A ELITE DO BOM ATRASO ANDA MUITO DE CARROS SUV, MAS SE ACHA "POBREZINHA".
Nada pessoalmente contra as elites em si, mas devemos isolar e delimitar uma elite social que se acha "a humanidade", uma "bolha" de 30% de brasileiros que e acham "predestinados", "a fina flor da espécie humana de todo o planeta" e "a única parcela da humanidade considerada a mais legal do mundo".
Praticamente reinando exclusiva nas redes sociais, a elite do bom atraso, tetraneta da Casa Grande, tataraneta das elites da República Velha, neta dos golpistas de 1964 que consolidaram seu poder na Era Geisel, no entanto é uma classe que se tornou a "nata" dos apoiadores ferrenhos de Lula.
A elite do bom atraso se comporta como se fosse filha de um insólito casamento de Leila Diniz com Brilhante Ustra. É conservadora no sentido de acreditar numa religiosidade tradicional, cultuando "madres" e "médiuns" ultraconservadores mas que aparecem carregando criancinhas pobres no colo e publicam frases hipócritas que falam como sofrer desgraças é bonito. Desde que seja há mil léguas dessa "boa" elite que se autoproclama a "sociedade do amor".
Seus costumes são muito estranhos: falam gírias como "balada" (© Jovem Pan), adotam dialetos em portinglês - como "dog" "body", "bike", "snack" - , jogam comida fora depois de umas cinco garfadas, acham, com tola credulidade, que o hit-parade musical (aquele pop de grande sucesso, de ontem e de hoje) é "vanguarda alternativa", veem na cerveja artigo de primeira necessidade, e um quarto dessa elite fuma cigarro como se fosse a melhor coisa do mundo.
Na literatura, preferem ler livros que fujam de qualquer missão de transmitir Conhecimento. Leitura é só um meio de relaxar e uma rota de fuga para os problemas. No teatro e no cinema, preferem consumir obras que lembram os sucessos estrangeiros. No comportamento, essas pessoas se divertem com o mundo vazio das subcelebridades, que pelo seu aspecto "gente como a gente" tirou de cena a antiga burguesia das colunas sociais que só queria aparecer para si mesmas.
Urbanisticamente, são obcecados pelos horrendos parquiletes (do inglês parklet), aquelas "praças de rua" que só servem para atender a interesses comerciais, mas vendem a falsa imagem de "praças públicas" e justificam sua total inutilidade pelo aspecto pseudochique de parecer "americano" do tipo Califórnia, Route 66 ou coisa parecida, com o jeca burguês brasileiro sonhando com Los Angeles tomando cerveja num parquilete e cantando mal a letra de "Proud Mary" do Creedence Clearwater Revival.
São pessoas que se ocupam demais usando o celular para ver a "movimentação" do Instagram. São mais fanáticos por futebol (que, se for pelo portinglês atual, nunca sairia da grafia gringa football, mas, por sorte, o termo foi aportuguesado antes) do que os ingleses, franceses, italianos e argentinos, porque aqui o futebol é gourmetizado até o extremo, a ponto de ser, pelo menos no Rio de Janeiro, moeda de troca das relações sociais e ate pretexto para assédio moral no trabalho, nem tanto pela obrigação de torcer por um mesmo time, mas sim pela obrigação de gostar de futebol.
A elite o bom atraso é satisfatoriamente rica, longe no entanto do privilégio abusivo do super-rico, embora o enriquecimento abusivo não lhe seja necessariamente uma má ideia. Mas essa elite, que passeia e carros SUV só para ir de um quarteirão para outro, se acha "pobrezinha" porque aplaude aquele espetáculo caricatural dos "meninos dançarinos de Uganda", que reduz a juventude pobre à condição humilhante de "bichinhos obedientes" a animar a burguesia esnobe que consome as redes sociais.
São pessoas que, em nome de um hedonismo obsessivo, chegam a adotar posturas subservientes ou autoritárias. Seu gosto musical dá preferência ao que "faz muito sucesso", a ponto de sempre ouvirem o mesmo punhadinho de músicas a vida toda e darem preferência ao pop comercial estrangeiro e às músicas brega-popularescas do Brasil. Consomem tudo o que está na moda, e aderem a isso com a comodidade de um gado bovino.
Não suportam ver homens solteiros, daí o confuso mito do "InCel". Lamentam a existência de ateus, que são classificados como "virgens de Deus". Mas também se horrorizam quando vem alguém dando caminhadas "longas demais", se esquecendo que seu ídolo Jesus Cristo, segundo diz a tradição, fazia o mesmo em seu tempo. E a "boa" elite só não adere ao álcool e às drogas por conta de prescrições religiosas ou algum protocolo social ou profissional.
Certa vez, a elite do bom atraso se enfureceu com o hoje ministro do Supremo Tribunal Federal, Cristiano Zanin, porque ele não votou pela discriminação incondicional do usuário de drogas, o que daria sinal verde para o consumo recreativo. As esquerdas médias foram logo vomitar acusações contra o outrora advogado de Lula, chamando-o de "conservador" enquanto o jurista Eugênio Aragão, com muita coerência, disse que Zanin adotou critérios técnicos para formar sua posição.
Enfim, isso é uma breve amostra dessa velha ordem social que predomina no Brasil, que quer bancar a dona do bom senso, a formadora de opinião e, no entanto, está aí no poder desde o auge do "milagre brasileiro", há mais de 50 anos. Ela não quer largar o osso, mas teve que mascarar seu DNA golpista e reacionário enfatizando o seu lazer privado do hedonismo identitário, que forçam desesperadamente para compartilhar com toda a humanidade brasileira e, quicá, para o resto do mundo. O desbunde falou mais alto do que o elo pelos "valores da Família e da Patria".
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