí o rótulo “tudo de bom”. Mas o petista é visto com desconfiança pelas classes populares que, descontando os “pobres de novela”, não se sentem beneficiadas por um governo que dá pouco aos pobres, sem tirar muito dos ricos. A aparente “alta popularidade” de Lula só empolga a “boa” sociedade que domina as narrativas nas redes sociais. Lula só garante apoio a quem já está...

BURGUESIA ILUSTRADA E SEU VIRALATISMO

ESSA É A "FELICIDADE" DA BURGUESIA ILUSTRADA. A burguesia ilustrada, que agora se faz de “progressista, democrática e de esquerda”, tenta esconder sua herança das velhas oligarquias das quais descendem. Acionam seus “isentões”, os negacionistas factuais, que atuam como valentões que brigam com os fatos. Precisam manter o faz-de-conta e se passar pela “mais moderna sociedade humana do planeta”, tendo agora o presidente Lula como fiador. A burguesia ilustrada vive sentimentos confusos. Está cheia de dinheiro, mas jura que é “pobre”, criando pretextos tão patéticos quanto pagar IPVA, fazer autoatendimento em certos postos de gasolina, se embriagar nas madrugadas e falar sempre de futebol. Isso fora os artifícios como falar português errado, quase sempre falando verbos no singular para os substantivos do plural. Ao mesmo tempo megalomaníaca e auto-depreciativa, a burguesia ilustrada criou o termo “gente como a gente” como uma forma caricata da simplicidade humana. É capaz de cele...

“COMBATE AO PRECONCEITO” TRAVOU A RENOVAÇÃO REAL DA MPB

O falecimento do cantor e compositor carioca Jards Macalé aos 82 anos, duas semanas após a de Lô Borges, mostra o quanto a MPB anda perdendo seus mestres um a um, sem que haja uma renovação artística que reúna talento e visibilidade. Macalé, que por sorte se apresentou em Belém, no Pará, no Festival Se Rasgum, em 2024. Jards foi escalado porque o convidado original, Tom Zé, não teve condições de tocar no evento. A apresentação de Macalé acabou sendo uma despedida, um dos últimos shows  do artista em sua vida. Belém é capital do Estado da Região Norte de domínio coronelista, fechado para a MPB - apesar da fama internacional dos mestres João Do ato e Billy Blanco - e impondo a música brega-popularesca, sobretudo forró-brega, breganejo e tecnobrega, como mercado único. A MPB que arrume um dueto com um ídolo popularesco de plantão para penetrar nesses locais. Jards, ao que tudo indica, não precisou de dueto com um popularesco de plantão, seja um piseiro ou um axezeiro, para tocar num f...

O ERRO QUE DENISE FRAGA COMETEU, NA BOA-FÉ

A atriz Denise Fraga, mesmo de maneira muito bem intencionada, cometeu um erro ao dar uma entrevista ao jornal O Estado de São Paulo para divulgar o filme Livros Restantes, dirigido por Márcia Paraíso, com estreia prevista para 11 de dezembro. Acreditando soar “moderna” e contemporânea, Denise, na melhor das intenções, cometeu um erro na boa-fé, por conta do uso de uma gíria. “As mulheres estão mais protagonistas das suas vidas. Antes esperavam que aos 60 você estivesse aposentando; hoje estamos indo para a balada com os filhos”. Denise acteditou que a gíria “balada” é uma expressão da geração Z, voltada a juventude contemporânea, o que é um sério equívoco sem saber, Denise cometeu um grave erro de citar uma gíria ligada ao uso de drogas alucinógenas por uma elite empresarial nos agitos noturnos dos anos 1990. A gíria “balada” virou o sinônimo do “vocabulário de poder” descrito pelo jornalista britânico Robert Fisk. Também simboliza a “novilíngua” do livro 1984, de George Orwell, no se...

A RELIGIÃO QUE COPIA NOMES DE SANTOS PARA ENGANAR FIÉIS

SÃO JOÃO DE DEUS E SÃO FRANCISCO XAVIER - Nomes "plagiados" por dois obscurantistas da fé neomedieval "espirita". Sendo na prática uma mera repaginação do velho Catolicismo medieval português que vigorou no Brasil durante boa parte do período colonial, o Espiritismo brasileiro apenas usa alguns clichês da Doutrina Espírita francesa como forma de dar uma fachada e um aparato pretensamente diferentes. Mas, se observar seu conteúdo, se verá que quase nada do pensamento de Allan Kardec foi aproveitado, sendo os verdadeiros postulados fundamentados na Teologia do Sofrimento da Idade Média. Tendo perdido fiéis a ponto de cair de 2,1% para 1,8% segundo o censo religioso de 2022 em relação ao anterior, de 2012, o "espiritismo à brasileira" tenta agora usar como cartada a dramaturgia, sejam novelas e filmes, numa clara concorrência às novelas e filmes "bíblicos" da Record TV e Igreja Universal. E aí vemos que nomes simples e aparentemente simpáticos, como...

“JORNALISMO DA OTAN” BLINDA CULTURALISMO POPULARESCO DO BRASIL

A bregalização e a precarização de outros valores socioculturais no Brasil estão sendo cobertos por um véu que impede que as investigações e questionamentos se tornem mais conhecidos. A ideologia do “Jornalismo da OTAN” e seu conceito de “culturalismo sem cultura”, no qual o termo “cultura” é um eufemismo para propaganda de manipulação política, faz com que, no Brasil, a mediocridade e a precarização cultural sejam vistas como um processo tão natural quanto o ar que respiramos e que, supostamente, reflete as vivências e sentimentos da população de cada região. A mídia de esquerda mordeu a isca e abriu caminho para o golpismo político de 2016, ao cair na falácia do “combate ao preconceito” da bregalização. A imprensa progressista quase faliu por adotar a mesma agenda cultural da mídia hegemônica, iludida com os sorrisos desavisados da plateia que, feito gado, era teleguiada pelo modismo popularesco da ocasião. A coisa ainda não se resolveu como um todo, apesar da mídia progressista ter ...

O BRASIL DOS SONHOS DA FARIA LIMA

Pouca gente percebe, mas há um poder paralelo do empresariado da Faria Lima, designado a moldar um sistema de valores a ser assimilado “de forma espontânea” por diversos públicos que, desavisados, tom esses valores provados como se fossem seus. Do “funk” (com seu pseudoativismo brega identitário) ao Espiritismo brasileiro (com o obscurantismo assistencialista dos “médiuns”), da 89 FM à supervalorização de Michael Jackson, do fanatismo gurmê do futebol e da cerveja, do apetite “original” pelas redes sociais, pelo uso da gíria “balada” e dos “dialetos” em portinglês (como “ dog ”, “ body ” e “ bike ”), tudo isso vem das mentes engenhosas das elites empresariais do Itaim Bibi, na Zona Sul paulistana, e de seis parceiros eventuais como o empresariado carnavalesco de Salvador e o coronelismo do Triângulo Mineiro, no caso da religião “espírita”. E temos a supervalorização de uma banda como Guns N'Roses, que não merece a reputação de "rock clássico" que recebe do público brasile...

INFANTILIZAÇÃO E ADULTIZAÇÃO

A sociedade brasileira vive uma situação estranha, sob todos os aspectos. Temos uma elite infantilizada, com pessoas de 18 a 25 anos mostrando um forte semblante infantil, diferente do que eu via há cerca de 45 anos, quando via pessoas de 22 anos que me pareciam “plenamente adultas”. É um cenário em que a infantilizada sociedade woke brasileira, que chega a definir os inócuos e tolos sucessos “Ilariê” e “Xibom Bom Bom” cono canções de protesto e define como “Bob Dylan da Central” o Odair José, na verdade o “Pat Boone dos Jardins”, apostar num idoso doente de 80 anos para conduzir o futuro do Brasil. A denúncia recente do influenciador e humorista Felca sobre a adultização de menores do ídolo do brega-funk Hytalo Santos, que foi preso enquanto planejava fugir do Brasil, é apenas uma pequena parte de um contexto muito complexo de um colapso etário muito grande. Isso inclui até mesmo uma geração de empresários e profissionais liberais que, cerca de duas décadas atrás, viraram os queridões...