QUANDO O LIXO SE ACUMULA, VAMOS FICAR FELIZES COM ISSO?
Num momento em que, em tese, o Brasil está em reconstrução, se esquece não só o principal, mas o essencial: o senso crítico. Se precisamos reconstruir, é necessário que apontemos o que está errado, e se existe muita coisa errada, paciência, não é possível aceitar esse clima de positividade tóxica que força a todos acharem que tudo está bem, quando não está, apesar de relativas melhoras.
O que as pessoas não percebem é que os piores resmungões não são aqueles que ficam reclamando demais das coisas. Os piores resmungões são aqueles que não suportam ver gente reclamando, são aqueles que esperam que todos sorriam mesmo sob a pior catástrofe.
Quando a sujeira se acumula, ninguém fica feliz com isso. Tivemos retrocessos socioculturais terríveis, mas em vez de ficarmos questionando tudo, passa se pano em cima e cria-se um "novo normal" que vale e prevalece no nosso país desde 1974, quando o "bom" viralatismo cultural, aquele que se recusa a usar este nome por representar, para uma parcela de contentes, "as boas coisas da vida", desenhou a "atual cara" do nosso país, medíocre mas grandiloquente.
A verdade é que, quando as pessoas sentem fobia de senso crítico, não querem arcar com os custos dos retrocessos sociais diversos. Num contexto relativamente mais recente, o Brasil sofreu retrocessos sociais profundos desde o segundo semestre de 1963, quando se esboçava o roteiro golpista contra João Goulart, então presidente do nosso país. Num contexto já mais ancestral, os retrocessos envolvem mais de cinco séculos de escravidão, formalmente encerrada em 1888 mas presente nas "terras sem lei" do interior do Brasil ou mesmo no mercado predatório da ganância empresarial mais brutal.
A coisa chegou ao nível surreal de uma elite de "esclarecidos" e "iluminados" passar a ver a pobreza como uma "identidade sociocultural", "etnia" ou mesmo "padrão de vida", com as favelas transformadas em "aldeias pós-modernas". Isso é de um aberrante e assustador etnocentrismo, vindo dessa elite "positiva" que se ascendeu com Lula e que definimos aqui como a "elite do bom atraso", a classe média abastada e megalomaníaca que se acha "dona do mundo".
A Internet e, sobretudo, as redes sociais, são praticamente monopolizadas por gente que sente fobia de senso crítico, mesmo aqueles que formalmente apoiam mas que se incomodam quando os questionamentos avançam muito. E aí vemos que tem muito "isentão", mesmo aqueles "objetivos" de centro ou de esquerda, que não diferem muito do influenciador Monark no quesito passar pano nos problemas mais graves ou se incomodar com a suposta overdose de senso crítico.
Por isso é que as narrativas que prevalecem na Internet, em sua maioria esmagadora, se alternam entre a banalização dos erros humanos que divertem as pessoas e inspiram uma multidão de "quenuncas" e a obsessão da positividade tóxica, de acreditar cegamente que tudo está bem.
Há muita gente excluída nessas narrativas oficiais que, por causa desse problema, transforma a agenda de assuntos numa mesmice sem fim. E tudo forçando os brasileiros em geral a ficarem calados na ilusão de que, com isso, o Brasil vira país desenvolvido fácil, facil, com tanta sujeira escondida debaixo do tapete, com tanto entulho antigo perecendo pelo avesso, virando falsa relíquia saudosista.
Mas são esses entulhos que trazem alegria para a "boa" sociedade que criaram condições diversas para o surgimento do bolsonarismo e seus derivados. Rejeitar o senso crítico hoje não fará o nosso Brasil crescer, apenas criará uma sensação de alegria para uns poucos privilegiados. O problema é que, com os descontentes sem voz, sem vez e sem espaço, isso pode fazer com que Jair Bolsonaro use esses indignados como isca para um novo golpe. E o golpismo adora o silêncio sorridente dos complacentes.
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