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45 E OS 50 DOS HOMENS "DE LIDERANÇA"


Este mês eu farei 45 anos - sim, sou um legítimo "nascido em 1971" - e fico refletindo sobre o que é ter 45 ou 50 anos. Eu costumo, desde meus sete anos de idade (no longínquo ano de 1978) pensar a vida adulta e os anos "adiante" e faço comparação com os "homens de liderança" um pouco mais velhos do que eu, nascidos entre 1965 e 1970.

Eles são como a turma do quarto que faziam barulho enquanto eu "dormia". Eles estavam "acordados" antes, uns desde 1965, outros mais adiante, como em 1968 e 1969. Mas eu, que só "acordei" em 1971, parecia, no sono, ouvir o barulho dos "acordados" e outros ruídos da "madrugada".

Imagine os acordados que não lembram o que fizeram de madrugada e os que dormem percebem, mesmo nos sonhos, o que havia ocorrido na madrugada dos acordados. E aí faço uma reflexão observando, como exemplo, aqueles que são empresários, médicos, diretores de TV, economistas e outros "detentores de algum cargo de liderança" nascidos entre 1965 e 1970.

HISTÓRIA

Claro, a geração que nasceu entre 1950 e 1970, fora alguns pesquisadores ou observadores comuns mais inclinados, mal consegue diferir uma foto de 1962 da de 1969, atribuindo tudo a "meados dos anos 60".

Quando eu faço o sítio Classical Buses, e pesquiso paisagens e fotos de ônibus relacionados a uma época mais antiga - o foco do sítio vai até 1979, até para a ideia de antiguidade ficar mais precisa - , tento inferir as datas exatas das fotos, verificando possíveis indícios.

Foi assim numa foto da Praça Castro Alves de Salvador, publicada pelo jornal A Tarde atribuída superficialmente aos "anos 60". Nela eu vi uma lona com propaganda eleitoral de um candidato "Lott". Quem conhece História do Brasil sabe se tratar de uma campanha eleitoral, em que o marechal Henrique Teixeira Lott era rival de Jânio Quadros e foi derrotado em outubro de 1960.

Portanto, a foto é do próprio ano de 1960, por causa da referência da campanha do marechal Lott, que somente nesta vez concorreu à presidência da República, numa empreitada de risco que nem o então presidente Juscelino Kubitschek, que o defendia (Lott havia garantido a posse de JK no contragolpe de 1955), acreditava no sucesso. Lott, apesar de político honesto e, mesmo militar, tinha visão progressista, era considerado "sem sal" pela opinião pública da época.

TROPEÇANDO NOS 45 OU 50

Qual dos nascidos nos anos 1960 iriam identificar coisas dos anos 1960? Até a Jovem Guarda era digerida mais pelas regravações do que pelas gravações originais do período (1964-1968, além da pré-Jovem Guarda de 1959 ao começo de 1964).

Se fizerem uma festa "anos 60", a maioria das músicas tocadas será de material dos anos 80 e 90, de covers a regravações. Até "As Sete Vampiras" (1985) de Léo Jaime e "Whisky a Go-go" (1984), do Roupa Nova, mas de autoria da intragável dupla Sullivan & Massadas, estariam num repertório que, por outro lado, se esqueceria que Sérgio Murilo um dia existiu e era um grande ídolo juvenil.

Mas, em se tratando dos "homens de liderança" (empresários, executivos, profissionais liberais) nascidos entre 1965 a 1970, isso é compreensível. Eles viveram trancados nos seus escritórios e praticamente se acostumaram a se "divertir" apenas em eventos de gala, compromissos formais em geral e, quando muito, só conheciam o lazer no convívio com as esposas e filhos.

Eles são do tipo de pessoas que se esqueceram que foram jovens e, por isso, perguntam aos mais jovens sobre o que os adultos já haviam vivido nos seus tempos. "Me ensina o que é se divertir", pergunta um empresário a um adolescente, numa festa de família.

Daí que imagino que homens assim nascidos entre 1965 e 1970, "escondidos" numa reputação social construída a partir de belíssimas esposas (várias delas jornalistas, atrizes, apresentadoras de TV e modelos), irão um dia perguntar a mim, nascido "pouco depois", em 1971, o que é ter nascido entre 1965 e 1970.

Eles simplesmente tropeçaram nos 45 ou 50 anos. Chegaram antes pela sorte da biologia, mas existencialmente foi como se eles tivessem tido pressa em chegar a meia-idade primeiro. São como corredores que, numa volta de teste, conseguiram a façanha de poderem largar em primeiro, mas cujos carros enguiçam no meio da volta, enquanto aparentes retardatários passam pela frente.

Eles demoraram demais no pit stop das festas de gala, enguiçaram na compreensão existencial de si mesmos, quando eles, que mal conseguem compreender seus filhos, também deixam de compreender si mesmos. Trancados nos seus escritórios ou consultórios, eles mal conseguem ver o mundo em sua volta.

SUCESSO NO "MUNDO DOS NEGÓCIOS"

Alguns deles eram até surfistas ou punks, mauricinhos ou jovens comuns, mas que a vida nos escritórios e consultórios e os cargos de liderança aqui ou ali os fizeram isolar da vida, fazendo-os sisudos e apegados a formalidades e ao "duro trabalho" de serem empresários, médicos, economistas, advogados, publicitários e executivos de TV com alguma reputação de liderança.

Eles mal conseguem sair do "mundo dos negócios" para aparecer ao lado de suas estonteantes esposas, nas páginas de Caras ou em eventos diversos. Até enfrentar um Prêmio Multishow ou um MTV Vídeo Music Brasil é muito para suas personalidades "sérias" e "sofisticadas". Preferem ir a festas de gala dos outros do que aos eventos mais arrojados das próprias esposas.

Eles deixam de curtir a vida para dependerem de paletós, sapatos de verniz e festas de gala para sua afirmação pessoal. Não têm muito o que dizer, e neste caso eles deixam suas belas e interessantes esposas falarem por eles. E eles ainda esperam que os cabelos grisalhos lhes pudessem trazer sabedoria sem o esforço de raciocínio e atividade.

De secundaristas um tanto atrapalhados, mas divertidos, e de universitários com algum idealismo e altivez, eles se convertem, depois de "tropeçarem" nos 45 anos e estarem a caminho dos 50, a homens insossos mais preocupados com o sucesso de sua empresa e com a próxima palestra sobre Medicina ou Direito no qual tentarão ensinar em dobro o que aprenderam pela metade.

Eles chegaram aos 45 anos antes de mim. Chegarão aos 50 antes. Mas eu já penso nos 45 aos 50 anos há muito tempo, em todos os ângulos (juventude, velhice, qualidade de vida), sem esperar que cabelos grisalhos me tragam sabedoria.

Estou mais preparado para viver os 45 anos do que os "patrões" que chegaram antes. Eles, que nem ligaram muito de como será a vida aos 45 ou 50, soam como apressados existenciais que escritórios e consultórios lhes cegaram para a vida e o excesso de eventos de gala lhes subtraiu a experiência de vida, que, qualitativamente, parou nos 30, 35 anos de idade.

Daí ser irônico que a turma masculina "que manda", nascida entre 1965 e 1970, assim que completar 50 anos de idade, tenha que retornar aos 30 anos, o que se observa hoje, quando empresários e médicos dessa faixa etária tenham que buscar um "corpinho de 30" e, na hora do lazer, tenham que se espelhar não no que aprenderam com seus pais, mas no que terão que aprender com seus filhos.

Desse modo, a marcha-a-ré vital dos homens "de liderança" que chegaram ao "topo" antes de mim os fará um tanto frustrados quando eu chegar aos 50 anos, em 2021. Como corredores que largaram em primeiro mas perderam a corrida, eles assistirão à dianteira de quem largou atrás e passou pela frente. A vida é mais plena fora de escritórios e consultórios e de cargos de liderança.

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