A BURGUESIA ENRUSTIDA BRASILEIRA SE ACHA "POBRE" PORQUE, ENTRE OUTRAS COISAS, PAGA IPVA E COMPRA MUITO COMBUSTÍVEL PARA SEUS CARRÕES SUV.
A velha Casa Grande ainda está aqui. Os golpistas de 1964 ainda estão aqui. Mas agora essa burguesia bronzeada se fantasia de “gente simples” e se espalha entre o povo, enquanto faz seus interesses e valores prevalecerem nas redes sociais.
Essa burguesia impõe seus valores ou projetos como se fossem causas universais ou de interesse público. A gíria farialimer “balada”, o culto aos reality shows, o yuppismo pop-rock da 89 FM, Rádio Cidade e congêneres, a exaltação da música brega-popularesca (como a axé-music, o trap e o piseiro), a pseudo-sofisticação dos popularescos mais antigos (tipo Michael Sullivan e Chitãozinho & Xororó) e a sensação que a vida humana é um grande parque de diversões.
Tudo isso são valores que a burguesia concede aos brasileiros sob a ilusão de que, através deles, o Brasil celebrará a liberdade humana, a paz social, a sustentabilidade econômica e, assim, a garantia de ingresso para o Primeiro Mundo.
Trata-se de uma grande ilusão, pois por trás disso tudo temos um processo de domesticação do povo pobre, da juventude e até do público roqueiro, todos convidados a aceitar o sistema de valores dominante sob a garantia de estabilidade e suposto equilíbrio social entre as forças envolvidas.
A burguesia faz isso disfarçando-se de pessoas comuns, para assim forjar algum coleguismo nas redes sociais. Os burgueses atuais são mais sutis do que os reaças do Comando de Caça aos Comunistas (CCC), que não convenciam com seus trajes pretensamente beatniks.
Nesse mimetismo social, a burguesia precisa caprichar nos trajes "simples", com camisetas t-shirt que parecem modestas, bermudões e jeans rasgados e tênis, mocassins ou sandálias, para não dizer chinelos, é claro. Mas é no comportamento que a burguesia bronzeada precisa se disfarçar mais, para soar convincente e ir além do figurino.
Daí que, em primeiro lugar, a regra é falar errado, falar coisas do tipo "Perto de mim estavam uns 'cara' bem 'grandão', tá ligado?", caprichando numa linguagem suburbana estereotipada, misturado com o jeitão de "caubói de Barretos" com roupas informais de farialimer à paisana.
A burguesia enrustida precisa ficar bem na foto quando aparece nos botecos das grandes cidades, e o assunto obrigatório é o futebol, caprichando o máximo nesta agenda temática popularesca. E, em se tratando de bebida alcoólica, a burguesia enrustida não pode ter "preconceitos", indo do Moet & Chandon até o aguardente mais vagabundo vendido em biroscas do interior.
Curtir música popularesca também é a regra, e isso os "europeus" de Jurerê Internacional, em Florianópolis, sabem muito bem fazer. É uma forma de soar "populista", assimilando os trejeitos, os clichês e os gostos associados a uma "cultura popular" fake, porém popularizada graças a muita difusão midiática.
Mesmo os burgueses que fazem palestras precisam caprichar na informalidade, herdando elementos comunicativos e estéticos tanto dos magnatas das big techs - tipo Mark Zuckerberg, da Meta - quanto dos influenciadores digitais e dos comediantes de estandape. Precisam ser um pouco piadistas, improvisar e, sobretudo, entreter as pessoas, mais do que informar sobre suas atividades profissionais, principalmente empresariais.
Por isso mesmo a burguesia de chinelos precisa jogar as sujeiras dos antepassados para debaixo do tapete mas, em contrapartida, realizar o desejo de seus avós que, nas "marchas da família" de 1964, desejavam que suas classes abastadas substituíssem o povo brasileiro, pois a ditadura militar foi feita para transformar a "boa" sociedade na classe mais predestinada do Brasil e, talvez, do planeta.
Daí que a burguesia bronzeada de hoje se acha "mais povo que o povo". E ainda não gosta de ser chamada de burguesia.
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