Infelizmente, foi preciso haver a violência nos complexos da Maré e do Alemão, no grande entorno que envolve Bonsucesso, Olaria, Penha, Ramos, Higienópolis, Cordovil e adjacências, para que a visão que se tinha sobre as favelas fosse mudada.
Antes vista como "arquitetura pós-moderna", a favela de fantasia era glorificada como paisagem de consumo para etnógrafos paternalistas, que mal dissimulavam seu elitismo com uma postura benevolente em relação ao povo pobre. Benevolente, mas nem tanto.
Isso porque antes as elites aceitavam o povo pobre e todos os seus símbolos, sem que no entanto houvesse qualquer iniciativa de intervir para superação de sua pobreza. Qualquer interferência era vista como "higienização" a serviço de "preconceituosos".
Até mesmo culturalmente a pobreza só poderia ser superada no âmbito econômico. O resto que se permanecesse "puro", mesmo as baixarias do "funk", ou mesmo a avidez com que os ex-pobres partiam para comprar bens de consumo caríssimos e contrastar a pobreza simbólica com os valores da burguesia.
Os intelectuais "bacanas" não conseguiam explicar essas contradições e sua gororoba discursiva que, na aparência, misturava arremedos de "manifestos libertários" com "narrativas objetivas", se dissolveu como um castelo de areia tragado pela água. Nem a visibilidade plena de seus ideólogos conseguiu salvar, hoje eles têm que engolir em silêncio a decadência de suas visões.
Pois mesmo a conservadora grande mídia, que aposta na glamourização da pobreza, já começa a ceder e Fausto Silva, o mecenas da bregalização cultural brasileira, teve que sentir a mudança dos tempos e fazer um comentário contra a "favela de fantasia" que, até pouco tempo atrás, aparecia no Fantástico e ia direto para a mídia esquerdista sem uma forte oposição da opinião pública.
Eis o comentário de Faustão, referente ao cenário de destaque da novela I Love Paraisópolis, no ar na Rede Globo de Televisão e transmitida no horário das 19 horas:
"Para quem não sabe, Paraisópolis é uma favela famosa aqui de São Paulo. A verdade é o seguinte: no Brasil fica essa palhaçada, ao invés de melhorar, transformar as favelas em bairro e dar luz, água, segurança, educação, tem essa mania de chamar as favelas de comunidades. Isso é uma besteira. Pensam: 'vamos mudar o nome'. Não, né! Muda a realidade de quem está lá e não botando nome diferente".
O comentário pode ser rápido e sem muita profundidade, talvez até simplório, mas sinaliza uma mudança de posição. Não fossem os incidentes de violência nas chamadas "favelas pacificadas", com policiais sendo mortos e cidadãos inocentes também, muitos deles atingidos por balas perdidas, é possível que o mito da "arquitetura pós-moderna" resistisse por mais tempo.
Infelizmente é preciso que aconteçam impasses nesse sentido, para que possamos ver as coisas fora das fantasias e preconceitos de certas elites. Sobretudo os preconceitos dos intelectuais "sem preconceito" que viam a miséria e a pobreza como coisa festiva e não tinham medo de botar tudo isso não só na Globo e na Folha, mas até na revista Fórum, na Caros Amigos e na Carta Capital.
Agora é esperar que a opinião pública possa pensar na substituição de favelas por bairros populares dignos e melhor estruturados e trabalhar no reflorestamento dos morros e outras áreas suburbanas, além da despoluição de rios e valões.
A ideia será recuperar a qualidade de vida do povo e também o meio ambiente, ainda mais quando o Rio de Janeiro já ultrapassou São Paulo no título de capital mais poluída do país. Outro alerta para que muitos cariocas, que parecem se comportar como "bovinos", aceitando tudo "vindo de cima", deveriam agir para superar, em vez de ficarem esperando por uma solução.
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