Pular para o conteúdo principal

O DOCUMENTÁRIO SOBRE A XUXA E O PROBLEMA DO BREGA VINTAGE

MARLENE MATTOS TINHA CONDUTA AUTORITÁRIA SOBRE XUXA E AS PAQUITAS.

A má vontade das pessoas em abrir mão do ilusionismo da positividade tóxica de cada dia, que as faz querer ler somente textos agradáveis e curtir o supérfluo da vida privilegiada e quase nababesca da classe média abastada, se recusa a ver o que está por trás de seu mundo de cor e fantasia.

As pessoas que hoje estão entre 40 e 45 anos começam a ver desmoronar seu mundo da fantasia, pois quem nasceu entre 1978 e 1983 no Brasil, em sua grande maioria, se "educou" pelo circo midiático mostrado e consumido por suas babás, então pouco empenhadas em educar culturalmente as crianças, até porque essas babás já tinham a subescolaridade daqueles tempos da ditadura militar.

Diante disso, essa geração decidiu se limitar ao quintal culturalista dos anos 1990, restrito ao que havia de sucesso, de manjado e de simplório no entretenimento. Supervalorizavam a cultura estadunidense, a ponto de tratar Michael Jackson e Steven Spielberg como "deuses" - quando eles nem sequer têm (ou teve, no caso de Michael) um décimo da genialidade a que estão atribuídos - e a glorificar blockbusters até válidos, mas nada excepcionais, como Grease e Uma Linda Mulher (Pretty Woman).

Essa geração que consome hit-parade e tem a preguiça de sair da zona de conforto do gosto cultural mais óbvio - o que os faz na comodidade de preferir nomes medianos como Outfield e Johnny Rivers do que encarar artistas seminais como Buzzcocks e Laura Nyro - , culturalmente vai ao sabor do vento e isso começou quando Xuxa mostrava o quanto era "atraente" antecipar a adolescência na mais tenra infância e consumir muitos produtos sob os sorrisos complacentes dos seus pais.

Aquele mundo da fantasia de Xuxa e das paquitas começou a desmoronar quando foi divulgado o documentário intitulado simplesmente Xuxa - O Documentário, cujo um dos diretores é o jornalista Pedro Bial e foi lançado pelo canal Globoplay. O documentário mostrava um ambiente tóxico por trás daquele mundo de alegria e beleza que encantou e, até hoje, ainda encanta os hoje quarentões e quarentonas brasileiros, os "baixinhos" da época.

O documentário trouxe diversas polêmicas, foi acusado de parcial, mas independente de aqui corroborar ou não com essa ideia, uma coisa é indiscutível: a prepotência de Marlene Mattos, diretora do Xou da Xuxa, que implicava com ela e suas assistentes, como as Paquitas e os Paquitos.

O mérito do documentário é tentar trazer à discussão o fenômeno Xuxa Meneghel, sem sucumbir a uma pretensa reputação cult que faz com que o atual viralatismo cultural enrustido - aquele que não se considera como tal - tratasse a apresentadora e dublê de cantora como e fosse uma "artista de protesto", principalmente depois que o grupo de folk rock feminino Haim tocou "Ilariê" na apresentação no Brasil e elegeu essa música como "icônica".

O Brasil até que está passando por uma revisão de valores. Há poucos dias, o feminicídio teve duas derrotas na justiça, uma com a declaração de inconstitucionalidade da antiga desculpa de "defesa da honra", outra com a adoção de medidas para intimidar o assédio sexual na vida noturna, acabando com as armadilhas dos machistas tóxicos em fazer de suas mulheres suas "presas".

No entanto, é exagero dizer que o Brasil vai para o Primeiro Mundo e é lamentável que a "geração Instagram" despreze tal aviso e sonhe, nas altas estratosferas de seus sonhos dourados, com nosso país transformado em "desenvolvido" como que num passe de mágica. A remoção do entulho bolsonarista é apenas o primeiro passo, com notícias amargas contra o influenciador "isentão" Bruno Aiub, o Monark, e a dupla Carla Zambelli e o hacker quinta-coluna Walter Degatti.

Muitos ainda classificam os entulhos mais antigos, próprios do período do "milagre brasileiro", como "valiosa nostalgia", iludidos pela armadilha solipsista das memórias afetivas. Claro, as pessoas que têm 60 anos hoje vão falar, com saudades, dos passeios com os saudosos pais no Ford Belina ou no Chevrolet Veraneio, para acampar na praia com o rádio tocando Bartô Galeno e Mauro Celso, para não dizer Odair José, substituto de Roberto Carlos no coração viralatista das esquerdas festivas.

Da mesma maneira, também tem a saudade dos viralatistas nostálgicos enrustidos em ler aquela mensagem fake trazida pelo "médium da peruca" de Uberaba, naqueles anos de chumbo, atribuída ora por um famoso da moda já falecido, ou então por algum anônimo que a imprensa policialesca, que por questões de afinidade vibratória, blindava o "médium" de ideias medievais, havia noticiado em uma tragédia. A nostalgia desse obscurantismo religioso envolvia sobretudo as leituras das mães dos hoje sessentões, em linguagem melíflua que fazia o conteúdo medieval tornar-se imperceptível.

Voltando a Xuxa, o brega vintage que ancora essa "nostalgia de resultados" mostra também outro episódio sombrio. E envolve o hoje queridinho dos saudosistas de butique, o compositor e produtor Michael Sullivan, por sinal autor da maioria dos sucessos de Xuxa.

Em 2014, o cantor e compositor Alceu Valença fez uma denúncia sobre um esquema de jabaculê que visava destruir a Música Popular Brasileira. Alertando contra a "glamourização do lixo cultural", o artista pernambucano, um dos mestres da canção nordestina contemporânea, descreve o rompimento que ele decidiu ter com a indústria fonográfica dominante. Sem dizer nomes, ele descreve a sua experiência na então BMG-Ariola.

"Eu, Chico Buarque, Fafá de Belém, e outros artistas, foram contratados para ir pra gaveta, para poderem lançar outro tipo de produto (a música brega) que interessava ao diretor artístico. Pediam para cantar músicas bregas e outras. Em três anos ganhei apartamento, hospedagem em hotel cinco estrelas, com tudo pago em minha vida, mas calaram minha música", disse Alceu acrescentando que o objetivo era fazer um tipo de música parecido com o pop comercial dos EUA.

Quem observa os discos lançados na época, sabe que o diretor-artístico da BMG-Ariola na época era o ex-Fevers Miguel Plopschi, e o principal produtor e compositor, Michael Sullivan. O objetivo dos dois era claro: destruir a MPB. Eles desfiguraram musicalmente nomes como Joanna, Roupa Nova, Alcione e Raimundo Fagner, enquanto priorizavam nomes comerciais como Xuxa, Trem da Alegria e José Augusto.

Dá pena hoje Michael Sullivan, o Roberto Campos Neto da música brasileira, agora posar de "artista indie", "guru visionário" e usar a MPB que ele quis destruir para se relançar na carreira. Isso é um grande desrespeito à memoria do brasileiro, sobretudo dos fãs de MPB de primeira viagem, que engolem a mentira de que "Um Dia de Domingo" e "Whisky a Go-go" são "clássicos da MPB". Ver um Rogério Skylab cansado de ser vanguarda se rendendo ao traiçoeiro Sullivan também é constrangedor.

Que o pessoal se prepare para as cenas dos próximos capítulos, pois o que virá de devassa poderá derrubar o viralatismo cultural que, sem assumir esse rótulo, passa incólume no contexto atual. Quem achar que a reconstrução do Brasil termina com o desmonte do bolsonarismo, está completamente enganado. O bolsonarismo é apenas a ponta de um aicebergue de entulhos acumulados desde 1964.


Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

RELIGIÃO DO AMOR?

Vejam como são as coisas, para uma sociedade que acha que os males da religião se concentram no neopentecostalismo. Um crime ocorrido num “centro espírita” de São Luís, no Maranhão, mostra o quanto o rótulo de “kardecismo” esconde um lodo que faz da dita “religião do amor” um verdadeiro umbral. No “centro espírita” Yasmin, a neta da diretora da casa, juntamente com seu namorado, foram assaltar a instituição. Os tios da jovem reagiram e, no tiroteio, o jovem casal e um dos tios morreram. Houve outros casos ao longo dos últimos anos. Na Taquara, no Rio de Janeiro, um suposto “médium” do Lar Frei Luiz foi misteriosamente assassinado. O “médium” era conhecido por fraudes de materialização, se passando por um suposto médico usando fantasias árabes de Carnaval, mas esse incidente não tem relação com o crime, ocorrido há mais de dez anos. Tivemos também um suposto latrocínio que tirou a vida de um dirigente de um “centro espírita” do Barreto, em Niterói, Estado do Rio de Janeiro. Houve incênd...

LULA GLOBALIZOU A POLARIZAÇÃO

LULA SE CONSIDERA O "DONO" DA DEMOCRACIA. Não é segredo algum, aqui neste blogue, que o terceiro mandato de Lula está mais para propaganda do que para gestão. Um mandato medíocre, que tenta parecer grandioso por fora, através de simulacros que são factoides governamentais, como os tais “recordes históricos” que, de tão fáceis, imediatos e fantásticos demais para um país que estava em ruínas, soam ótimos demais para serem verdades. Lula só empolga a bolha de seus seguidores, o Clube de Assinantes VIP do Lulismo, que quer monopolizar as narrativas nas redes sociais. E fazendo da política externa seu palco e seu palanque, Lula aposta na democracia de um homem só e na soberania de si mesmo, para o delírio da burguesia ilustrada que se tornou a sua base de apoio. Só mesmo sendo um burguês enrustido, mesmo aquele que capricha no seu fingimento de "pobreza", para aplaudir diante de Lula bancando o "dono" da democracia. Lula participou da Assembleia Geral da ONU e...

LUÍS INÁCIO SUPERSTAR

Não podemos estragar a brincadeira. Imagine, nós, submetidos aos fatos concretos e respirando o ar nem sempre agradável da realidade, termos que desmascarar o mundo de faz-de-conta do lulismo. A burguesia ilustrada fingindo ser pobre e Lula pelego fingindo governar pelos miseráveis. Nas redes sociais, o que vale é a fantasia, o mundo paralelo, o reino encantado do agradável, que ganha status de “verdade” se obtém lacração na Internet e reconhecimento pela mídia patronal. Lula tornou-se o queridinho das esquerdas festivas, atualmente denominadas woke , e de uma burguesia flexível em busca de tudo que lhe pareça “legal”, daí o rótulo “tudo de bom”. Mas o petista é visto com desconfiança pelas classes populares que, descontando os “pobres de novela”, não se sentem beneficiadas por um governo que dá pouco aos pobres, sem tirar muito dos ricos. A aparente “alta popularidade” de Lula só empolga a “boa” sociedade que domina as narrativas nas redes sociais. Lula só garante apoio a quem já está...

BURGUESIA ILUSTRADA E SEU VIRALATISMO

ESSA É A "FELICIDADE" DA BURGUESIA ILUSTRADA. A burguesia ilustrada, que agora se faz de “progressista, democrática e de esquerda”, tenta esconder sua herança das velhas oligarquias das quais descendem. Acionam seus “isentões”, os negacionistas factuais, que atuam como valentões que brigam com os fatos. Precisam manter o faz-de-conta e se passar pela “mais moderna sociedade humana do planeta”, tendo agora o presidente Lula como fiador. A burguesia ilustrada vive sentimentos confusos. Está cheia de dinheiro, mas jura que é “pobre”, criando pretextos tão patéticos quanto pagar IPVA, fazer autoatendimento em certos postos de gasolina, se embriagar nas madrugadas e falar sempre de futebol. Isso fora os artifícios como falar português errado, quase sempre falando verbos no singular para os substantivos do plural. Ao mesmo tempo megalomaníaca e auto-depreciativa, a burguesia ilustrada criou o termo “gente como a gente” como uma forma caricata da simplicidade humana. É capaz de cele...

“COMBATE AO PRECONCEITO” TRAVOU A RENOVAÇÃO REAL DA MPB

O falecimento do cantor e compositor carioca Jards Macalé aos 82 anos, duas semanas após a de Lô Borges, mostra o quanto a MPB anda perdendo seus mestres um a um, sem que haja uma renovação artística que reúna talento e visibilidade. Macalé, que por sorte se apresentou em Belém, no Pará, no Festival Se Rasgum, em 2024. Jards foi escalado porque o convidado original, Tom Zé, não teve condições de tocar no evento. A apresentação de Macalé acabou sendo uma despedida, um dos últimos shows  do artista em sua vida. Belém é capital do Estado da Região Norte de domínio coronelista, fechado para a MPB - apesar da fama internacional dos mestres João Do ato e Billy Blanco - e impondo a música brega-popularesca, sobretudo forró-brega, breganejo e tecnobrega, como mercado único. A MPB que arrume um dueto com um ídolo popularesco de plantão para penetrar nesses locais. Jards, ao que tudo indica, não precisou de dueto com um popularesco de plantão, seja um piseiro ou um axezeiro, para tocar num f...

O ERRO QUE DENISE FRAGA COMETEU, NA BOA-FÉ

A atriz Denise Fraga, mesmo de maneira muito bem intencionada, cometeu um erro ao dar uma entrevista ao jornal O Estado de São Paulo para divulgar o filme Livros Restantes, dirigido por Márcia Paraíso, com estreia prevista para 11 de dezembro. Acreditando soar “moderna” e contemporânea, Denise, na melhor das intenções, cometeu um erro na boa-fé, por conta do uso de uma gíria. “As mulheres estão mais protagonistas das suas vidas. Antes esperavam que aos 60 você estivesse aposentando; hoje estamos indo para a balada com os filhos”. Denise acteditou que a gíria “balada” é uma expressão da geração Z, voltada a juventude contemporânea, o que é um sério equívoco sem saber, Denise cometeu um grave erro de citar uma gíria ligada ao uso de drogas alucinógenas por uma elite empresarial nos agitos noturnos dos anos 1990. A gíria “balada” virou o sinônimo do “vocabulário de poder” descrito pelo jornalista britânico Robert Fisk. Também simboliza a “novilíngua” do livro 1984, de George Orwell, no se...

O NEGACIONISMO FACTUAL E A 89 FM

Era só o que faltava. Textos que contestam a validade da 89 FM - que celebra 40 anos de existência no dia 02 de dezembro, aniversário de Britney Spears - como “rádio rock” andam sendo boicotados por internautas que, com seu jeito arrogante e boçal, disparam o bordão “Lá vem aquele chato criticar a 89 novamente”. Os negacionistas factuais estão agindo para manter tudo como o “sistema” quer. Sempre existe uma sabotagem quando a hipótese de um governo progressista chega ao poder. Por sorte, Lula andou cedendo mais do que podia e reduziu seu terceiro mandato ao mínimo denominador comum dos projetos sociais que a burguesia lhe autorizou a fazer. Daí não ser preciso apelar para a farsa do “combate ao preconceito” da bregalização cultural que só fez abrir caminho para Jair Bolsonaro. Por isso, a elite do bom atraso investe na atuação “moderadora” do negacionista factual, o “isentão democrático”, para patrulhar as redes sociais e pedir o voicote a páginas que fogem da assepsia jornalística da ...

A RELIGIÃO QUE COPIA NOMES DE SANTOS PARA ENGANAR FIÉIS

SÃO JOÃO DE DEUS E SÃO FRANCISCO XAVIER - Nomes "plagiados" por dois obscurantistas da fé neomedieval "espirita". Sendo na prática uma mera repaginação do velho Catolicismo medieval português que vigorou no Brasil durante boa parte do período colonial, o Espiritismo brasileiro apenas usa alguns clichês da Doutrina Espírita francesa como forma de dar uma fachada e um aparato pretensamente diferentes. Mas, se observar seu conteúdo, se verá que quase nada do pensamento de Allan Kardec foi aproveitado, sendo os verdadeiros postulados fundamentados na Teologia do Sofrimento da Idade Média. Tendo perdido fiéis a ponto de cair de 2,1% para 1,8% segundo o censo religioso de 2022 em relação ao anterior, de 2012, o "espiritismo à brasileira" tenta agora usar como cartada a dramaturgia, sejam novelas e filmes, numa clara concorrência às novelas e filmes "bíblicos" da Record TV e Igreja Universal. E aí vemos que nomes simples e aparentemente simpáticos, como...

“JORNALISMO DA OTAN” BLINDA CULTURALISMO POPULARESCO DO BRASIL

A bregalização e a precarização de outros valores socioculturais no Brasil estão sendo cobertos por um véu que impede que as investigações e questionamentos se tornem mais conhecidos. A ideologia do “Jornalismo da OTAN” e seu conceito de “culturalismo sem cultura”, no qual o termo “cultura” é um eufemismo para propaganda de manipulação política, faz com que, no Brasil, a mediocridade e a precarização cultural sejam vistas como um processo tão natural quanto o ar que respiramos e que, supostamente, reflete as vivências e sentimentos da população de cada região. A mídia de esquerda mordeu a isca e abriu caminho para o golpismo político de 2016, ao cair na falácia do “combate ao preconceito” da bregalização. A imprensa progressista quase faliu por adotar a mesma agenda cultural da mídia hegemônica, iludida com os sorrisos desavisados da plateia que, feito gado, era teleguiada pelo modismo popularesco da ocasião. A coisa ainda não se resolveu como um todo, apesar da mídia progressista ter ...

O BRASIL DOS SONHOS DA FARIA LIMA

Pouca gente percebe, mas há um poder paralelo do empresariado da Faria Lima, designado a moldar um sistema de valores a ser assimilado “de forma espontânea” por diversos públicos que, desavisados, tom esses valores provados como se fossem seus. Do “funk” (com seu pseudoativismo brega identitário) ao Espiritismo brasileiro (com o obscurantismo assistencialista dos “médiuns”), da 89 FM à supervalorização de Michael Jackson, do fanatismo gurmê do futebol e da cerveja, do apetite “original” pelas redes sociais, pelo uso da gíria “balada” e dos “dialetos” em portinglês (como “ dog ”, “ body ” e “ bike ”), tudo isso vem das mentes engenhosas das elites empresariais do Itaim Bibi, na Zona Sul paulistana, e de seis parceiros eventuais como o empresariado carnavalesco de Salvador e o coronelismo do Triângulo Mineiro, no caso da religião “espírita”. E temos a supervalorização de uma banda como Guns N'Roses, que não merece a reputação de "rock clássico" que recebe do público brasile...