Pular para o conteúdo principal

BRASIL VIVE A EUFORIA TECNOCRÁTICA


O Brasil vive na euforia tecnocrática. Sem estar socialmente desenvolvido, ele vive a utopia de acreditar que a tecnologia digital, aliada com a euforia financeira, pudessem trazer a tão sonhada prosperidade.

Os gurus das mídias digitais costumam pregar que o papel está morto, vendo o papel impresso como um jagunço dos barões da grande mídia e, de repente, o coitado do Johannes Gutenberg passou a ser visto como bode expiatório da decadência da grande mídia.

Claro, vamos ter que lembrar milhares de vezes para os gurus digitais, que acham que, morto o papel, morre a grande mídia, que o baronato midiático já investe em mídias digitais, não como alguém que, numa corrida perdida, dispara para alcançar o vencedor, mas, o oposto, pois antes da blogosfera ser cogitável, a grande mídia já tinha seus braços midiáticos na Internet.

Vive-se uma euforia tecnocrática tão grande que os "ativistas" das novas mídias digitais reciclam o discurso da escravidão do homem pelas máquinas digitais e ninguém se dá conta disso. Também, todo mundo brincando de "patinação on App", brincando com smartphones, quem é que vai ter consciência de seu próprio drama, no calor da curtição?

Infelizmente vivemos a supremacia dos escritórios, dos colegiados acadêmicos, de gente engravatada que parece governar os inconscientes das pessoas. Basta injeção de tecnologia aqui e uma outra injeção de dinheiro acolá, e, pronto. O país está salvo, o Brasil já pode governar o planeta.

Não é bem assim. Os gurus das novas mídias digitais, aqueles que acusam o papel de estar a serviço do baronato midiático e seus ativistas que acham que a revolução virá pelo touch screen de um smartphone, não entendem a problemática da coisa.

Primeiro, porque um Reinaldo Azevedo da vida adoraria saber que boa parte de seus pecados será paga por umas folhinhas de papel, e não pelas palavras que ele vomita também na Internet, neste caso de forma ainda mais visceral e ampliada que na imprensa escrita.

Segundo, porque não se observa tanto esse ativismo, pelo menos da forma como se diz. Apenas 30% da sociedade brasileira realmente aproveita as mídias digitais para algum ativismo, e mesmo assim poucos conseguem estar na vanguarda da transmissão de ideias e conceitos que ultrapassem até mesmo as avaliações restritivas dos nossos escritórios e colegiados.

SOCIEDADE MIDIATIZADA

Socializar o tecnocrático é muito difícil. E, infelizmente, ainda se tem muito da visão tecnocrática da Era Médici, vide, no caso do transporte coletivo, um "filhote da ditadura" como Jaime Lerner, que se lançou na ARENA e havia sido o "bom aluno" da UFPR de Flávio Suplicy de Lacerda (o homem que tentou destruir a União Nacional dos Estudantes).

Vivemos a sociedade midiatizada, tecnocrática e financeirista, e há pouca compreensão fora dessas perspectivas. Enquanto muitos brincam de patinação de dedos nos smartphones, os destinos do Brasil ficam presos a visões de escritórios, colegiados acadêmicos, gerências de rádio e TV e superintendências financeiras que manipulam a realidade e os inconscientes coletivos.

Dizer é fácil, porque o guru das mídias digitais vai ter seus milhares de seguidores acreditando que os barões da grande mídia morrerão abraçados a folhinhas de papel ou que basta apertar o touch screen do smartphone para estourar a revolução mundial.

Só que o que se vê são as mídias sociais sendo tomadas de ultraconservadorismo e os barões da mídia comprando briga com a blogosfera. A blogosfera fica feliz, porque acha que, por analisar o mundo de forma um pouco mais transparente, irá necessariamente ganhar a melhor na briga com o baronato midiático. Não vai.

A queda de braço não é fácil. Se a blogosfera conta com patrocinadores estatais, o baronato midiático tem financiamento privado. Não há o que comemorar, apesar da notória decadência da Folha, da Abril e do Estadão, porque eles ainda podem se reestruturar como corporações midiáticas.

Como empresas capitalistas, tanto faz os três grandes grupos midiáticos paulistas demitirem umas centenas ou milhares de pessoas, sofrerem a péssima repercussão com isso diante de protestos grevistas, porque tudo ficará na mesma e o baronato midiático se fortalecerá da forma que pode, sempre com muito dinheiro nas mãos.

Para eles, o papel é até mais obsoleto do que o que os gurus das novas mídias devem imaginar. A tecnocracia nada tem de progressista. Isso é uma ilusão. Se fosse assim, latifundiários seriam muito mais revolucionários que o campesinato, só porque substituíram uma grande parcela de trabalho manual com a aquisição de máquinas agrícolas.

A euforia tecnocrática do Brasil midiatizado e mercantilista deslumbra muitos porque as pessoas estão confusas. E isso se reflete culturalmente, na nova música brasileira, em que, salvo honrosas exceções, há uma porção de gente super-hiper-bem-informada, que todavia se expressa de forma confusa e entediante, em que pesem os aplausos que recebem da crítica especializada.

Isso se nota em tudo, da gororoba que mistura brega, MPB e pop, da MPB pós-moderna e também do rock. Os jovens se informam de tudo, até o vestuário é confuso, misturando hippie com skatista e black power, e há a lista enorme de referências dos quais os músicos não têm a ideia exata do que realmente são.

É como um cachorro-quente que, de tanto tempero, elimina o sabor da salsicha. E boa parte disso está na utopia tecnológica, todo mundo consultando o YouTube, mexendo em smartphones, manipulando sâmpleres, hiperconectado com qualquer coisa, lendo jornais digitais etc etc etc. Em teoria, tudo muito perfeito, mas o resultado soa bastante decepcionante.

Até que ponto essa euforia tecnocrática se dará? Não se sabe. Enquanto as pessoas apostam toda sua felicidade em rios de dinheiro e de tecnologia digital, o Brasil mostra problemas que escapam dos escritórios, colegiados, superintendências, gerências etc.

Isso os gurus e ativistas das mídias digitais não conseguem prever. E, o que é pior, as mídias sociais sofrem um movimento crescente de reacionarismo. Para piorar, quando os gurus midiáticos estiverem assistindo na Internet ao enterro do papel impresso da grande mídia, seus porta-vozes reacionários voltarão sob os braços dos internautas nas páginas direitistas das mídias sociais.

Mais uma vez, é preciso ter cautela. A ressaca da festa tecnocrática é imprevisível e pode ser dolorosa.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

LULA GLOBALIZOU A POLARIZAÇÃO

LULA SE CONSIDERA O "DONO" DA DEMOCRACIA. Não é segredo algum, aqui neste blogue, que o terceiro mandato de Lula está mais para propaganda do que para gestão. Um mandato medíocre, que tenta parecer grandioso por fora, através de simulacros que são factoides governamentais, como os tais “recordes históricos” que, de tão fáceis, imediatos e fantásticos demais para um país que estava em ruínas, soam ótimos demais para serem verdades. Lula só empolga a bolha de seus seguidores, o Clube de Assinantes VIP do Lulismo, que quer monopolizar as narrativas nas redes sociais. E fazendo da política externa seu palco e seu palanque, Lula aposta na democracia de um homem só e na soberania de si mesmo, para o delírio da burguesia ilustrada que se tornou a sua base de apoio. Só mesmo sendo um burguês enrustido, mesmo aquele que capricha no seu fingimento de "pobreza", para aplaudir diante de Lula bancando o "dono" da democracia. Lula participou da Assembleia Geral da ONU e...

INFANTILIZAÇÃO E ADULTIZAÇÃO

A sociedade brasileira vive uma situação estranha, sob todos os aspectos. Temos uma elite infantilizada, com pessoas de 18 a 25 anos mostrando um forte semblante infantil, diferente do que eu via há cerca de 45 anos, quando via pessoas de 22 anos que me pareciam “plenamente adultas”. É um cenário em que a infantilizada sociedade woke brasileira, que chega a definir os inócuos e tolos sucessos “Ilariê” e “Xibom Bom Bom” cono canções de protesto e define como “Bob Dylan da Central” o Odair José, na verdade o “Pat Boone dos Jardins”, apostar num idoso doente de 80 anos para conduzir o futuro do Brasil. A denúncia recente do influenciador e humorista Felca sobre a adultização de menores do ídolo do brega-funk Hytalo Santos, que foi preso enquanto planejava fugir do Brasil, é apenas uma pequena parte de um contexto muito complexo de um colapso etário muito grande. Isso inclui até mesmo uma geração de empresários e profissionais liberais que, cerca de duas décadas atrás, viraram os queridões...

RELIGIÃO DO AMOR?

Vejam como são as coisas, para uma sociedade que acha que os males da religião se concentram no neopentecostalismo. Um crime ocorrido num “centro espírita” de São Luís, no Maranhão, mostra o quanto o rótulo de “kardecismo” esconde um lodo que faz da dita “religião do amor” um verdadeiro umbral. No “centro espírita” Yasmin, a neta da diretora da casa, juntamente com seu namorado, foram assaltar a instituição. Os tios da jovem reagiram e, no tiroteio, o jovem casal e um dos tios morreram. Houve outros casos ao longo dos últimos anos. Na Taquara, no Rio de Janeiro, um suposto “médium” do Lar Frei Luiz foi misteriosamente assassinado. O “médium” era conhecido por fraudes de materialização, se passando por um suposto médico usando fantasias árabes de Carnaval, mas esse incidente não tem relação com o crime, ocorrido há mais de dez anos. Tivemos também um suposto latrocínio que tirou a vida de um dirigente de um “centro espírita” do Barreto, em Niterói, Estado do Rio de Janeiro. Houve incênd...

LUÍS INÁCIO SUPERSTAR

Não podemos estragar a brincadeira. Imagine, nós, submetidos aos fatos concretos e respirando o ar nem sempre agradável da realidade, termos que desmascarar o mundo de faz-de-conta do lulismo. A burguesia ilustrada fingindo ser pobre e Lula pelego fingindo governar pelos miseráveis. Nas redes sociais, o que vale é a fantasia, o mundo paralelo, o reino encantado do agradável, que ganha status de “verdade” se obtém lacração na Internet e reconhecimento pela mídia patronal. Lula tornou-se o queridinho das esquerdas festivas, atualmente denominadas woke , e de uma burguesia flexível em busca de tudo que lhe pareça “legal”, daí o rótulo “tudo de bom”. Mas o petista é visto com desconfiança pelas classes populares que, descontando os “pobres de novela”, não se sentem beneficiadas por um governo que dá pouco aos pobres, sem tirar muito dos ricos. A aparente “alta popularidade” de Lula só empolga a “boa” sociedade que domina as narrativas nas redes sociais. Lula só garante apoio a quem já está...

DENÚNCIA GRAVE: "MÉDIUM" TIDO COMO "SÍMBOLO DE AMOR E FRATERNIDADE" COLABOROU COM A DITADURA

O famoso "médium" que é conhecido como "símbolo maior de amor e fraternidade", que "viveu apenas pela dedicação ao próximo" e era tido como "lápis de Deus" foi um colaborador perigoso da ditadura militar. Não vou dizer o nome desse sujeito, para não trazer más energias. Mas ele era de Minas Gerais e foi conhecido por usar perucas e ternos cafonas, óculos escuros e por defender ideias ultraconservadoras calcadas no princípio de que "devemos aceitar os infortúnios e agradecer a Deus pela desgraça obtida". O pretexto era que, aceitando o sofrimento "sem queixumes", se obterá as prometidas "bênçãos divinas". Sádico, o "bondoso homem" - que muitos chegaram a enfiar a palavra "Amor" como um suposto sobrenome - dizia que as "bênçãos futuras" eram mais dificuldades, principalmente servidão, disciplina e adversidades cruéis. Fui espírita - isto é, nos padrões em que essa opção religi...

CRISE DA MPB ATINGE NÍVEIS CATASTRÓFICOS

INFELIZMENTE, O MESTRE MILTON NASCIMENTO, ALÉM DE SOFRER DE MAL DE PARKINSON, FOI DIAGNOSTICADO COM DEMÊNCIA. A MPB ainda respira, mas ela já carece de uma renovação real e com visibilidade. Novos artistas continuam surgindo, mas poucos conseguem ser artisticamente relevantes e a grande maioria ainda traduz clichês pós-tropicalistas para o contexto brega-identitário dos últimos tempos. Recentemente, o cantor Milton Nascimento, um dos maiores cantores e compositores da música brasileira e respeitadíssimo no exterior por conta de sua carreira íntegra, com influências que vão da Bossa Nova ao rock progressivo, foi diagnosticado com um tipo de demência, a demência de corpos de Lewy. Eu uma entrevista, o filho Augusto lamentou a rotina que passou a viver nos últimos anos , quando também foi diagnosticado o Mal de Parkinson, outra doença que atinge o cantor. Numa triste e lamentável curiosidade, Milton sofre tanto a doença do ator canadense Michael J. Fox, da franquia De Volta para o Futuro ...

NITERÓI: CONDOMÍNIO SEM COMÉRCIO DIGNO NO ANTIGO RIO DECOR É UMA RAJADA DE METRALHADORA NO PÉ

TERRENO VAZIO APÓS DEMOLIÇÃO DO PRÉDIO DO ANTIGO RIO DECOR, NA AVENIDA FELICIANO SODRÉ, EM NITERÓI. Um dos antigos prédios de Niterói não existe mais. Por um gigantesco erro estratégico, o Rio Decor, durante a pandemia, abandonou o grande prédio da Av. Feliciano Sodré, que no passado foi das Lojas Maveroy e que era um grande espaço para um shopping center . O Rio Decor se mudou para a Av. Jansen de Mello e perdeu boa parte da demanda, sobretudo São Gonçalo, ficando "escondido" na esquina da Rua São Lourenço. Com isso, o prédio, antes imponente, virou uma espécie de Cracolândia niteroiense. Nos últimos tempos houve incêndio e homicídio, além do grande perigo que representava principalmente para quem ficava num ponto de ônibus em frente ao local. Depois de tais incidentes, a estrutura do prédio foi danificada e a Prefeitura de Niterói preferiu demolir. Hoje é um terreno vazio, do qual há intenções de construção de um condomínio, o que não é má ideia, porque dará movimento ao lo...

NEGACIONISTA FACTUAL E SUAS RAÍZES SOCIAIS

O NEGACIONISTA FACTUAL REPRESENTA O FILHO DA SOCIALITE DESCOLADA COM O CENSOR AUSTERO, NOS ANOS DE CHUMBO. O negacionista factual é o filho do casamento do desbunde com a censura e o protótipo ilustrativo desse “isentão” dos tempos atuais pode explicar as posturas desse cidadão ao mesmo tempo amante do hedonismo desenfreado e hostil ao pensamento crítico. O sujeito que simboliza o negacionista factual é um homem de cerca de 50 anos, nascido de uma mãe que havia sido, na época, uma ex-modelo e socialite que eventualmente se divertia, durante as viagens profissionais, nas festas descoladas do desbunde. Já o seu pai, uns dez anos mais velho que sua mãe, havia sido, na época da infância do garoto, um funcionário da Censura Federal, um homem sisudo com manias de ser cumpridor de deveres, com personalidade conservadora e moralista. O casal se divorciou com o menino tendo apenas oito anos de idade. Mas isso não impediu a coexistência da formação dúbia do negacionista factual, que assimilou as...

A HIPOCRISIA DA ELITE DO BOM ATRASO

Quanta falsidade. Se levarmos em conta sobre o que se diz e o que se faz crer, o Brasil é um dos maiores países socialistas do mundo, mas que faz parte do Primeiro Mundo e tem uma das populações mais pobres do planeta, mas que tem dinheiro de sobra para viajar para Bariloche e Cancún como quem vai para a casa da titia e compra um carro para cada membro da família, além de criar, no mínimo, três cachorros. É uma equação maluca essa, daí não ser difícil notar essa falsidade que existe aos montes nas redes sociais. É tanto pobre cheio da grana que a gente desconfia, e tanto “neoliberal de esquerda” que tudo o que acaba acontecendo são as tretas que acontecem envolvendo o “esquerdismo de resultados” e a extrema-direita. A elite do bom atraso, aliás, se compôs com a volta dos pseudo-esquerdistas, discípulos da Era FHC que fingiram serem “de esquerda” nos tempos do Orkut, a se somar aos esquerdistas domesticados e economicamente remediados. Juntamente com a burguesia ilustrada e a pequena bu...

A IMPORTÂNCIA DE SABERMOS A LINHA DO TEMPO DO GOLPE DE 2016

Hoje o golpismo político que escandalizou o Brasil em 2016 anda muito subestimado. O legado do golpe está erroneamente atribuído exclusivamente a Jair Bolsonaro, quando sabemos que este, por mais nefasto e nocivo que seja, foi apenas um operador desse período, hoje ofuscado pelos episódios da reunião do plano de golpe em 2022 e a revolta de Oito de Janeiro em 2023. Mas há quem espalhe na Internet que Jair Bolsonaro, entre nove e trinta anos de idade no período ditatorial, criou o golpe de 1964 (!). De repente os lulistas trocaram a narrativa. Falam do golpe de 2016 como um fato nefasto, já que atingiu uma presidenta do PT. Mas falam de forma secundária e superficial. As negociações da direita moderada com Lula são a senha dessa postura bastante estranha que as esquerdas médias passaram a ter nos últimos quatro anos. A memória curta é um fenômeno muito comum no Brasil, pois ela corresponde ao esquecimento tendencioso dos erros passados, quando parte dos algozes ou pilantras do passado r...