Comparando as propagandas do Rock In Rio e de seus produtos associados - como uma rede de postos de gasolina que mostrava "metaleiros" debiloides - com os eventos de relançamento da 89 FM (SP) e da Rádio Cidade (RJ), tenho a constatação que as duas estão mais para "rádios Rock In Rio" do que para rádios de rock.
Jovens de boa aparência, um tanto mauricinhos, botando a língua para fora e fazendo o sinal do demo com as mãos, rebeldes caricaturais mostrando seus braços cheios de tatuagem, entre outros tipos bastante convencionais, como aqueles pais de família grisalhos que têm medo de irem ao Lollapalooza sozinhos, e só vão para acompanhar os filhinhos.
São estereótipos de roqueiros de boutique ou de simpatizantes "musicalmente ecumênicos", desses que adoram comemorar o Dia Mundial do Rock que o mundo não comemora. E que fazem com que se derrubem as ilusões que durante cerca de 20 anos cercaram as supostas "rádios rock".
Hoje os tempos mudam, e não dá para "patrulheiros" ficarem reclamando irritados achando que a cultura rock que valem é só a deles e das rádios que ouvem e que não tem a menor validade toda a cultura do rock acumulada em seis décadas porque a única que tem importância é a "cultura" que só eles acreditam e que o mundo tem que aceitar de bom grado.
Em época de declínio do bullying digital, depois do terrorismo racista contra Maria Júlia Coutinho ou do radicalismo intolerante dos órfãos de Cristiano Araújo, os brutamontes digitais que esculhambaram quem não compartilhava de sua devoção ao establishment midiático, político e mercadológico agora começam também a "apanhar".
Afinal, esses aspirantes a Reinaldo Azevedo escondidos nas mídias sociais, que sempre odiaram quem pensava diferente deles, veem o tempo mudar e não podem mais sossegadamente humilhar alguém, com as autoridades policiais tendo em mãos o protocolo de Internet desses delinquentes.
Com isso, a "patrulha da Cidade" que antes se irritava quando alguém lembrava coerentemente que a cultura rock não girava na órbita dos umbigos dos ouvintes da emissora dos 102,9 mhz, reduzida hoje a uma FM junkie que renega sua própria história, não pode mais rugir ou rosnar sem receber um barulhento urro como resposta.
Ver que as duas "rádios rock" estão tão lamentáveis que, para lançar novas bandas de rock (aliás, muito, muito fracas e fajutas), precisa depender da ajuda da Rede Globo, é algo que salta aos olhos e que ninguém pode fingir que não ocorre. Hoje nem o básico do básico do básico da cultura rock as duas FMs, 89 e Cidade, conseguem sequer cogitar em cobrir.
As programações das duas rádios estão tão fracas (para não dizer ruins) que, no período diurno, o que mais se vê são programas de piadinhas. os sucessos "roqueiros" se perdem entre bandas caricaturais com vocalistas que cantam com voz de sono ou de quem tem prisão de ventre, ou os pouquíssimos sucessos dos poucos medalhões que as rádios se interessam em tocar.
Fingir que tudo está bom e que as "rádios rock" agem assim para viabilizar audiência é ridículo e os reaças que pensam assim não sabem o que é cultura rock e, no fundo, pensam como se vivessem enclausurados em escritórios de departamentos comerciais, sem ver o mundo à sua volta.
A verdade é que as duas rádios só vieram como "alimentadoras" de eventos como Rock In Rio, Lollapalooza, Monsters Of Rock, e tudo o mais. Seus radialistas nem de longe são especializados em rock (um Zé Luiz da 89 e um Demi da Cidade são tão "roqueiros" quanto os comediantes de A Praça É Nossa) e os produtores "roqueiros" têm o mesmo mau humor da Jovem Pan FM de hoje.
Elas nem vieram com o cuidado de abranger o repertório, localizar o público no contexto histórico do rock, mostrar bandas que não fazem sucesso etc etc etc. Seus locutores têm a mesma dicção tresloucada dos colegas da Mix FM e dos DJs da Jovem Pan, e passar a falar calminho e devagar, como se vê na Rádio Cidade, não resolve. Soam como Emílio Surita lendo uma nota fúnebre.
As duas rádios, 89 e Cidade, passada a "novidade" da pretensa "volta", já não conseguem mais ter o desempenho "bem-sucedido" de antes. No Rio de Janeiro, o que se nota é que a Cidade, suposta "líder" do segmento jovem das FMs, na verdade já está sendo passada para trás pela Mix, MPB FM, JB FM, FM O Dia e até pela decadente e moribunda Transamérica.
De que adianta botar "rádios rock" só para tocar a música do trabalho da banda que vai fazer turnê no Brasil e parar por aí? E isso vendo que as duas rádios seguem a mesma mentalidade estereotipada do "rock de arena" de festivais que de "rock" só têm a fachada, como Rock In Rio e quejandos, que se ancoram até em atrações de sucesso sem relação alguma com o rock.
E aí dá para perceber por que seus adeptos comemoram felizes da vida o Dia Mundial do Rock que o mundo não comemora. É porque tomam como referencial um festival como o Live Aid, que como bem lembrou Luiz Antônio Mello a respeito do Rock In Rio, não é mais do que uma grande quermesse eletrônica ou aprendiz de Disneylândia.
Pois essas Disneylândias musicais como o Live Aid e o Rock In Rio (que só teve maior proximidade com o rock na primeira edição de 1985) não servem para celebrar a cultura rock. Há tantos outros dias mais roqueiros que o do Live Aid.
Da mesma forma, a cultura rock passa longe dos estereótipos de metaleiros debiloides do comercial de posto de gasolina, de mauricinhos se reunindo cantando "Love of My Life", e de locutores engraçadinhos comandando rádios ditas "de rock". E isso com os "roqueiros" indo para o Rock In Rio com a garantia de ter sempre uma apresentação de Ivete Sangalo.
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