O maior problema que existe na cultura popular brasileira é que ela se tornou privatizada. Isso os montes de páginas de monografias e as muitas filmagens de documentários dessa "admirável" intelectualidade que prevalece como formadora de opinião não dizem nem querem dizer.
Mas a verdade é que a cultura popular, hoje, está nas mãos de uns poucos empresários, que fazem o que querem para transformar as classes populares em estereótipos e caricaturas de si mesmos. Tudo isso com a complacência de cientistas sociais e jornalistas culturais que ficam felizes quando pobretões banguelas fazem o papel de ridículo nas telas de TV.
Se Solange Gomes "sensualiza" demais, se Luan Santana alimenta sua fama com factoides amorosos, se os Aviões do Forró cantam sobre bebedeira e se É O Tchan é acusado de tanta pornografia, isso vem muitas vezes das mentes de empresários do entretenimento "popular", que nem de longe podem ser associados à tal "autossuficiência das periferias".
Temos que deixar claros que a origem pobre não é algo que santifique alguém ou que faça qualquer rico de hoje estar associado aos interesses das classes populares. Tanto que, com base no ditado de quem nunca viu doce passa a se lambuzar quando come um, os pobre que ficam ricos ficam muito mais elitistas do que sua origem humilde pode sugerir.
E aí vemos empresários do entretenimento manipulando os mitos, as sub-celebridades, expondo-as no ridículo sob o pretexto que é o ridículo que diverte e é uma das "melhores" (sic) qualidades do povo pobre,
Esses empresários se equiparam, sociologicamente, aos jagunços e capangas dos fazendeiros. A diferença é que os empresários do entretenimento não matam. Eles até fazem o "outro jogo" do coronelismo, que é domesticar o povo pobre e dar a ele a impressão de que é fazendo o papel de idiota que o povo pobre se emancipará na vida social.
Dai a chamada "cultura" brega, que há mais de 40 anos surgiu para promover nas classes populares uma imagem caricata, enfraquecendo suas identidades regionais, colonizando seus desejos e anseios, confundindo seus referenciais culturais e criando uma personalidade passiva e resignada.
Os intelectuais é que estabeleceram um discurso "provocativo", transformando o "mau gosto" em causa "libertária". Tomam emprestado o discurso modernista e tropicalista e deturpam suas ideias, para dar a impressão que o confuso, retrógrado e conservador brega-popularesco é algo "revolucionário" e "progressista".
Chegam esses intelectuais ao ridículo de dizer que é só dar mais investimentos para transformar essa "cultura popular" em algo "de qualidade", como se fazer cultura de qualidade fosse uma questão de ter poder aquisitivo. Esquecem que os maiores nomes da cultura popular, entre eles Cartola e Jackson do Pandeiro, não precisavam ser ricos para fazer cultura de qualidade.
Os empresários do entretenimento são tão perigosos quanto os barões da grande mídia e seus porta-vozes. Eles também exercem um processo de manipulação das classes populares. Os intelectuais pintam esses empresários como "gente pobrezinha", mas eles são ricos o suficiente para comprar latifúndios, e boa parte deles é de grandes proprietários de terras.
Eles se associam ao latifúndio, que patrocina, com gosto, eventos "populares" no interior do país e em algumas capitais nortistas e nordestinas. E também se associam com os barões da grande mídia para divulgar seus ídolos. Portanto, não vale se a cineasta "mais bacana" e o jornalista "mais legal" tentam argumentar que esses empresários são apenas pobrezinhos em busca de um espaço.
Tudo são jogos de interesses. E esse empresariado do entretenimento popularesco é perigoso porque não apenas promove ídolos de valor duvidoso, como tentam fazê-los perpetuar e se manter na mídia às custas de qualquer coisa, até para mudar seus procedimentos, mas só conforme as conveniências do momento.
Assim, se algum breganejo ou sambrega passa a fingir que passou a fazer MPB - geralmente com covers tendenciosas que escondem um repertório autoral constrangedor - ou se alguma funqueira passou a aparecer em eventos de moda de primeira linha, é porque as conveniência fizeram com que tais mudanças, nada espontâneas nem naturais, tenham ocorrido.
Por isso, há muito tempo não temos uma cultura popular de verdade que prevalecesse no imaginário das classes populares. O que existe de "popular" são coisas caricaturais, ridículas, que hoje atingiram até alta reputação por conta de uma blindagem de intelectuais, barões da mídia e do empresariado associado.
Com toda a certeza, eles não podem se confundir com as classes populares. Eles são elites, a serviço do poder oligárquico e do poder do mercado, e inventam um discurso aqui e ali como malabaristas da palavra, para evitar que a cultura de verdade volte ao seio do povo. O povo pobre que fique com suas breguices, reza a cartilha dessa elite bronzeada e "bacaninha" que engana a opinião pública.
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