A BURGUESIA ILUSTRADA QUER SER "MAIS POVO QUE O POVO".
Vivemos o contexto de que uma elite de pretensos predestinados quer dominar o mundo, através de um protagonismo franqueado pelo presidente Lula. A sensação de “Agora vai e chegou a nossa vez” apresenta a ilusão, narrada como se fosse um conto de fadas, de que nosso país, mesmo de uma forma precipitada e bastante prematura, está prestes a virar um país desenvolvido, e essa tese é defendida a ferro e a fogo pela burguesia ilustrada e seus porta-vozes, os negacionistas factuais, os “isentões” do momento.
Enquanto a tese, em narrativas fabulosas, aposta numa hipotética revolução popular a sacudir o mundo capitalista e a colocar o Brasil como uma das mais poderosas potências mundiais, a realidade mostra que não é bem assim. O que se vê é uma festa de umas poucas milhares de pessoas que podem plenamente usufruir do consumo pleno, do hedonismo facilitado e ainda conseguir grande apoio para suas narrativas que, se não são realistas, são capazes de fabricar sentido.
A bolha lulista se forma com a aliança de esquerdistas integrados à burguesia com direitistas convertidos ao esquerdismo de resultados. A “boa” sociedade resgatou até mesmo um recurso da República Velha para garantir, para si, a “democracia de um homem só” de Lula reeleito.
Esse recurso é o voto de cabresto, agora ressignificado na “coisa boa” do lulismo.
Isso porque a burguesia ilustrada apela para o povo pobre ter que votar "com urgência" em Lula para sob a desculpa de "evitar o fascismo". É certo que o bolsonarismo, sim, é uma espécie de esboço de um fascismo que seria mais ameaçador no futuro, mas daí a dizer que tudo que não for Lula é fascista não só é um grande exagero como é um equívoco que indica uma intolerância com a competição eleitoral, onde o petista quer se impor como "única opção".
Os pesquisismos dão o tempero da histeria ao insistir na mantra de que Lula "vence todos os cenários", um discurso que as supostas pesquisas de opinião trabalharam já nos primeiros meses do terceiro mandato do petista. É um "voto de cabresto" escancarado mas feito para provocar êxtase e entusiasmo em níveis estratosféricos, como se Lula fosse "imbatível" e já se tornasse reeleito por antecipação, contradizendo com o seu discurso de "democracia" que, na prática, sufoca o direito de escolha do eleitorado, induzido a votar num único candidato.
Daí que vemos um aspecto insólito. Lula está mais próximo da burguesia do que das bases populares, estas decepcionadas com o petista. Ninguém é tolo para aceitar que Lula adiasse até o combate à fome para viajar ao exterior a pretexto de priorizar a política externa em busca de investimentos para nosso país. Para o povo pobre da vida real, ficou uma sensação de que Lula o abandonou, e qualquer argumento para reverter o desapontamento é perda de tempo.
Já para quem vai para Nova York com a facilidade de quem vai para a casa da titia, foi maravilhoso Lula priorizar a política externa no começo do terceiro mandato. Existe até o bordão “O Brasil voltou” para coroar esse turismo político do presidente, que para compensar a ausência, apelou para a cosmética estatística do “Efeito Lula” e seus supostos “recordes históricos”.
Lula mudou para pior porque ele hoje está mais próximo às classes dominantes. Não dá para dizer o contrário. Seu pouco caso com os preços dos alimentos, com a escala 6x1 do trabalho e com os juros altos mostra que opinar não é agir. De que adianta Lula reclamar do preço do arroz se ele, como chefe da nação, não age para combater essa carestia?
O povo pobre não é ingênuo. Mesmo com Lula, que aliás está muito longe de ser o ídolo popular que chegou a ser até 2018. Hoje Lula virou uma caricatura de si mesmo, que agrada mais as elites abastadas que agora passaram a gostar e até a depender dele, porque o petista é o único que financia os sonhos e desejos das classes dominantes que, egoístas, não vão contar com a generosidade de um representante surgido dentro delas mesmas.
Agora vemos a burguesia ilustrada lutando para "substituir" o povo brasileiro. A burguesia quer ser "mais povo que o povo". Mais uma vez a "casa grande" quer ser senzala e imitar, de forma grosseira, o estilo de vida dos quilombolas. Aquele papo de "gente como a gente", de uma classe cheia de dinheiro mas que posa de "pobre", enquanto os verdadeiros pobres morrem aos poucos pela fome, pelo desabrigo, pela doença e pela violência.
A engenharia social tendo cumprido sua missão de exterminar milhões de brasileiros, através da violência no campo, nos feminicídios, nas mortes da comunidade LGBTQIA+ nas periferias, nos assassinatos de indígenas nas reservas invadidas por posseiros, na violência que atinge proletários, na violência entre amigos e familiares pela ignorância que alimenta os noticiários policialescos, e, além de tudo isso, houve a tragédia da Covid-19.
Com a necropolítica tendo realizado essa tarefa trágica, a burguesia ilustrada agora pode exibir seu bom-mocismo para além dos ensaios do Renova BR. Até o neoliberal mais convicto passou a defender Lula, bem mais do que o pobre miserável que, de tão acostumado com perdas, já nem confia na hipótese do petista em lhe tirar da situação degradante.
O próprio Lula não faz por onde. Ele opina contra preços caros, juros altos, trabalho degradante e sobrecarregado, mas não adota uma medida, uma única providência. Adia a solução sob o pretexto de "dar tempo ao tempo", mas o povo pobre tem pressa, e vendo o presidente virar as costas para o povo, até porque Lula não pode dar atenção a dois lados ao mesmo tempo. Se Lula fala de frente com a burguesia, ele vira as costas para as classes populares.
Esse cenário dramático está oculto nas narrativas que prevalecem nas redes sociais e na mídia patronal, esta estranhamente solidária ao lulismo em dimensões além da conta. Afinal, a burguesia ilustrada agora precisa fingir que é "povo", resgatando um antigo mecanismo das velhas oligarquias, a ideia de atribuir o status de "povo" para uma classe de abastados, enquanto os verdadeiros excluídos sociais são cada vez mais excluídos, sendo obrigados a esperar, não se sabe até quando.
Como a fome não espera e a pobreza sempre oprime de maneira instantânea, os pobres da vida real se sentem traídos, decepcionados e frustrados com Lula. Isso se torna tão irreversível que a solução é a burguesia ilustrada se passar por "povo" e as supostas pesquisas de opinião falarem "pelo pobre" aquilo que os pobres não falariam jamais.
Uma coisa é certa. Lula perde feio em um dos cenários. O cenário dramático dos pobres da vida real, enfurecidos por serem enganados por alguém que antes lhes representava e que, agora, tornou-se o ursinho carinhoso da Faria Lima. Só quem gosta de Lula, nos últimos tempos, é quem tem privilégios em sobra nas suas vidas.
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