Pular para o conteúdo principal

GRANDE MÍDIA TENTA GANHAR TEMPO PARA EXTINGUIR A MPB


Enquanto a MPB autêntica se perde em incessantes homenagens, que causam temor de um possível clima de despedida, os brega-popularescos - mesmo aqueles que se acham a "verdadeira MPB" por causa da facilidade de lotar plateias aqui e ali - tentam ganhar tempo, mesmo com crises e factoides, para se manterem em evidência.

Sabemos que tudo isso é show business brasileiro, que a cultura popular foi privatizada, vendida para uma elite de empresários de entretenimento, apoiados pelos barões da mídia, pelo latifúndio e até pelas multinacionais (embora a intelectualidade "bacana" faça vista grossa desse apoio) e que a cultura verdadeira que tivemos só será apreciada por uma elite de especialistas e nostálgicos.

A mediocrização cultural atinge níveis alarmantes que hoje já entram nas universidades pela porta da frente. Não houve o sonhado debate cultural dos CPCs da UNE, a ditadura militar promoveu a bregalização cultural mas foi absolvida de tal responsabilidade pelo tendencioso revisionismo histórico de Paulo César Araujo.

Até agora, o que se viu da boa música brasileira que é relativamente acessível ao grande público foi tão somente eventos tributo envolvendo medalhões e veteranos, e, quando surge algum nome novo, ele se limita a fazer um pop inofensivo, que não deixa grande marca.

Enquanto isso, é quase um monopólio de ídolos "populares" que tomam todos os espaços midiáticos e mesmo casas de eventos imagináveis e inimagináveis. Insatisfeitos em ter seus próprios espaços, eles já começam a desalojar a MPB autêntica até dos espaços próprios desta, fechando o cerco e discriminando a MPB em poucos espaços de divulgação e apreciação.

Os cantores, duplas e grupos brega-popularescos em geral nada acrescentaram e nem acrescentarão de novo ou mesmo de relevante e expressivo na música brasileira. Mesmo um nome como Leandro Lehart, que agora vende uma imagem de "artista revolucionário", não passa de uma imitação pálida e ainda assim menos ousada do que o falecido sambista Monsueto produziu há 50 anos atrás.

Lendo os noticiários, vejo que nomes como Zezé di Camargo & Luciano, Cláudia Leitte, Daniel, Thiaguinho, Latino e Belo se perdem em factoides ou supostos dramas pessoais para se manterem em cartaz na mídia. Pelo menos Chitãozinho & Xororó e Alexandre Pires põem sua canastrice artística a serviço de atividades "mais profissionais".

Ironicamente, os próprios neo-bregas - dos quais Zezé di Camargo & Luciano e Belo são seus representantes principais - também deram para fazer eventos-homenagem, talvez auto-homenagens, copiando os piores aspectos da MPB pasteurizada dos anos 80.

Enquanto contestamos a supremacia do brega-popularesco como um todo, não apenas musical, mas também comportamental e jornalístico, sem termos a visibilidade fácil de intelectuais que ficam complacentes com toda essa degradação cultural, o mercado ganha tempo e parece feliz, mesmo com sua falsa tristeza, quando alguém da MPB autêntica acaba falecendo.

Os grandes nomes da MPB já são idosos. Milton Nascimento, Djavan, Martinho da Vila, Gal Costa, Caetano, Gil, Paulinho da Viola, Zé Ramalho estão todos idosos. Jair Rodrigues e Emílio Santiago já faleceram, além de um cem-número de músicos veteranos que os telespectadores de Fausto Silva e companhia não conhecem, a não ser muito vagamente.

Não há uma geração nova que junte visibilidade, talento e um certo semancol cultural que possa renovar a MPB e fazer com que ela, em vez de ser homenageada, seja vivida no cotidiano. Hoje o "cotidiano" é só a música brega-popularesca - ou Música de Cabresto Brasileira, alcunha que assusta nossos intelectuais tão "bonzinhos" - que rola nas rádios e na televisão.

O que se observa agora como "nova MPB" de visibilidade é uma geração pouco corajosa e complacente com a mediocridade midiática. Viram escravos de FMs comerciais com alguma habilidade superficial de "ir adiante", mesmo assim sem processar criativamente as diversas informações musicais que absorvem nas universidades e na Internet.

Fora eles, o que se vê é a presença quase totalitária de toda a multidão brega-popularesca que, em nome da preconceituosa "ruptura de preconceitos" - preconceituosa, porque prega a aceitação de qualquer coisa sem critérios - marca sua presença nos eventos, nos noticiários, nos festivais, nos panfletos promocionais, e em tudo que for.

Não se estabeleceu até agora o caminho que deverá seguir a MPB autêntica no futuro. Depois que a ditadura militar abortou o debate dos Centros Populares de Cultura da UNE, não se questionou os descaminhos da cultura popular como um todo, sobretudo musical.

Pelo contrário, se aceitou o "estabelecido" a ponto das esquerdas médias cometerem o constrangedor hábito de pautarem suas propostas musicais ao que os latifundiários e chefões da mídia entendiam como "popular". Diante da bagunça que se tornou analisar a cultura brasileira no mainstream intelectual, os chefões do entretenimento ganham tempo para darem o golpe mortal na MPB.

Deixaremos isso acontecer?

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

RELIGIÃO DO AMOR?

Vejam como são as coisas, para uma sociedade que acha que os males da religião se concentram no neopentecostalismo. Um crime ocorrido num “centro espírita” de São Luís, no Maranhão, mostra o quanto o rótulo de “kardecismo” esconde um lodo que faz da dita “religião do amor” um verdadeiro umbral. No “centro espírita” Yasmin, a neta da diretora da casa, juntamente com seu namorado, foram assaltar a instituição. Os tios da jovem reagiram e, no tiroteio, o jovem casal e um dos tios morreram. Houve outros casos ao longo dos últimos anos. Na Taquara, no Rio de Janeiro, um suposto “médium” do Lar Frei Luiz foi misteriosamente assassinado. O “médium” era conhecido por fraudes de materialização, se passando por um suposto médico usando fantasias árabes de Carnaval, mas esse incidente não tem relação com o crime, ocorrido há mais de dez anos. Tivemos também um suposto latrocínio que tirou a vida de um dirigente de um “centro espírita” do Barreto, em Niterói, Estado do Rio de Janeiro. Houve incênd...

LULA GLOBALIZOU A POLARIZAÇÃO

LULA SE CONSIDERA O "DONO" DA DEMOCRACIA. Não é segredo algum, aqui neste blogue, que o terceiro mandato de Lula está mais para propaganda do que para gestão. Um mandato medíocre, que tenta parecer grandioso por fora, através de simulacros que são factoides governamentais, como os tais “recordes históricos” que, de tão fáceis, imediatos e fantásticos demais para um país que estava em ruínas, soam ótimos demais para serem verdades. Lula só empolga a bolha de seus seguidores, o Clube de Assinantes VIP do Lulismo, que quer monopolizar as narrativas nas redes sociais. E fazendo da política externa seu palco e seu palanque, Lula aposta na democracia de um homem só e na soberania de si mesmo, para o delírio da burguesia ilustrada que se tornou a sua base de apoio. Só mesmo sendo um burguês enrustido, mesmo aquele que capricha no seu fingimento de "pobreza", para aplaudir diante de Lula bancando o "dono" da democracia. Lula participou da Assembleia Geral da ONU e...

LUÍS INÁCIO SUPERSTAR

Não podemos estragar a brincadeira. Imagine, nós, submetidos aos fatos concretos e respirando o ar nem sempre agradável da realidade, termos que desmascarar o mundo de faz-de-conta do lulismo. A burguesia ilustrada fingindo ser pobre e Lula pelego fingindo governar pelos miseráveis. Nas redes sociais, o que vale é a fantasia, o mundo paralelo, o reino encantado do agradável, que ganha status de “verdade” se obtém lacração na Internet e reconhecimento pela mídia patronal. Lula tornou-se o queridinho das esquerdas festivas, atualmente denominadas woke , e de uma burguesia flexível em busca de tudo que lhe pareça “legal”, daí o rótulo “tudo de bom”. Mas o petista é visto com desconfiança pelas classes populares que, descontando os “pobres de novela”, não se sentem beneficiadas por um governo que dá pouco aos pobres, sem tirar muito dos ricos. A aparente “alta popularidade” de Lula só empolga a “boa” sociedade que domina as narrativas nas redes sociais. Lula só garante apoio a quem já está...

BURGUESIA ILUSTRADA E SEU VIRALATISMO

ESSA É A "FELICIDADE" DA BURGUESIA ILUSTRADA. A burguesia ilustrada, que agora se faz de “progressista, democrática e de esquerda”, tenta esconder sua herança das velhas oligarquias das quais descendem. Acionam seus “isentões”, os negacionistas factuais, que atuam como valentões que brigam com os fatos. Precisam manter o faz-de-conta e se passar pela “mais moderna sociedade humana do planeta”, tendo agora o presidente Lula como fiador. A burguesia ilustrada vive sentimentos confusos. Está cheia de dinheiro, mas jura que é “pobre”, criando pretextos tão patéticos quanto pagar IPVA, fazer autoatendimento em certos postos de gasolina, se embriagar nas madrugadas e falar sempre de futebol. Isso fora os artifícios como falar português errado, quase sempre falando verbos no singular para os substantivos do plural. Ao mesmo tempo megalomaníaca e auto-depreciativa, a burguesia ilustrada criou o termo “gente como a gente” como uma forma caricata da simplicidade humana. É capaz de cele...

“COMBATE AO PRECONCEITO” TRAVOU A RENOVAÇÃO REAL DA MPB

O falecimento do cantor e compositor carioca Jards Macalé aos 82 anos, duas semanas após a de Lô Borges, mostra o quanto a MPB anda perdendo seus mestres um a um, sem que haja uma renovação artística que reúna talento e visibilidade. Macalé, que por sorte se apresentou em Belém, no Pará, no Festival Se Rasgum, em 2024. Jards foi escalado porque o convidado original, Tom Zé, não teve condições de tocar no evento. A apresentação de Macalé acabou sendo uma despedida, um dos últimos shows  do artista em sua vida. Belém é capital do Estado da Região Norte de domínio coronelista, fechado para a MPB - apesar da fama internacional dos mestres João Do ato e Billy Blanco - e impondo a música brega-popularesca, sobretudo forró-brega, breganejo e tecnobrega, como mercado único. A MPB que arrume um dueto com um ídolo popularesco de plantão para penetrar nesses locais. Jards, ao que tudo indica, não precisou de dueto com um popularesco de plantão, seja um piseiro ou um axezeiro, para tocar num f...

O ERRO QUE DENISE FRAGA COMETEU, NA BOA-FÉ

A atriz Denise Fraga, mesmo de maneira muito bem intencionada, cometeu um erro ao dar uma entrevista ao jornal O Estado de São Paulo para divulgar o filme Livros Restantes, dirigido por Márcia Paraíso, com estreia prevista para 11 de dezembro. Acreditando soar “moderna” e contemporânea, Denise, na melhor das intenções, cometeu um erro na boa-fé, por conta do uso de uma gíria. “As mulheres estão mais protagonistas das suas vidas. Antes esperavam que aos 60 você estivesse aposentando; hoje estamos indo para a balada com os filhos”. Denise acteditou que a gíria “balada” é uma expressão da geração Z, voltada a juventude contemporânea, o que é um sério equívoco sem saber, Denise cometeu um grave erro de citar uma gíria ligada ao uso de drogas alucinógenas por uma elite empresarial nos agitos noturnos dos anos 1990. A gíria “balada” virou o sinônimo do “vocabulário de poder” descrito pelo jornalista britânico Robert Fisk. Também simboliza a “novilíngua” do livro 1984, de George Orwell, no se...

A RELIGIÃO QUE COPIA NOMES DE SANTOS PARA ENGANAR FIÉIS

SÃO JOÃO DE DEUS E SÃO FRANCISCO XAVIER - Nomes "plagiados" por dois obscurantistas da fé neomedieval "espirita". Sendo na prática uma mera repaginação do velho Catolicismo medieval português que vigorou no Brasil durante boa parte do período colonial, o Espiritismo brasileiro apenas usa alguns clichês da Doutrina Espírita francesa como forma de dar uma fachada e um aparato pretensamente diferentes. Mas, se observar seu conteúdo, se verá que quase nada do pensamento de Allan Kardec foi aproveitado, sendo os verdadeiros postulados fundamentados na Teologia do Sofrimento da Idade Média. Tendo perdido fiéis a ponto de cair de 2,1% para 1,8% segundo o censo religioso de 2022 em relação ao anterior, de 2012, o "espiritismo à brasileira" tenta agora usar como cartada a dramaturgia, sejam novelas e filmes, numa clara concorrência às novelas e filmes "bíblicos" da Record TV e Igreja Universal. E aí vemos que nomes simples e aparentemente simpáticos, como...

“JORNALISMO DA OTAN” BLINDA CULTURALISMO POPULARESCO DO BRASIL

A bregalização e a precarização de outros valores socioculturais no Brasil estão sendo cobertos por um véu que impede que as investigações e questionamentos se tornem mais conhecidos. A ideologia do “Jornalismo da OTAN” e seu conceito de “culturalismo sem cultura”, no qual o termo “cultura” é um eufemismo para propaganda de manipulação política, faz com que, no Brasil, a mediocridade e a precarização cultural sejam vistas como um processo tão natural quanto o ar que respiramos e que, supostamente, reflete as vivências e sentimentos da população de cada região. A mídia de esquerda mordeu a isca e abriu caminho para o golpismo político de 2016, ao cair na falácia do “combate ao preconceito” da bregalização. A imprensa progressista quase faliu por adotar a mesma agenda cultural da mídia hegemônica, iludida com os sorrisos desavisados da plateia que, feito gado, era teleguiada pelo modismo popularesco da ocasião. A coisa ainda não se resolveu como um todo, apesar da mídia progressista ter ...

O BRASIL DOS SONHOS DA FARIA LIMA

Pouca gente percebe, mas há um poder paralelo do empresariado da Faria Lima, designado a moldar um sistema de valores a ser assimilado “de forma espontânea” por diversos públicos que, desavisados, tom esses valores provados como se fossem seus. Do “funk” (com seu pseudoativismo brega identitário) ao Espiritismo brasileiro (com o obscurantismo assistencialista dos “médiuns”), da 89 FM à supervalorização de Michael Jackson, do fanatismo gurmê do futebol e da cerveja, do apetite “original” pelas redes sociais, pelo uso da gíria “balada” e dos “dialetos” em portinglês (como “ dog ”, “ body ” e “ bike ”), tudo isso vem das mentes engenhosas das elites empresariais do Itaim Bibi, na Zona Sul paulistana, e de seis parceiros eventuais como o empresariado carnavalesco de Salvador e o coronelismo do Triângulo Mineiro, no caso da religião “espírita”. E temos a supervalorização de uma banda como Guns N'Roses, que não merece a reputação de "rock clássico" que recebe do público brasile...

INFANTILIZAÇÃO E ADULTIZAÇÃO

A sociedade brasileira vive uma situação estranha, sob todos os aspectos. Temos uma elite infantilizada, com pessoas de 18 a 25 anos mostrando um forte semblante infantil, diferente do que eu via há cerca de 45 anos, quando via pessoas de 22 anos que me pareciam “plenamente adultas”. É um cenário em que a infantilizada sociedade woke brasileira, que chega a definir os inócuos e tolos sucessos “Ilariê” e “Xibom Bom Bom” cono canções de protesto e define como “Bob Dylan da Central” o Odair José, na verdade o “Pat Boone dos Jardins”, apostar num idoso doente de 80 anos para conduzir o futuro do Brasil. A denúncia recente do influenciador e humorista Felca sobre a adultização de menores do ídolo do brega-funk Hytalo Santos, que foi preso enquanto planejava fugir do Brasil, é apenas uma pequena parte de um contexto muito complexo de um colapso etário muito grande. Isso inclui até mesmo uma geração de empresários e profissionais liberais que, cerca de duas décadas atrás, viraram os queridões...