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GÍRIA "BALADA" AGORA SOA COMO VÍCIO DE LINGUAGEM


Não há coisa mais cringe do que a gíria "balada", de longe a pior de todas as gírias que foram lançadas no Brasil. Nem o "chuchu beleza" dos tempos dos bichos-grilos chega ao nível tão ridículo. "Balada" no sentido de festa, agito noturno e coisa parecida é um jargão tão forçadamente moderno que já deveria ter caído em desuso há mais de 20 anos, se não fosse o fato dessa gíria da Faria Lima, da Jovem Pan e de Luciano Huck não ter seu próprio esquema de marketing e se impor de forma imprópria a uma gíria.

Pois toda gíria tem seus limites de tempo e espaço. Elas refletem um grupo específico e limitado de pessoas e sua duração também é limitada em alguns anos. Mas a gíria "balada" tornou-se a "gíria do Terceiro Reich", se impondo acima dos tempos e das tribos, mesmo sendo uma gíria que é pronunciada praticamente como se alguém estivesse cuspindo na cara de alguém. E isso temperado com eventual cacófato: "Vou pra balada c'a galera".

A gíria virou tudo de ruim. Virou coisa de internauta boçal e reacionário que gosta de fazer linchamento de reputações nas redes sociais. Virou também jargão de site de fofocas, para definir a diversão de subcelebridades e de astros milionários do futebol brasileiro. E, para piorar, essa gíria "balada" ainda por cima virou um vício de linguagem, pois tornou-se usada de forma repetida no vocabulário preguiçoso de quem não quer diversificar as palavras.

Pois a gíria "balada", que se originou de um jargão privativo de jovens riquinhos da Faria Lima que, na diversão noturna dos anos 1990, definiram como "balada" um rodízio de "bala", eufemismo para pílulas alucinógenas. A gíria foi depois patenteada pela Jovem Pan e por Luciano Huck que, depois como contratado pela Rede Globo, usou a rede como ponto de partida para a popularização da gíria.

A popularização da gíria "balada" era um teste da mídia corporativa do nível de submissão dos jovens brasileiros dos anos 1990 para cá ao poder midiático e mercadológico. E, por outro lado, jovens reacionários dos vários cantos do Brasil, mas sobretudo os da Barra da Tijuca, Faria Lima e Barretos, foram defender a gíria como se fosse o único meio de "autoafirmação positiva" de suas personalidades estúpidas, violentas, autoritárias e, acima de tudo, conservadoras por trás da fachada "rebelde".

Só que a gíria "balada" tenta persistir, em vão, nos meios de expressão considerados "sérios", seja o noticiário comum, seja a publicidade de imóveis, por exemplo, mordendo a isca da Novilíngua brasileira (para saber o que é Novilíngua, ver 1984 de George Orwell). Até o médico Malcolm Montgomery cometeu um erro grosseiro de mencionar a gíria "balada" num livro sobre os Beatles, quando a referida gíria cairia muito melhor se fosse num livro sobre o Menudo, os Backstreet Boys ou o K-Pop.

A coisa foi tão grave que teve até um projeto de recreação infantil apelidado de "baladinha". E isso é aberrante, pessoal, porque é uma gíria originária do consumo de drogas - por sinal tema que foi pauta na votação do Supremo Tribunal Federal, com o ministro Cristiano Zanin votando contra a discriminação do porte de drogas - , não tendo a menor razão para essa gíria se tornar "universal" e "atemporal".

Devemos voltar a falar "festa", "jantar", "noitadas". No exterior, gente bem mais descolada que os jovens viralatistas brasileiros - que só sabem agredir quem não pensa igual a eles - fala o bom e velho "I go to the party with my friends" ("Eu vou para a festa com os amigos"), em vez de soltar a saliva na cara do outro com o "Eu vou pra balada c'a galera". Lá não tem esse negócio de "I go to the ballad with my crew", isso soa uma cretinice.

Lembremos que o anedotário de Portugal caiu na gozação diante da obsessão do brasileiro em falar gírias. Falar "balada" hoje é tão antiquado, cafona, e de tão forçadamente moderno a gíria já soa velha e cansada. Se eu leio um romance contemporâneo e o enredo menciona essa gíria, o risco é grande de eu parar a leitura imediatamente.

Vamos ser civilizados e decentes. A língua portuguesa já é castigada demais com erros de português, dialetos estrangeiros - como a mania do portinglês de hoje em dia - , palavras indevidas. Devemos dar o exemplo e falar corretamente, não para forçar uma erudição linguística, mas falarmos de maneira decente, até quando se torna informal ou se utiliza uma linguagem mais popular.

A única "balada" que sobreviverá ao tempo é aquela velha palavra no sentido de música lenta, de história dramática. Uma música como "Balada Triste", de Agostinho dos Santos, voltará como um fantasma a assombrar as "baladas eletrônicas" de decadentes DJs de pen drive que animam a diversão insensível dos mileniais e similares.

Se as pessoas continuarem insistindo na gíria "balada", periga do cuspe de saliva no outro ser devolvido pela poeira que o tempo jogará nos olhos de quem considera os valores retrógrados de hoje "eternos" e "imperecíveis".

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